Brasil Antigo
Vale do Peruaçu: A Lapa do Rezar São inumeráveis os motivos abordados por esses autores desconhecidos e a sua habilidade, nos casos mais complexos e de maior grau de dificuldade, questiona o nosso discernimento, quando admiramos esta sua inigualável ‘arte’.
Reportagem de J. A. FONSECA* Do Vale do Peruaçu/MG Dezembro/2019
Detalhe de figuras expressando um misterioso simbolismo. Leia também: A grandiosidade do Vale do Peruaçu - PARTE 1 Mais um Enigma Brasileiro – Sete Cidades–PI Assista: TV FANZINE Especiais sobre muros de pedras em Itaúna
Em termos gerais, quando você pensa que já viu tudo o que o Vale do Peruaçu tem para mostrar, vemo-nos diante da Lapa do Rezar. Após a subida com cerca de 500 degraus até o topo da montanha, deparamo-nos, de repente, com uma visão impactante. Uma vasta caverna iluminada pelo sol com perto de 40 metros de altura em alguns pontos e uma abertura de 90 metros em sua extensão. É uma visão espetacular.
Vem-nos então a certeza de que esta região oculta inúmeros mistérios do passado do Brasil, sendo que parte deles vem sendo representados pelos ricos painéis líticos que ali podem ser vistos, com suas figuras multiformes e multicoloridas. São inumeráveis os motivos abordados por esses autores desconhecidos e a sua habilidade, nos casos mais complexos e de maior grau de dificuldade, questiona o nosso discernimento, quando admiramos esta sua inigualável ‘arte’.
Os gigantescos afloramentos rochosos se mostram como esculturas desgastadas pelo tempo.
Quando chegamos à Lapa do Rezar vemos ao fundo, à direita, nos imensos paredões pétreos um gigantesco painel de pinturas esplendidamente coloridas e a alturas significativamente elevadas. Uma passarela de madeira percorre uma extensão considerável desta grande abertura a certa distância das multivariadas inscrições e nos conduz ao portal que leva ao interior da caverna, com 400 metros de profundidade. Temos de utilizar de lanternas em nossos capacetes para percorrer este espaço oculto na escuridão e cheio de estalactites e estalagmites excepcionalmente belas.
A ponte pênsil sobre o rio Peruaçu que leva à Lapa do Rezar.
Sem uma lanterna, a escuridão é total, podendo-se ver apenas uma claridade ao longe, vinda da entrada. A luz dos capacetes permite-nos ver as imagens brilhantes decorando o seu interior sombrio.
A caminhada completa na trilha partindo do Centro de Visitantes mais a escadaria até o alto da gruta e a volta totaliza 2400 metros. Atravessamos uma ponte pênsil sobre o rio Peruaçu, hoje quase inexistente, mas mantendo ainda pequenos percursos de água corrente. Por isto, seguimos em parte, no meio de uma mata mais esverdeada por estar mais próxima do rio e, em parte, no meio de árvores ressequidas por ação de um sol escaldante. O total da caminhada leva cerca de 3h30.
Os afloramentos rochosos da região formam paredões gigantescos e alguns ambientes destacam formas humanas e de animais, como se fossem antigas esculturas desgastadas pelo tempo. Em muitos lugares do Vale nos deparamos com torres pétreas de formatos variados elevando-se às margens do caminho que nos leva às grutas e cavernas da região. Apesar da seca e das árvores ressequidas as imagens de pedra calcária são intrigantes e se destacam naquele ambiente causticante e enigmático.
Esculturas naturais colossais na escuridão da caverna.
Nos abrigos que foram pesquisados no Vale do Peruaçu e nas cavernas podem-se ver registros inumeráveis da presença humana e, mais do que isto, painéis esplendidamente elaborados, carregando em seu conteúdo multicor um simbolismo estranho e figuras complexas, em sua maioria não compreensíveis por seus admiradores e pesquisadores. As inscrições, chamadas de grafismos, formam um exuberante museu a céu aberto com manifestações de estilos variados e se diz que, em seu conjunto, tratam-se de um dos mais espetaculares agrupamentos rupestres de toda a América. Pelo pouco que já vimos teremos de concordar com esta afirmativa.
Acredita-se que as primeiras ocupações na região se deram entre 12000 e 11000 anos, mas também constam ocupações mais recentes, entre 7000 e 2000 anos.
A Lapa do Rezar é uma das maiores cavernas das que são conhecidas no Vale do Peruaçu e pode-se dizer seguramente que esta se coloca, sem dúvida, dentre um dos mais importantes sítios arqueológicos e espeleológicos do Brasil. Neste artigo queremos nos deter um pouco mais nesta gruta fantástica para comentarmos sobre o seu conteúdo registrado em pedra. Contém figuras de caráter simbólico e inexplicável em uma grande parte dos painéis ali gravados, como nas demais grutas que visitamos, além de dar especial destaque na aplicação de cores variadas, com muitas figuras pintadas na cor branca e contornos bem elaborados.
A grande abertura da caverna que acolhe grande quantidade de inscrições milenares.
Sabe-se que diferentes grupos humanos teriam sido os autores destas pinturas no Vale do Peruaçu que são caracterizadas por estilos complexos e ricos em simbologia, na sua maior parte. Temos também, a presença de inúmeras inscrições mais simples. Não se pode explicar, entretanto, de forma razoável, que grupos diferentes teriam sido estes e, excetuando-se os registros de caráter mais comuns localizados na base dos rochedos, as que se acham em pontos mais elevados e, coincidentemente, de caráter mais complexo, exigiriam condições especiais para a sua feitura e um grau de discernimento maior do que as de caráter mais simplório.
Parte de um dos painéis que guardam inimagináveis pinturas em cores variadas.
Estes fenômenos podem também ser observados na Lapa do Rezar, como mostraremos a seguir. Temos aí inscrições muito bem elaboradas e de teor desconhecido gravadas em vastos painéis, que apesar de se ver superposições nas pinturas, estas guardam uma estética misteriosa e uma beleza que atrai a atenção do mais desatencioso visitante. Muitas destas figuras encontram-se também elaboradas a alturas surpreendentes e em locais de difícil acesso, levando-nos a imaginar que seus autores teriam de ser mesmo, no mínimo, pessoas muito exóticas ou, em outra hipótese, que estavam empenhadas em gravar algo de relevante importância para a posteridade.
O que chama a nossa atenção também é que estas figuras foram feitas em grande quantidade e são muito ricas de conteúdo, constituindo-se de muitos elementos simbólicos, muitos dos quais são inteiramente desconhecidos para nós. Em relação a uma grande parte das inscrições, podemos fazer apenas especulações sobre o seu significado, apesar de que alguns destes conjuntos mostram figuras excessivamente estranhas, que são de difícil compreensão pelo raciocínio lógico ou pela suposição apenas.
Sabemos também que não é fácil estabelecer uma cronologia precisa para estes registros rupestres, em geral e, no caso do Vale do Peruaçu, não se pode afirmar seguramente se haveria alguma relação entre os mesmos e os demais vestígios arqueológicos encontrados e pesquisados na região. Estes últimos puderam ser analisados e, por isto, a possibilidade de receberem datações aproximadas de sua procedência tornara-se mais provável.
É importante comentar que no Norte de Minas Gerais temos também, além do complexo do Peruaçu com suas múltiplas manifestações de ‘arte’, o complexo de Montalvânia com seus registros milenares e igualmente misteriosos, no qual já estivemos presentes há algumas décadas e tornamos pública uma reportagem sobre aquele local.
Uma visão mais extensa do belíssimo painel principal, mostrando superposição de pinturas.
As superposições da Lapa do Rezar e os acréscimos de figuras não diminuem a beleza estética do conjunto rupestre como um todo, mas dão indicações de que grupos diferentes estiveram presentes no local e que muitos destes teriam feitos gravações naquele painel lítico. Mesmo assim, seus motivos impressionam e o seu conjunto oferece-nos uma visão encantadora. O esmero que guarda muitos destes registros, carregados de figuras policrômicas, mostram com especialidade que seus autores não poderiam tratar-se de pessoas muito comuns, selvagens ou seres humanos de mente limitada ou rudimentar.
Pode-se ver que existem muitas figuras de caráter mais simplório nas redondezas, como rabiscos mostrando pessoas e animais, sem proporções definidas e destituídas de maiores detalhes na sua execução. Estas, caracteristicamente, podem ser atribuídas a pessoas mais comuns que por ali estiveram em passado remoto, mas insistimos que em muitas outras, gravadas também em grande profusão e rico sentido simbólico, mostram agradável proporção, estética visual, belas figuras e cores variadas, além de cuidados especiais na sua feitura. Estas, repetimos, é que são, especialmente, alvo de nossas observações.
Outro detalhe das incríveis figuras da Lapa do Rezar.
Destacamos algumas destas figuras com sua rica expressividade em um quadro onde reunimos exemplares desta criatividade primitiva, sobre as quais não podemos definir com precisão absoluta o que elas poderiam, de fato, representar. Também encontramos aí diversas figuras que se assemelham a letras do alfabeto latino, as quais acham-se gravadas no meio de muitas outras de estilo extravagante e caráter emblemático, que também mereceriam uma análise mais acurada sobre o seu provável significado.
Já afirmamos em outros artigos que o nosso propósito não é questionar os inúmeros e importantes trabalhos acadêmicos realizados, os quais, temos acompanhado com atenção, mas levantar a questão do conteúdo enigmático que existe em uma grande quantidade destas manifestações líticas diferenciadas em nosso país. Sob nossa percepção, a sofisticação de muitas destas figuras parecem querer gritar em nossos ouvidos que existe algo de relevante importância por trás de suas intrincadas figuras e símbolos diversos, como algo que nos quisesse veladamente contar uma história desconhecida de um tempo e de um povo que, por razões ainda inexplicáveis, estiveram presentes por estas ‘bandas’ misteriosas do Brasil mais remoto.
Nossos estudos não terminam aqui e nossas análises sobre a complexidade destas figuras permanecem, contando sempre com o auxílio de comparações feitas entre outros registros e outras localidades, na tentativa de encontrar um elo que as possa unir e identificar simbolismos importantes na sua estranha realidade, ou mesmo uma espécie de ‘chave’ que possa estar oculta no meio de suas manifestações variadas.
Estranhos caracteres grafados na entrada da caverna.
Algo que dificulta esta situação é que existe uma estranha multiplicidade simbólica presente nas manifestações líticas brasileiras e, no caso específico do Vale do Peruaçu, nos sítios arqueológicos onde estas se acham impressas, vamos encontrar uma grande variedade de ícones registrados, assim como grande divergência nos motivos adotados por seus autores. Este dado conduz a um novo enigma a ser estudado, considerando-se que as distâncias entre estes sítios não passam de algumas centenas de metros apenas, o que vem acrescentar pesada dose de mistério em nossas perspectivas, principalmente quando pretendemos identificar os seus autores e os seus pensamentos, em torno de uma ‘arte’ tão diferenciada e tão complexa em seu conteúdo simbólico que fora idealizada e produzida tão próxima entre si.
* J.A. Fonseca é economista, aposentado, espiritualista, conferencista, pesquisador e escritor, e tem-se aprofundado no estudo da arqueologia brasileira e realizado incursões em diversas regiões do Brasil com o intuito de melhor compreender seus mistérios milenares. É articulista do jornal eletrônico Via Fanzine e membro do Conselho Editorial do portal UFOVIA. E-mail: jafonseca1@hotmail.com.
- Fotografias e ilustrações: J. A. Fonseca.
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Esta matéria foi composta com exclusividade para Via Fanzine©.
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