Marte
Simulação no Havaí: Equipe simula estadia em Marte por 120 dias Desde meados de abril de 2013, uma equipe de seis pessoas vive uma experiência espacial num habitat localizado a 2.440 metros acima do nível do mar, em um campo de lava estéril, semelhante ao ambiente encontrado em Marte. Da Redação* BH-09/08/2013
A cúpula geodésica onde os pesquisadores permaneceram por 120 dias. Leia também Assista vídeo da Mars One - projeto para colonização de Marte Holandeses recrutam colonizadores para Marte Viagem a Marte é programada para 2018 Robô Opportunity completa oito anos em Marte Estrutura branca em Marte chama a atenção Curiosity, o sucessor dos robôs marcianos Marte: Um eclipse solar extraterrestre Nasa lança novo jipe robô Curiosity a Marte Robô Spirit é sepultado na poeira de Marte Nasa vê água corrente em Marte
A Havaí Exploração Espacial Analógica e Simulação (HI-SEAS) está chegando ao fim de uma missão que se estendeu por 120 dias, realizada por uma equipe formada por três homens e três mulheres. Para a realização da experiência, eles permaneceram na encosta norte de Mauna Loa, no arquipélago norte-americano do Havaí.
Desde meados de abril de 2013, essa equipe vive uma experiência espacial em um habitat localizado a 2.440 metros acima do nível do mar, situado em um campo de lava estéril, semelhante ao ambiente encontrado em Marte.
Durante a experiência, eles agiram como se fossem os primeiros exploradores humanos em Marte, não só na realização de vários experimentos científicos, além de saírem em campo vestidos com trajes espaciais simulados, mas também ao consumirem refeições feitas com alimentos que poderiam sobreviver à longa viagem ao planeta vermelho.
Angelo Vermeulen é o comandante da HI-SEAS.
Vivenciando uma reclusão
Angelo Vermeulen, comandante da HI-SEAS falou via e-mail com o editor Leslie Mullen, da Revista Astrobiology, destacando a missão, já próxima de seu final, nesse 13 de agosto.
Vermeulen explicou que estão fazendo o estudo principal do alimento, além de vários projetos de investigação pessoal, estudos estratégicos para outros parceiros da pesquisa. “Nós, definitivamente, não estamos experimentamos o tédio ou a letargia que surgiram em outros estudos de isolamento semelhantes a esse”, disse.
“Acho que o tempo é realmente o nosso maior inimigo. Nós quase nunca terminamos em um dia o que tínhamos planejado e, obviamente, isso gera uma certa quantidade de estresse”, afirmou o comandante.
A equipe de pesquisadores foi instalada em uma cúpula geodésica montada naquela região inóspita. O design do habitat foi criado por Paul Ponthieux, da Envision Design. “Vivemos em uma cúpula geodésica com um andar extra que cobre metade de todo o espaço. Como consequência, agora temos um espaço aberto comum e pequeno - mas confortável – com quartos pessoais, no segundo andar. No primeiro mês, vivíamos sem janelas em tudo. Mas, então, uma pequena vigia foi adicionada e agora podemos desfrutar do sol durante o jantar”, disse o comandante Vermeulen.
Sobre o relacionamento entre os membros da missão, afirmou Vermeulen, “Claro que nós tivemos discussões, principalmente, sobre a programação e como as coisas deveriam ser organizadas. Mas essas discussões eram limitadas. Nós temos uma equipe muito compatível, e gostamos de franqueza. Isso torna as coisas muito mais fáceis. Mas o cansaço definitivamente aparece. Todos nós deveríamos ter uma semana de folga para dormir e recarregar as baterias”.
Detalhe de parte do interior da cúpula.
Alimentar-se fora da Terra
Falando sobre os alimentos, Angelo Vermeulen disse que os favoritos e pré-preparados incluem, sopa cremosa, arroz, purê de batatas, arroz instantâneo, framboesa, molho de maçã, e crackers.
“Também fizemos bons pratos cozidos. Alguns de nossos membros da tripulação são cozinheiros talentosos e todas as semanas nós temos surpresas diferentes. Algumas refeições de sucesso foram os russos borscht, tagine marroquina, enchilasagna, sopa de frutos do mar e fabada asturiana. Nós combinamos tortillas com diferentes legumes, queijo Velveeta e salsicha em conserva de peixe ou em combinações que mudam. Isto é, na verdade, descobrimos isso, por conta do sucesso das tortilhas na Estação Espacial. Em geral, os vegetais desidratados e liofilizados são um verdadeiro sucesso. Eles são usados como base diária em quase todas as refeições”.
Os alimentos liofilizados são uma grande promessa para o futuro das viagens espaciais. O processo de liofilização retira toda a água do alimento original, que pode ser hidratado posteriormente. “A carne liofilizada só é realmente agradável quando utilizada junto com as refeições. Em si, ela é muito branda e quase não tem aroma. A nossa refeição pré-preparada menos favorita deve ser o ‘Frango Kung Fu’. Ele torna-se enjoativo muito rapidamente. Não obstante, vários ingredientes, têm um sabor constante, e a textura da refeição pode ser descrita como ‘viscosa’. A vantagem do uso de refeições pré-preparadas é que estas consomem menos tempo em seu preparo e isso gera menos estresse”, afirmou o comandante.
Sobre as bebidas consumidas durante a missão, ele revela um dado surpreendente, “Quase não consumimos bebidas açucaradas. Nós começamos com Tang, mas depois, outras bebidas açucaradas mal foram tocadas. Nós bebemos, principalmente, água, chá e café”.
Estes são os quartos dos tripulantes da HI-SEAS.
A comida do futuro
Segundo Vermeulen, alguns ingredientes serão essenciais para as futuras missões espaciais tripuladas e devem incluir especiarias, como ervas e molho quente. Mas também “comfort food” como Nutella, manteiga de amendoim e margarina, pois são ingredientes ricos em fibra. “O problema com os ingredientes enlatados é que eles geralmente são altamente processados e, portanto, faltam as fibras. Nós, por exemplo, gostamos de trigo, em pão, biscoitos de centeio, além de nozes e frutas secas”.
Quando estão no espaço, os astronautas geralmente perderam peso, como ocorre com a tripulação da Estação Espacial Internacional (ISS). Durante a HI-SEAS, quatro membros da tripulação (incluindo Vermeulen) perderam um pouco de peso, entre cinco a oito quilos. “A perda involuntária de peso pode ser causada por diferentes alimentos, mas, definitivamente, também pela nossa rotina diária de treinamento. Todos nós exercitamos muito mais nesse habitat do que em nossa vida regular”, disse o comandante.
Estudando os trajes
Ele também informou que este programa de treinamento é parte de um estudo para a NASA desenvolver um sistema avançado de roupas para dormir. Segundo Vermeulen, “O objetivo primário desse estudo é de se estimar o intervalo de tempo que o vestuário normal e a roupa de dormir podem ser usados antes de serem considerados desagradáveis para o utilizador. As diferenças de desgaste dos trajes serão estimadas de acordo com o tipo de tecido e - mais crucialmente – por um tratamento antimicrobiano”.
Dois membros da equipe realizam uma missão extraveicular (EVA).
EVA no ambiente marciano
O comandante da HI-SEAS também falou das operações extraveiculares (EVA), quando o astronauta deixa as suas acomodações adaptadas e passa a integrar o ambiente comum de um planeta ou no espaço. De acordo com ele, “Uma EVA pode facilmente levar até uma hora para ser preparada. Especialmente, porque estamos testando diferentes modelos de trajes, e todos eles requerem procedimentos individuais. Testar todos os sistemas de refrigeração, as embalagens de bebidas e verificar se todos os sistemas estão funcionando corretamente é o que leva mais tempo”.
Perguntado sobre a experiência do isolamento em si, alem da reclusão social que foi submetido por esta experiência, Angelo Vermeulen afirma que, “O isolamento físico completo, o espaço limitado, vivendo em estreita colaboração com cinco colegas, reduziu o contato com os amigos e familiares, propiciando um potencial de tédio. Eu, definitivamente, precisarei de tempo para rever meus amigos e família novamente, e penso em fazer caminhadas e natação no mar. Mas permanecer isolado não é algo que eu considero difícil”.
Ele também observou que, “O que acabou sendo mais difícil é administrar o tempo. Dias e semanas parecem voar na velocidade da luz. Todos nós lutamos com nossos horários, que são preenchidos com atividades de pesquisa, registros de reuniões, cozinha e exercícios físicos. Nós realmente desejamos mover a exploração espacial tripulada para frente e queremos que esta missão seja a mais eficaz possível”.
Os pesquisadores podem deixar a cúpula somente usando o traje especial.
Isolamento, letargia e desentendimentos
Ainda sobre a questão do isolamento, Vermeulen afirma, “O lado positivo, é que esse ritmo intenso é o antídoto perfeito contra o tédio e a letargia. A imprensa deu muita atenção à missão simulada russa Mars500 e aos problemas psicológicos que foram observados. Níveis elevados de tédio e letargia estavam presentes durante a maior parte da missão e somente durante os últimos 20 dias é que a tripulação voltou para um estado de alta produtividade. Eu não sei o suficiente sobre as condições específicas da Mars500 para identificar a origem exata da diferença com a nossa missão. Existe, evidentemente, uma grande diferença na duração, de 120 para 500 dias. Quatro meses é um período que é relativamente fácil de entender. Ficar um pouco entediado durante um isolamento de 500 dias pode ser algo inevitável. Mas também suspeito que o alto nível de autonomia nos concedido pelo HI-SEAS, através de seus principais investigadores Kim Binsted e Jean Hunter, seja parcialmente responsável pela nossa alta produtividade. Isso inclui nossa capacidade para definir a pesquisa pessoal, algo que é bastante incomum em voo espacial tripulado. Os astronautas são tipicamente ‘operadores’ que realizam experiências pré-definidas”.
E segue explicando, “Aqui no HI-SEAS estamos perseguindo interesses muito pessoais, ajudando uns aos outros em uma base diária. É uma grande oportunidade para sermos capazes de criar durante a HI-SEAS, e não apenas seguir cegamente os procedimentos. Isso é extremamente motivacional, e é uma das razões de quem geralmente trabalha em longas jornadas. Agora, menos de duas semanas do fim da missão, estamos correndo para ter certeza de que pudemos fazer tudo que pretendíamos. Como comandante, eu aprendi também que é fundamental manter as pessoas falando e manter o grupo junto de maneira física e emocional”.
Os seis membros da equipe que realizou a missão.
O legado da HI-SEAS
Sobre a missão em si e sua finalização, observou Vermeulen, “Honestamente, nós estamos tentando, principalmente, produzir o máximo de dados e resultados que pudermos. Nós queremos gerar uma boa pilha de trabalhos científicos, após esta missão. No dia 13/08, quando sairmos, vamos ser saudados pelos meios de comunicação internacionais. Não sei como isso vai ocorrer. Podemos apenas querer olhar para o céu, o sol e a paisagem, respirar ar fresco, e não falar. Meus companheiros tripulantes já sugeriram que eu deveria falar por todos, já que eu sou o comandante. Não tenho certeza se isso é uma boa idéia. Há também várias recomendações e ideias que queremos trazer para as próximas missões HI-SEAS, que eu não posso revelar agora”.
Logo após o término da missão será feito um detalhado balanço pelos investigadores principais, Kim Binsted e Jean Hunter. Eles deverão avaliar todo o trabalho da equipe comandada por Vermeulen e, oportunamente, deverão se manifestar sobre a realização da Havaí Exploração Espacial Analógica e Simulação (HI-SEAS).
* Com informações de Space.com e tradução de Pepe Chaves. Esta matéria foi composta com base em material fornecido pela revista Astrobiology, publicação digital patrocinada pela NASA e seu Programa de Astrobiologia. Para saber mais, clique aqui.
- Fotos: Angelo Vermeulen / HI-SEAS.
- Extra:
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- Extra: Assista o vídeo de um eclipse em Marte
- Produção: Pepe Chaves © Copyright 2004-2013, Pepe Arte Viva Ltda.
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