NEO - Objetos Perto da Terra
Itacuruba-PE: De olho nas ameaças que vêm do céu A ideia de monitorar objetos celestes como meteoritos é antiga e foi abordada na obra do escritor ficcionista Arthur C. Clarke. No entanto, um novo projeto que está sendo implantado no Brasil, poderá ser referência na detecção de NEOs no hemisfério Sul.
Por Márcio R. Mendes* De Dois Córregos-SP Para ASTROVIA
Os perigos externos: da ficção para a vida real.
Spaceguard
O conhecido autor Arthur C. Clarke deixou-nos um legado e tanto na forma de obras de ficção científica, muitas delas como vislumbres de uma realidade possivelmente imediata. Encontro com Rama é certamente uma dessas obras, que ganhou o respeito de muitos, gerou uma continuidade em forma de mais dois livros (escritos em parceria com Gentry Lee), além da indústria de games e com boas chances de ainda vermos retratado no Cinema.
Clarke tem a característica de arrebatar a atenção de seus leitores já na primeira página de suas obras. Logo ao início, Clarke nos conduz a uma realidade que adoramos esquecer: a mesma possibilidade da surpresa que, ao que tudo indica, causou a extinção de grandes espécies, antes senhores dessas terras.
Em 1908, Moscou escapou por apenas três horas, da destruição total, com a queda de um grande meteoro. Considerando a escala do Universo, esta diferença temporal é quase um “nada”! Em 1947, por uma diferença ainda menor, Vladivostok escapou do segundo maior meteoro do século.
Nosso mundo está praticamente ocupado de polo a polo, de forma que, como coloca Clarke, é só uma questão de tempo…
Ainda em sua primeira página, já em tons ficcionais, o autor escolhe o ano de 2077 para descrever o terror vivido pelos europeus quando assistem impotentes, ao aparecimento de uma enorme bola de fogo proveniente do céu oriental e, em segundos superar a luz do Sol. A desintegração desse bólido na atmosfera tem consequências catastróficas para Pádua e Verona, cidades que, sob uma chuva de toneladas de rochas e metais fundidos, são varridas da face da Terra em minutos. Finalmente, as águas do Adriático venceram as provocações humanas, afundando para sempre a poética Veneza. Uma mega catástrofe sem precedentes é rapidamente desenhada e descrita na obra de Clarke, como uma guerra vivida numa só manhã, onde a destruição total e sumária finalmente faz a humanidade acordar e perguntar sobre quando e onde viveríamos outra catástrofe dessa.
'Encontro cm Rama', obra de Arthur C. Clarke.
Agindo como uma consciência coletiva de toda a raça humana, toma-se a decisão: não haveria uma próxima vez! Com isto, Clarke cria o motivo de uma das maiores descobertas da humanidade, o tão sonhado “contato”!
Nascia o projeto fictício ‘Spaceguard’. ‘Encontro com Rama’ foi editado em 1973 e naquela época não havia nada semelhante aos projetos atuais (nada fictícios) que visam monitorar os objetos celestiais que eventualmente passam próximos de nosso planeta, os chamados NEOs (Near Earth Objects), Objetos Próximos da Terra. Difícil dizer que os atuais projetos, de competências de áreas de pesquisas astronômicas, tenham se originado com exclusividade ou influenciados pela obra de Arthur C. Clarke; mas, diante às estatísticas de tais ocorrências, e de nosso passado geológico, a ideia de que seja uma questão de tempo, nos parece óbvia. Certamente, neste sentido, a ficção de Clarke pode ter influenciado a realidade.
O projeto Spaceguard estende-se muito além da Terra. Em 2130, radares instalados em bases em Marte, junto com uma rede de outros semelhantes na Terra e na Lua. Através do projeto, são descobertos novos objetos no sistema solar, além de uma taxa de quase uma dúzia por dia, em sua maioria, asteróides e cometas. No entanto, algo muito singular é detectado além das fronteiras do nosso sistema planetário: um objeto de geometria muito regular. De formato cilíndrico, ele viajava das profundezas do Universo, atravessando o espaço, vindo em direção à Terra. Mais tarde descobre-se que nosso Sol é na verdade o alvo do estranho objeto.
Telescópio que será usado no Observatório de Itacuruba-PE.
RAMA
À medida que se aproxima da Terra, mais detalhes do objeto vão sendo desvendados pelos cientistas. O grau de resolução dos radares, combinados em técnicas de interferômetria, revelam detalhes da estrutura, mesmo quando o objeto se encontrava além dos domínios de Plutão. Inicialmente designado como objeto 31/439, tal qual, entre muitos deles, este exemplar começa a chamar a atenção devido à sua forma bastante regular e o fato de apresentar um movimento de rotação, que foi calculado graças a um ponto em sua superfície lisa, provavelmente uma pequena cratera. Destoando-se dos asteróides convencionais, que apresentam rotações com períodos de algumas horas, este tinha um período de apenas quatro minutos.
Mais adiante percebe-se que o objeto dificilmente poderia ser alguma coisa “natural”. O índice de reflexão da luz em sua superfície era muito distinto das demais grandes rochas que vagavam pelo espaço. Definitivamente, não se tratava de um asteroide ou cometa, o que produziu uma grande comoção entre os responsáveis pelo Spaceguard.
O objeto já merecia um nome, além de sua simples designação numérica. Isto mostrou-se como um problema, afinal, devido a alta taxa de descobertas desses “vagabundos do espaço”, a muito se tinha esgotado os nomes da mitologia grega e romana, de forma que o panteão hindu começava a ser explorado. Rama foi o nome de batismo.
Enquanto o objeto se aproxima e a resolução de seus detalhes mostra uma surpreendente estrutura lisa, em forma de um grande e longo cilindro, surge a idéia de que, pelo comportamento do objeto no que diz respeito à sua interação gravitacional com outros objetos, só seria explicado como uma estrutura oca. Tal hipótese, combinada com a rápida rotação de apenas quatro minutos, produziria em seu interior uma gravidade artificial exatamente como a da Terra!
O que se segue em sua obra, é um convite à uma boa leitura, com emoções garantidas para quem imagina como será a exploração humana em ambiente estranho e seguramente alienígena.
Mais no terreno de sua aplicabilidade e justificativas, o fictício Spaceguard já é uma realidade; bem menos ambicioso que o descrito no livro e, claro, com outros nomes.
Local onde será construído o Observatório de Itacuruba-PE e a visão proporcionada pelo mesmo.
IMPACTON
Em um futuro próximo, até como homenagem ao escritor Arthur C. Clarke, o conjunto de projetos ligado às instituições de pesquisa, bem como a grande quantidade que contribuições de amadores em Astronomia (e nem por isso de menor importância), poderia ter o nome bastante apropriado, Spaceguard.
Atualmente existe o NEAT (Near-Earth Asteroid Tracking) e muitos outros, como o LINEAR (Lincoln Near Earth Asteroid Research Project), o Spacewatch Project, Minor Planet Center, Australian Spaceguard Survey, ou ainda Uppsala – ESO Survey. Estes projetos têm como tarefa principal, a detecção e monitoramento de objetos que se aproximam da Terra, especialmente, os que detêm algum potencial para impacto.
Não há nada “catastrófico” previsto para ocorrer os anos seguintes e, mesmo aqueles objetos que podem ser considerados riscos mais tarde, dependem de alterações que modifiquem essa qualificação, em função de possíveis influências gravitacionais não consideradas. Justifica-se então a monitoração. Contudo, nota-se pela distribuição desses órgãos e centros de observação, que os céus boreais, mantêm uma vigilância razoavelmente satisfatória. Mas, a ameaça pode vir dos céus austrais. A Austrália mantém algum serviço nesta área, mas levam uma enorme desvantagem, se comparados com os empreendimentos semelhantes levados a cabo no hemisfério norte.
No ano passado, tivemos o privilégio de sediar no Rio de Janeiro, Brasil, durante o Ano Internacional da Astronomia, uma das cúpulas mais importantes da área, a reunião geral da IAU [órgão deliberativo que rege a Astronomia a nível internacional]. Nela, nasceu o Projeto IMPACTON (Sigla inglesa para “Mapeamento e Pesquisa de Asteróides nas Cercanias da Terra no Observatório Nacional”). Com isso, o Brasil passará a integrar os programas internacionais que visam a detecção e monitoramento de pelo menos 90% de objetos como asteróides de cometas com risco de colisão contra o nosso planeta.
Muitos dos objetos descobertos em observatórios do hemisfério norte acabam sendo “perdidos” quando sua trajetória depende de uma continuidade observacional a partir do hemisfério sul.
O projeto IMPACTON de competência do Observatório Nacioanal, inicialmente definido como Projeto Estruturante, no Plano Diretor do ON (2006-2010), tem como diretrizes:
- ampliação de cooperação com outros grupos; - ampliação de atividades do ON em outras áreas do país e fortalecimento de atuações do ON; - fortalecimento em áreas de pesquisa com a contribuição para formação de recursos humanos, em estreita colaboração com cursos de pós-graduação do ON e PBIC.
Assim, com recursos da Finep, CNPq e FAPERJ, definiu-se pela construção de um Observatório em área remota. O projeto envolveu a escolha do sítio de instalação do equipamento, contando com uma infra-estrutura adequada, além de um sistema de transmissão de dados a partir de operação remota.
As três fases do Projeto envolvem a definição, a implantação e a operacionalização, sob responsabilidade da coordenadora do projeto, Daniela Lazzaro (COAA/ON), e os colaboradores, Terezinha Rodrigues, Carlos Henrique Veiga, Fernando Roig, Jorge Marcio Carvano e Thaís Mothé Diniz.
O local escolhido foi um terreno no município de Itacuruba, no sertão de Pernambuco. O Projeto ainda conta com apoio da Prefeitura Municipal, da Companhia Hidro Elétrica do São Francisco, da Associação de Agropecuaristas Lealdade de Santa Cruz e do Instituto Tecnológico de Pernambuco (ITEP) e da Representação do MCT no Nordeste.
O instrumento principal é um telescópio com espelho primário de um metro de diâmetro, construído pela Astro Optik Phillip Keller (empresa alemã), com recursos para automação. A redoma está sendo comprada da empresa Sírius Observatories (Austrália), com sete metros de diâmetro, escolhido devido à sua boa performance às intempéries e possibilidades de automação.
O telescópio contará com uma câmera CCD da Apogee Instruments (EUA), que poderá ser controlada remotamente. Vale lembrar que o grupo BRASS, que nasceu de membros da REA mantém algum pioneirismo na robotização de observatórios, o que já lhes valeu quase uma dúzia e meia de SuperNovas nos últimos anos, onde diversas delas foram divulgadas no jornal digital Via Fanzine.
Espera-se que a câmera acoplada ao telescópio seja capaz de realizar detecções e observações de pequenos objetos no espaço, para posterior determinação de suas órbitas, além de propriedades rotacionais e de superfície; ou seja, que nos apontem os mesmos elementos observados e descritos na novela de Arthur C. Clarke ao apresentar uma descrição de Rama.
Esperamos com isso, que nosso país possa contribuir para as Ciências Astronômicas à nível internacional e que o Projeto seja a motivação para futuros profissionais e interessados; além, claro, do desejo de nunca lograr êxito na detecção de qualquer ameaça tangível ao nosso planeta ou tão grave quanto àquela descrita nas páginas iniciais de Encontro com Rama.
Recentemente, um meteoro destruiu casa na Indonésia.
Meteorito na Indonésia
Enquanto fechávamos esta matéria, recebemos a notícia que um indonésio teve danos na sua casa, que foi atingida por um meteoro na segunda-feira (03/05/2010), segundo informações da Agência Nacional Aeronáutica da Indonésia, divulgadas pela agência AFP. Autoridades locais disseram que estão procurando pedaços de meteoritos entre os escombros da casa. Não há informações sobre vítimas.
* Márcio Mendes é físico, professor em Dois Córregos/SP, astrônomo amador membro da REA (Rede Astronômica Observacional) e consultor de Astronomia para os portais da rede Via Fanzine.
Fotos: Itacuruba divulgação / Romeo Gacad/AFP / Arquivo do autor.
- Colaborou: José Ildefonso Pinto de Souza (SP).
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Asteroides Cientistas preparam-se para encontro cósmico inédito* A ameaça está na combinação de tamanho com imensa energia cinética.
A primeira edição da Conferência de Defesa Planetária da Academia Internacional de Astronáutica é realizada de 27 a 30 de abril, em Granada, na Espanha. Entre os temas em discussão um chama a atenção: a preparação para o encontro com um asteroide.
Estudando o inimigo
Com 270 metros de diâmetro e peso de cerca de 20 milhões de toneladas, o asteroide Apophis passará próximo à Terra no dia 13 de abril de 2029. Segundo a Agência Espacial Europeia (ESA), mesmo que não ofereça perigo real, ele representa um tipo de objeto que pode ser encarado como uma ameaça futura.
A ameaça está na combinação de tamanho com imensa energia cinética. Se o Apophis se chocasse com a Terra, os resultados seriam catastróficos. Por conta disso, os cientistas reunidos na Espanha pretendem começar a usar a visita do asteroide para reunir conhecimentos que possam ser empregados em eventos semelhantes.
O principal objetivo é usar a oportunidade para entender melhor os objetos próximos da Terra, conhecidos como NEO (Near Earth Objects), “objetos perto da Terra”.
Multidisciplinaridade e criatividade
Para isso estarão reunidos especialistas em astrometria, dinâmica orbital, caracterização física de asteroides e cometas, aerotermodinâmica, modelagem de impactos, projetistas de missões espaciais, engenheiros de sistemas e diversos outros, com a proposta de lançar um programa multidisciplinar para estudar o Apophis e os NEOs.
"Trata-se de um tema atraente para muitos pesquisadores, uma vez que em estudos a respeito de tais objetos - e em missões espaciais relacionadas a eles - são combinados diversos campos técnicos e científicos. Encontrar novas soluções ou aumentar o conhecimento sobre os NEOs exige muita criatividade. Estudar como evitar uma possível catástrofe em escala planetária é um grande desafio", disse Andrés Gálvez, gerente do Programa de Estudos Gerais da ESA e um dos organizadores da conferência.
Ideias são bem-vindas
Para ampliar o interesse no tema, a ESA está organizando um concurso voltado a jovens pesquisadores. O desafio é apresentar propostas de pesquisa que tragam contribuições importantes aos estudos de NEOs.
* Informações de Inovação Tecnológica e ESA (European Space Agency).
- Foto: Google Maps.
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