EXPRESS - por ANTÔNIO SIQUEIRA - ARTICULISTA |
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Mundo atual: Um olhar moderno para o fim do mundo Enganos e acertos de homens comuns e gênios
Por Antônio Siqueira* Do Rio de Janeiro-RJ Para Via Fanzine
Kepler, que levou a sério o Inferno de Dante.
Dezembros são nostálgicos e acabam desabando em nosso cotidiano como meteoritos incandescentes. É quando fazemos, de forma clara e objetiva, o balanço de tudo que vivenciamos durante o ano inteiro. Por vezes, essas reflexões exploram quase toda uma vida. Os vários porquês disso, daquilo, o que poderíamos ter realizado, o que deixamos de fazer. O que amamos o que não amamos; em suma; concerne-nos a quase um inferno astral. Somos sentimentais incorrigíveis, o que não deixa de ser uma cafonice desmesurada. Abafamos dentro de nós mesmos uma capacidade infinita de construir, de criar e fazer acontecer por conta destes obstáculos, naturalmente, humanos.
Mergulhamos na mediocridade, não obstante, numa guerra sem trégua contra nós mesmos. Somos promíscuos demais, absurdos demais e patéticos demais. O pior é que o dito Amor, não tem culpa alguma nesse show pirotécnico de hipocrisias e chego a pensar que nos bastamos a nós mesmos.
Pessoas se abandonam, não há mais tolerância e a dádiva das paixões sucumbiu ao materialismo insano. Pois é..., no que estamos nos transformando? Num bando de psicopatas? Em urbanóides mentecaptos? O mundo havia entrado na década de 1920 do século passado em uma crise pós-guerra, até que os EUA, já em 1929, se viram mergulhados na pior recessão da história. Pessoas vendiam suas próprias roupas e seus móveis de casa para comer. A humanidade não tinha a noção básica do que se passava.
Passou. Estamos no começo de um século que, ao menos, deveria ser próspero e baseado nas sociedades em desenvolvimento. Porém, os ventos soprados pela tão anunciada globalização ficaram sombrios. Os norte-americanos viviam o futuro em 1929. Quase tudo o que para as últimas gerações parece parte da natureza, era novidade ali. Tudo era prosperidade, principalmente no, setor automotivo que, na época, engatinhava.
Para se ter uma idéia, a frota de carros havia crescido de 7 milhões para 30 milhões de carros. O rádio acabara de chegar. As principais companhias aéreas se formavam. O cinema deixava de ser mudo. A bolsa de valores refletia tudo isso, o preço das ações atingia um platô permanentemente elevado; era aí que residia o grande perigo. Com o preço das ações lá em cima, grupos de mega investidores que agiam em conluio (bandidagem de colarinho branco, semelhante aos nossos formadores de quadrilhas aqui no Brasil) para forçar a alta das ações; os lucros eram estratosféricos.
O resultado? Você conhece e está vivenciando. Houve uma contaminação geral e outros grupos bem menores, resolveram agir da mesma forma. Resultado final: chegou a um ponto que o valor das ações não tinha mais a ver com o valor das empresas, criou-se uma espécie de dinheiro fictício. Quebradeira de bancos, o FED (Banco Central Americano) tirando o dinheiro de circulação e a crise inflacionando a tudo como uma gigantesca tsunami.
Quem deixou tudo o que tinha, na esperança de enriquecer amparado pela lei do menor esforço, pensou em se jogar pela janela. Ou o fez. Erros, erros e mais erros. Até os grandes gênios erraram feio um dia, mas não chegaram a decretar o “fim dos tempos” por conta de suas asneiras. Basta dizer que Johannes Kepler, um dos grandes precursores das teorias astronômicas, descobrindo as leis do movimento planetário, defendeu até a sua morte a tese de que astronomia e astrologia em a mesma coisa. Risível? De matar de rir.
Galileu fez descobertas fantásticas para sua época, na mecânica, na física e na astronomia. A Terra era redonda mesmo, apesar de ninguém tê-la vista do espaço e também não era o centro do Universo como alegavam os “acadêmicos” de sua época. Mas, por pouco não vira churrasco nas mãos da inquisição. Só que, cismou com o Inferno de Dante e resolveu prová-lo matematicamente. O resultado, cômico, foi ele ter descoberto o Inferno de Dante Alighieri, da “Divina Comédia” como algo cônico, com a parte mais profunda encravada no centro da Terra e em baixo de Jerusalém. Nos parece uma viagem tão grande quanto descrever o castelo de Frankenstein.
O que não se admite mesmo são os mesmos erros serem cometidos por gerações não tão distantes das nossas. Analisando friamente, bem que os remanescentes de 1929 poderiam nos ensinar o caminho das pedras. Talvez independa deles, pois a natureza humana é lamentavelmente pobre, quando o assunto é caráter. As ambições desmedidas e a cobiça desmesurada são bactérias poderosas.
O planeta é destruído diariamente. A coisa é sistemática e descabida. O clima enlouquecendo mais a cada ano diante da emissão intermitente de gases na atmosfera e o mega desmatamento amazônico. O cultivo exagerado de matéria-prima para o biodiesel deveria ser analisado com cautela pelo Governo Federal e o tráfico de madeira, punido com mais rigor.
Reiniciou-se a corrida armamentista. Bem aos moldes da Guerra Fria, só que, agora se alastra pelas nações da Ásia e América do Sul. Esses países, além de seus governantes não serem menos lunáticos que os das grandes potências, possuem populações de baixa escolaridade e adendo cultural, em sua maioria. Como se não fosse suficientemente grave, alguns deles sofrem com a maldição do fanatismo religioso, que atira um povo contra o outro.
Um mundo livre de superstições, talvez fosse um mundo mais seguro. Ignorância e poderio nuclear, não diferente dos gigantes do G8, formam uma combinação perigosa e, apenas através do conhecimento, o mundo natural das pessoas pode se tornar melhor e capaz de demonstrar tolerância e compaixão.
Quem sabe, lançando um olhar mais piedoso e, igualmente, cheio de compaixão, para o que já é o fim do mundo humano. Galileu ou Kepler, com suas genialidades e asneiras, com certeza não lançaram um olhar mais concreto e moderno para este futuro sinistro.
- Imagem: Arquivo do autor. - Produção: Pepe Chaves. © Copyright 2004-2008 Pepe Arte Viva Ltda.
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Literatura: De um pé de tamarindo à morbidez de um Neruda às avessas Não é exagero literário comparar a linha poética do paraibano de Pau'darco, Augusto dos Anjos a de Pablo Neftali Neruda. Por Antônio Siqueira* Do Rio de Janeiro-RJ Para Via Fanzine
Dos Anjos e Neruda.
A intrínseca relação destas duas vertentes geniais advém de forma bastante prosaica no extremo de um e de outro. A visceralidade dos versos de ambos, não obstante à temática do amor abrasivo, a forma contundente da desilusão e do vinvenciamento de emoções semelhantes.
Neruda prima, com versos de urgência magnânima e contumaz o encantamento existencial em todos os pilares da existência humana; do amor, do espírito revolucionário, do ser político. Augusto dos Anjos abala as estruturas do mórbido ao rufar dos corações e mentes traídas. Essa filosofia, fora do contexto europeu em que nascera para Augusto dos Anjos seria a demonstração da realidade que via ao seu redor, com a crise de um modo de produção pré-capitalista, proprietários falindo e ex-escravos na miséria. O mundo seria representado por ele, então, como repleto dessa tragédia, cada ser vivenciando-a no nascimento e na morte. Um personagem constante em seus poemas é um pé de tamarindo que ainda hoje existe no Engenho Pau d'Arco.
Neruda confessou-se em certa feita, amante do único livro de Augusto, "Eu e outras poesias", editado em 1910. É a reunião do livro 'Eu' (publicado em vida) a outras poesias que foram acrescentadas postumamente à obra (seu amigo Órris Soares reescreveu o seu póstumo). Augusto dos Anjos não viveu para conhecer Neruda, pois morreu de pneumonia aos 30 anos em 1914. A antítese das temáticas se encontram, metafisicamente, na narrativa literária. Basta pôr em prática a 'Mãe Sensibilidade'. Reparem bem nestes versos:
Psicologia de um Vencido
Eu, filho do carbono e do amoníaco, Monstro de escuridão e rutilância, Sofro, desde a epigênesis da infância, A influência má dos signos do zodíaco. Profundissimamente hipocondríaco, Este ambiente me causa repugnância… Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia Que se escapa da boca de um cardíaco. Já o verme - este operário das ruínas - Que o sangue podre das carnificinas Come, e à vida em geral declara guerra, Anda a espreitar meus olhos para roê-los, E há de deixar-me apenas os cabelos, Na frialdade inorgânica da terra! Augusto dos Anjos
A Dança
Não te amo como se fosse rosa de sal, topázio ou flecha de cravos que propagam o fogo: te amo secretamente, entre a sombra e a alma. . Te amo como a planta que não floresce e leva dentro de si, oculta, a luz daquelas flores, e graças a teu amor vive escuro em meu corpo o apertado aroma que ascender da terra. . Te amo sem saber como, nem quando, nem onde, te amo diretamente sem problemas nem orgulho: assim te amo porque não sei amar de outra maneira, . Se não assim deste modo em que não sou nem és tão perto que a tua mão sobre meu peito é minha tão perto que se fecham teus olhos com meu sonho. Pablo Neruda
Versos Íntimos
Vês! Ninguém assistiu ao formidável Enterro de tua última quimera. Somente a Ingratidão - esta pantera - Foi tua companheira inseparável!
Acostuma-te à lama que te espera! O Homem, que, nesta terra miserável, Mora, entre feras, sente inevitável Necessidade de também ser fera.
Toma um fósforo. Acende teu cigarro! O beijo, amigo, é a véspera do escarro, A mão que afaga é a mesma que apedreja.
Se a alguém causa inda pena a tua chaga, Apedreja essa mão vil que te afaga, Escarra nessa boca que te beija! Ausgusto dos Anjos
O teu riso
Tira-me o pão, se quiseres, tira-me o ar, mas não me tires o teu riso. Não me tires a rosa, a lança que desfolhas, a água que de súbito brota da tua alegria, a repentina onda de prata que em ti nasce. A minha luta é dura e regresso com os olhos cansados às vezes por ver que a terra não muda, mas ao entrar teu riso sobe ao céu a procurar-me e abre-me todas as portas da vida. Meu amor, nos momentos mais escuros solta o teu riso e se de súbito vires que o meu sangue mancha as pedras da rua, ri, porque o teu riso será para as minhas mãos como uma espada fresca. À beira do mar, no outono, teu riso deve erguer sua cascata de espuma, e na primavera , amor, quero teu riso como a flor que esperava, a flor azul, a rosa da minha pátria sonora. Ri-te da noite, do dia, da lua, ri-te das ruas tortas da ilha, ri-te deste grosseiro rapaz que te ama, mas quando abro os olhos e os fecho, quando meus passos vão, quando voltam meus passos, nega-me o pão, o ar, a luz, a primavera, mas nunca o teu riso, porque então morreria.
Por Pablo Neruda
Concluo, sem medo de ser contestado, que Augusto dos Anjos, apesar da cronologia não tão distante, é, indubitavelmente, um Neruda às avessas.
Violência social: O universo macabro do tráfico de drogas Vitimados pelo combate contra algo sem controle. Por Antônio Siqueira* Do Rio de Janeiro-RJ Para Via Fanzine
A sociedade comum dá sinais anacrônicos de conformismo e acomodação frente a um cenário sinistro que há décadas se descortina nas grandes cidades e começa a contaminar os interiores, não só no Brasil, como no mundo conhecido. Enquanto olhamos todos para um horizonte macabro, não vemos as dimensões do nosso próprio sofrimento. Instituições sociais e os meios de comunicação mostram a infernal realidade das favelas, dominadas pelo medo, pelas neuroses, pelas enfermidades, sem ensino e submetidas ao mando dos criminosos e ao pavor da polícia. Ali só há duas formas de sobreviver: obedecer à autoridade do Estado Paralelo ou dele participar como soldado ou burocrata do tráfico. Os moradores foram despojados de sua cidadania. São apátridas do território nacional.
Qualquer pessoa pode concluir que o uso de narcóticos se exacerba, porque é maior a alienação nas sociedades contemporâneas. A experiência demonstra que a repressão não resolve o problema, que é de outra natureza. Os ingleses, em nome da liberdade de mercado, moveram uma guerra contra a China, a fim de disseminar o consumo do ópio, e, buscando o lucro, transformaram a droga em commodity, como outra qualquer. O tráfico de cocaína serviu para que os Estados Unidos financiassem os contra-revolucionários da Nicarágua, conforme o grande escândalo conhecido como Irangate. A recente globalização da economia mundial – somada às frustrações – intensificou o tráfico da cocaína, da heroína, do crack e da maconha.
Combate-se o uso de narcóticos que podem conduzir à loucura e à morte por overdose. Muito mais pessoas, no entanto, morrem nesse combate de um lado ou de outro nas fronteiras invisíveis que demarcam todas as ruas, mas, principalmente, pelos becos das favelas. O que mais arranha os nervos é o numero de crianças que morrem nessas batalhas – e não só pelas balas perdidas. Morrem pouco a pouco. Perdem pedaços de suas vidas, como se perdessem dedos, mãos ou braços. As escolas não funcionam como deviam e em certas favelas, alunos morrem de disenteria, de doenças respiratórias, de infecções vulgares - em índices que se comparam às mais atrasadas aldeias africanas. No Morro do Alemão foram perdidos cinco meses de aulas durante a invasão da polícia. O maior prejuízo é a neurose de guerra que acomete os adultos e, principalmente, todas as crianças, em maior ou menor grau.
Há anos se discute a legalização do consumo de drogas. São os grandes aproveitadores desse negocio internacional que se opõem a isso. Fora os bem intencionados que não conhecem a dramática situação do confronto civil. Se amanhã, o comercio de narcóticos for legalizado, o Estado poderá controlar os drogados. Pouco a pouco, será possível reduzir a dependência e cortar as pernas do crime organizado. O combate às drogas promove muito mais loucura, mais miséria e mais mortes do que o próprio consumo dessas substâncias.
- Imagem: Arquivo do autor. - Produção: Pepe Chaves. © Copyright 2004-2008 Pepe Arte Viva Ltda.
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Choro: Uma mistura bem aventurada de uma série de estilos musicais
Por Antônio Siqueira* Do Rio de Janeiro-RJ Para Via Fanzine
Fosse necessário escolher uma única palavra para definir a emoção transmitida pelo Choro, à opção seria saudade, termo da língua portuguesa cujo sentimento, embora vivenciado pelas pessoas do mundo inteiro é difícil de ser compreendido por estrangeiros: denota um sentimento ambíguo, de natureza, pela ausência de alguém, de algum lugar, objeto ou situação, ou de alegria por lembranças felizes ou pelo reencontro. Assim é o Choro, musica predominantemente instrumental tocada em geral por virtuoses, pessoas extremamente talentosas e habilitadas, nem sempre com formação acadêmica. Executada em clima de “desafio”, interpretes disputam entre si quem toca melhor, mais rápido e mais bonito; ora transmite um lamento (especialmente quando letrada), ora se desenvolve num ritmo bastante rápido, alegre e contagiante, que remete a um tempo de ingenuidade, ironia e lirismo, características da sociedade das primeiras décadas do século XX.
Basta observar o título das canções para se compreender o espírito daquela época, que persiste até hoje entre os que se dedicam a essas composições. Às vezes bucólico: “Flor Formosa”, “Tico Tico no Fubá”, “Urubu Malandro”. Noutras, romântico: “Carinhoso”, “Naquele Tempo”. Inocente: “André de Sapato Novo”, “Um a Zero”. Ou nacionalista “Brasileirinho”, esse (contava o meu saudoso avô) foi criado pelo mestre do cavaquinho Waldir Azevedo e um programa de rádio. E só conseguiu ser recuperada por que o tal programa foi gravado e o próprio autor conseguiu tirar a musica de ouvido a partir dessa única gravação.
A literatura sobre a origem do Choro considera que o gênero nasce do encontro entre os estilos musicais europeus, notadamente a polca, com um modo tipicamente carioca de interpretação. Algo que Pixinguinha definiu como “um negócio sacudido, gostoso”.Estudiosos mais conhecidos, como José Ramos Tinhorão, dizem que essa perspectiva é utilizada como base inicial para qualquer estudo sobre o tema e partilha desta mesma visão, principalmente no concerne à importância da polca no processo.
O Choro nasce no século XIX, do encontro da polca com a genialidade com que músicos como Ernesto Nazareth, Joaquim Antonio da Silva Callado Jr, Viriato Figueira da Silva, Chiquinha Gonzaga, Benedito Lacerda, Patápio Silva, Pixinguinha, Waldir Azevedo e tantos outros chorões anônimos. No entanto, Choro ganha forma de fato com Pixinguinha que, além de consolidar sua estrutura musical, eleva a arte do improviso a um novo patamar na musica instrumental brasileira.
Não é mera coincidência que o repertorio pixinguinhano ainda hoje continue sendo uma das principais fontes para as novas gerações “brincarem” com seus instrumentos indubitavelmente, até Tom Jobim era louco pela obra de Pixinguinha.
Na época havia um caldo de cultura formada pela polca, o xote, o maxixe, o tango, o samba e o lundu que entrou em ebulição quando o povo, excluído dos salões onde aconteciam os saraus, tertúlias e concertos, adotou os instrumentos de corda (violão, cavaquinho e bandolim), de sopro (flauta, flautim e clarinete) e de percussão (pandeiro e ganzá), mais fáceis de carregar do que um piano. O resultado foi o nascimento do Choro no Rio de Janeiro que, considerado um instrumento de resistência da musica popular brasileira, nos cem anos seguintes, espalhou-se pelo país.
Na verdade a decadência ocorreu em relação ao mercado de trabalho para os chorões. Basta pensar que Dino Sete Cordas pendurou o violão para tocar guitarra em bailes. Como competir com Roberto Carlos e a Jovem Guarda? Como competir com o samba e o rock em suas fases áureas? A indústria cultural é implacável e só se interessa no produto que dê lucro e, obviamente, tenha demanda. Assim o Choro, ao ser paulatinamente substituído por outros estilos musicais de maior aceitação na mídia e, por conseguinte, de maior lucratividade, ficou restrito aos seus cultuadores e amantes ardorosos. Não obstante, de modo algum, ficou estagnado ou morto, como sugere a teoria de renascimento do Choro, tão veiculada pela “Mãe Mídia” de um modo geral.
Voltando às origens e às primeiras linhas destes textos, o preconceito atravancou não a evolução e a sofisticação do ritmo, e sim o processo de popularização. Na época em que o Choro foi criado, tocava-se muito maxixe. Era uma dança considerada imoral, tanto que no tempo do truculento e conservador marechal Hermes da Fonseca era proibido dançá-la. Até que um dia, a Dama de Tefé sentou-se no piano e pediram para que ela toca-se maxixe. Ela tocou e o velho marechal teve de aceitar e fica quieto. A proibição era tanta que Ernesto Nazareth colocava nome de tango em várias de suas composições. Mas era maxixe puro. Daí para o Choro foi um salto.
Na verdade, não existe um renascimento do Choro, pelo simples fato de que o Choro nunca morreu. Essa percepção estaria intrinsecamente relacionada à permanência do gênero na indústria cultural e desconsidera a dinâmica solidez da tradição chorística. Leitura semelhante foi aplicada ao Blues que, supostamente, “renasceu” nos anos de 1960 com o boom do Brithish Blues e, mais recentemente, pelas mãos do guitarrista texano Ray Vaughan. O Blues, ao contrario do Choro, conseguiu um maior alcance internacional. Mas o Choro correu mundo também: Japão e França são alguns dos países onde existem clubes do choro e, assim como a MPB de maneira geral, é apreciada e respeitada em todo planeta, o Choro também é. Na historia recente, músicos como Luperce Miranda, Joel Nascimento, Henrique Cases e Hamilton de Holanda são alguns dos nomes relacionados ao Choro que empolgam platéias no mundo inteiro com seus instrumentos.
Enganam-se os que pensam que essa escola está com seus dias contados por fechar-se em si mesma. Tradicional ou moderno, o Choro continua sendo uma tradição dialógica que incorpora facilmente outras linguagens musicais ao seu universo. Se no principio era a polca, a valsa, o schottsch, hoje o pop, o rock e o tango fazem parte deste universo também. Para todas as gerações. Nem mesmo o compositor erudito Heitor Villa-Lobos (1887 – 1959) deixou de contribuir com o Choro. Entre 1920 e 1929, o maestro se dedicou a escrever uma serie de choros que ia crescendo em complexidade instrumental. O “Choro n° 1” para violão solo enquanto o “n° 13” demanda duas orquestras e uma sinfônica. Uma fantástica epopéia musical genuinamente brasileira.
Personagens Eternos
Joaquim Antonio da Silva Callado Jr. (1848 – 1880)
Musico compositor e flautista, nascido no Rio de Janeiro, apontado como um dos criadores do Choro. No regional conhecido como “O Choro de Callado”, fazia solo de flauta acompanhado por cavaquinho. Hábeis no improviso criaram novos modos de tocar lundus, valsas e polcas.
Chiquinha Gonzaga (1847-1935)
Francisca Edwiges Neves Gonzaga, natural do Rio de Janeiro, foi maestrina, pianista e a primeira compositora da Musica Popular Brasileira. Forçada pelo pai a se casar, somente iniciou a carreira musical quando se separou. Estreou em 1877 com a polca “Atraente”, publicada pela editora do amigo Callado. Lutou pela causa abolicionista republicana.
Ernesto Nazareth (1863-1934)
Nascido no Rio de Janeiro aprendeu a tocar piano com a mãe, tendo escrito a sua primeira polca (Você bem sabe) aos 14 anos. Musico de formação erudita, teve seu trabalho influenciado pelas rodas de chorões, tirando dali a originalidade rítmica que marcou sua interpretação e se refletiu em suas composições.
Pixinguinha (1897-1973)
Alfredo da Rocha Viana Jr já tocava cavaquinho aos 12 anos. Flautista, maestro, compositor e arranjador, criaram as bases do Chorinho misturando as musicas de Chiquinha Gonzaga e Ernesto Nazareth com ritmos africanos, europeus e musica negra americana. Arranjou os principais sucessos da época de ouro da MPB.
Godofredo Guedes (1908-1983)
Nascido em 15 de agosto de 1908 na cidade baiana Riacho de Santana, Godofredo Fernandes Guedes já aos dez anos de idade percebia tendências artísticas em sua personalidade desenhando paisagens. Com 12 anos já tocava cavaquinho e já havia fabricado seu primeiro violão. Godofredo não compunha apenas Choros, porém seu filho, o talentosíssimo cantor e compositor mineiro, Beto Guedes, registrou os seus mais belos trabalhos (em quase sua totalidade, chorinhos de primeira linha) em seus seis primeiros álbuns. Destaque para a belíssima "Cantar" e "Belo Horizonte", verdadeiras obras-primas do gênero.
Luperce Miranda (1904/1977)
Um dos grandes nomes do Choro, Luperce Bezerra Pessoa de Miranda, instrumentista e compositor, nasceu no bairro dos Afogados em Recife, PE.Luperce, que desde os 8 anos tocava bandolim, aos 15 compôs seu primeiro frevo e no ano seguinte, tocando piano, organizou a pequena orquestra, a Jazz Leão do Norte. Participou ainda do bloco carnavalesco "Apois fum", de Felinto de Morais. Em 1926 ingressou no conjunto Turunas da Mauricéia (fato desmentido por Almirante). Sem ele, pois não viera ao Rio de Janeiro nesta época, Os Turunas gravam as suas composições: Belezas do sertão, O pequeno tururu e a embolada Pinião (Almirante também nega sua participação na parceria). Ainda em Recife, Luperce, com o codinome Sapequinha, fez parte do conjunto Voz do Sertão cujo "crooner" era o fantástico cantador de emboladas Minona Carneiro. Tocava inúmeros instrumentos: piano, guitarra portuguesa, cavaquinho (de 4 e 5 cordas), viola sertaneja, violão tenor, mas foi no bandolim que foi reconhecidamente um virtuose.Tocou em várias rádios do Rio e, em 1946, retorna ao Recife onde permanece até 1955.De volta ao Rio, fundou a Academia de Música Luperce Miranda e foi o primeiro a receber o título de Bacharel da MPB, instituído pelo MIS em 1970 no Rio de Janeiro.
- Imagem: Arquivo do autor. - Produção: Pepe Chaves. © Copyright 2004-2008 Pepe Arte Viva Ltda.
* * * Arte: Eu serei você amanhã O turbilhão de influências que renova a vida e a arte.
Por Antônio Siqueira* Do Rio de Janeiro-RJ Para Via Fanzine
Todo artista, por mais talentoso e genial que venha ser, sofre algum tipo de influência na sua trajetória para um eminente sucesso. Nas artes cênicas, o teatro brasileiro, por excelência, nos apresenta diversos atores de extrema capacidade e postura de palco que não titubeiam ao exaltar suas referências na arte de representar. Fernanda Montenegro, Paulo Autram e Cacilda Beker, são os principais ícones de duas gerações bem sucedidas. No cinema não é diferente, pois, volta e meia, surgem novos candidatos a Antonionis anti-heróicos, Fredericos Fellinis neoliberais Hitchcocks que não causam medo ou suspense, Spielbergs sem ensandecidos, Amaldovares multicoloridos, enfim, uma fauna de usurpadores vampirescos e chatos. No Brasil, pelo menos, os aspirantes a Glauber Rocha desistiram do Cinema Novo ou por que não, o compreenderam, ou pela falta de espaço no mercado, o que é um alívio, pois Glauber foi único, apesar de, por vezes, ser tão surrealista a ponto de não dar a mínima chance aos estudiosos de sua metafórica obra decifrar a sua verdade oculta. É humanamente impossível imitar o que não se entende.
No universo da música, esse fenômeno é como uma praga. Quase todos os artistas populares do nosso tempo têm uma verve beatlemaníaca. Nada foi tão “divisor de águas” quanto o quarteto inglês e as circunstâncias daquela época do século 20, o pós-guerra e outras irremediáveis mudanças de comportamento que aconteciam naturalmente no coração do homem moderno. Tanto que, quem sepultou os Beatles não foram seus eventuais filhotes e sim o novo. O Rock’n Roll se renovara no final dos anos de 1960 com os maiores artistas do gênero que já surgiram até hoje e, o mais impressionante, com trabalhos originais: Hendrix e Joplin, grupos como Led Zeppelin, Gênesis e Yes, ajudaram, involuntariamente é claro, sepultar os Beatles - não a beatlemania, pois eles são eternos e deixaram apóstolos incansáveis para reescreverem a história do rock e da musica pop.
'A MPB moderna, atualmente, tornou-se um grande conglomerado de clones inaudíveis'
O mundo fervia com suas transições e a música popular brasileira também se transmutava gradualmente. A Bossa-Nova já havia surgido, levando o cancioneiro popular brasileiro aos quatro cantos do planeta, quando os Tropicalistas com sua Geléia Geral, tentavam abalar as estruturas do regime ditatorial dos generais. Pouco depois surgiria o Clube da Esquina de Milton Nascimento, Lô Borges e um “trem mineiro” de músicos geniais que, revolucionava a maneira de se fazer musica por aqui; o rock nacional, finalmente, tornou-se um adolescente simpático. O samba, princípio de quase tudo tentava reciclar o que jamais necessitara de reciclagem e deu à luz - ou às trevas - a seus subgêneros mais lodosos como o pagode ou sambanojo, como bem escreveu Fernando Toledo em uma de suas explosões urbe-filosófica.
Até o parágrafo anterior, a criatividade era clarividente, mesmo que com influências visíveis de compositores e intérpretes ainda que contemporâneos. Podia-se notar que, na obra de Ivan Lins, havia uma visitação constante a Tom Jobim e Jackson do Pandeiro, que Caetano Veloso e João Gilberto eram, às vezes, quase a mesma pessoa; que havia muito de Lô Borges, Beto Guedes e Clube da Esquina no trabalho de Guilherme Arantes que, recentemente, até confessou usar as harmonias dos mineiros para criar as suas; que Flávio Venturini, apesar de ser um dos mais talentosos compositores da música contemporânea, pilota os seus teclados com influências fortes de Keith Emerson, o lendário tecladista do grupo inglês Emerson, Lake & Palmer. Os arranjos com participação de Venturini em suas respectivas bandas, O Terço e 14 Bis - na fase inicial -, são belas revisitações que, no 14 Bis, geraram verdadeiras obras-primas, com a parceria do mesmo Venturini com Vermelho, cuja formação sofisticadamente clássica é imprescindível ao grupo até hoje.
A MPB moderna, atualmente, tornou-se um grande conglomerado de clones inaudíveis. Seria muito tortuoso enumerar cada morto-vivo nesse teatro de horrores, produzido e dirigido pela mídia. Gente da monta de Fausto Silva, Gugu Liberato e Raul Gil, deveria ser prioridade um numa eventual Revolução Cultural. Só que um artista em especial, chama a atenção nessa rapsódia de ignomínias: Jorge Versílo. Certa vez, há pouco mais de dez anos, fui a um famoso bar carioca, o Hospício do Chopp em Realengo, na zona oeste do Rio. Versílo tocava em casas noturnas cariocas e, por um acaso, tocava neste mesmo lugar citado. Percebi que o rapaz já interpretara Djavan pela décima vez naquela noite e com uma destreza incrível, fecha-se os olhos, veria o alagoano. Saí de lá bestificado com a Djavan Cover Session apresentada pelo jovem carioca com cara e trejeitos de Latin Lover norte-americano. O que me intrigou por demais, foi ver o mesmo Jorge Versílo se lançar no mercado, apadrinhado pelo mesmo Djavan, surgir com força total no mercado fonográfico nacional. Quando o ouvi numa FM da cidade, pensei que fosse ele, o Djavan, mas não era. Pensei: “nada mais se cria, tudo se copia”... (... eu sou você amanhã...), como disse um maluco que era velho e guerreiro. Foi quando percebi o quanto é insólita a nossa cultura popular.
*Antonio Siqueira é pesquisador musical, cronista e correspondente de Via Fanzine no Rio de Janeiro/RJ.
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Música: Arte de primeira grandeza na criação do humano (Parte I) A tradição musical se mistura com os primórdios da humanidade.
Por Antônio Siqueira* Do Rio de Janeiro-RJ Para Via Fanzine Flauta de osso
A música sempre foi essencial às sociedades humanas, talvez nascida como ferramenta de agregação em grupos que começavam a se tornar extensos, possibilitando troca mais direta entre seus membros, a expressão musical tornou-se difundida e universal. Tão amplamente, que não se tem conhecimento de sociedade ou civilização que dispense uma forma ou outra de musicalidade.
O vínculo com este meio de expressão começa, pelo menos, tão cedo quanto ao nascer. Cientistas especulam que a linguagem usada pelos adultos, a fala materna do “tatibitate” seja um prelúdio musical, ao qual respondem crianças de todo o mundo. A atração que a musica exerce sobre nos é tão poderosa que nossas experiências com essa forma de arte interferem na formação do cérebro humano.
Matematicamente infinita ciência mais eu exata das sete artes, sedutora, tribal, aglutinadora de povos e raças, reinventada a cada minuto e com uma diversidade impressionante de estilos e abordagens, a música nos cerca e não gostaríamos que fosse diferente. O vibrante crescente de uma orquestra pode encher os olhos de lágrimas ou provocar arrepios na espinha. A musica de fundo adiciona emoção aos filmes e, por vezes, ajuda a torná-los verdadeiros épicos. As “ondas” do bom e velho rádio nos remetem às lembranças guardadas no mais íntimo de cada um de nós. A torcida vibra com o hino de seu time. Os pais cantam suaves cantigas para acalmar seus bebes.
Esse apego tem raízes profundas: fazemos musica desde o alvorecer da cultura. Mais de trinta mil anos atrás, os primeiros humanos já tocavam flauta de osso e elementos percursivos. Todas as sociedades tinham ou têm algum tipo de musica. Na verdade, nosso gosto parece ser inato. Bebes de apenas semanas de vida, já se voltam na direção de sons harmoniosos e agradáveis e tendem a afastar-se dos dissonantes. E quando o desfecho de uma sinfonia nos provoca aquele friozinho gostoso, os centros de prazer ativados no cérebro são os mesmos que estimulados quando comemos chocolate ou mantemos relações sexuais.
Eis aí um intrigante mistério biológico: por que a musica, universalmente amada, singularmente poderosa com sua capacidade de tanger as cordas da emoção é tão difundida e importante para nós? Será que seu aparecimento incrementou de alguma forma a sobrevivência humana, por exemplo, auxiliando o namoro? O desenvolvimento de culturas milenares, o canto de trabalho, promovendo assim uma grande coesão social em grupos que haviam ficado grandes demais? Seria musica um “manjar auditivo” _um feliz acidente da evolução que por acaso excita a fantasia humana?
Na Grécia Antiga, a música em forma de arte civilizacional teria uma natural expansão no desenvolvimento cultural dos povos ocidentais. Para o grego a arte era um prazer, uma paixão. Já para os romanos era um instrumento de administração, de domínio, “o selo impresso sobre a nação conquistada”. A Idade Média ou Idade Medieval foi um período intermédio numa divisão esquemática da História da Europa em quatro "eras", a Idade Antiga, a Idade Média, a Idade Moderna e a Idade Contemporânea. Por razões econômicas, culturais e sociais, a Europa esqueceu o mundo medieval e projetou-se rumo ao nascente da era moderna. O crescimento econômico que havia começado no século XIII continuava, apesar das desgraças. Por outro lado, o desenvolvimento dos estudos seculares, principalmente o humanismo clássico, a ciência e a tecnologia constituiu uma força importante que floresceu no romantismo europeu. Um dos maiores benefícios destes fatores foi no campo das artes e a mãe musica ascendeu numa explosão criativa pouquíssima vezes vista. O auge da criação e evolução da musica, como conhecemos, o Renascimento.
*Antonio Siqueira é pesquisador musical, cronista e correspondente de Via Fanzine no Rio de Janeiro/RJ.
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Artes Plásticas: Genialidade e Tragédia Nos meses finais de 1888, dois gênios da pintura, ainda que desconhecidos em seu tempo, encontraram-se em Arles, no sul da França. Por Antônio Siqueira* Do Rio de Janeiro-RJ Para Via Fanzine
Caffe Terrace, obra de Van Gogh Vicent Van Gogh e Paul Gauguin eram diferentes em tudo, do temperamento ao físico, só afinavam na idéia de que era preciso ir atrás do sol para que o grande astro lhes ensinasse os caminhos da pintura moderna. Ainda que a estadia deles juntos naquela pequena cidade não tenha chegado a ultrapassar dois meses, permeada por desavenças de toda ordem, ela foi mutuamente enriquecedora. Gogh aspirou um ar estético de Gauguin e este, ao mudar-se depois para o Taiti, levou a cabo a idéia de Gogh de encontrar algum lugar onde o sol imperasse sempre. Por terem sido rejeitados numa grande exposição de pintura que anualmente era realizada em Paris, um grupo um tanto irreverente de artistas decidiu-se por realizar uma mostra paralela, produzindo com ela um grande escândalo: o salão dos impressionistas, como o evento foi posteriormente batizado. Ele deu-se no salão do fotógrafo Félix Nadar, que abriu suas portas no dia 15 de abril de 1874, expondo as telas de Auguste Renoir, Edgar Degas, Alfred Sisley, Berthe Morisot, Claude Monet, e outros tantos que não conseguiram se perpetuar. De certo modo era a reedição do Salon des Refusés, que ocorrera em 1863 em razão do escândalo provocado pela tela Déjeuner sur l'herbe de Manet (1832-1883), classificada pela imperatriz Maria Eugênia como "impudica", sem que entretanto provocasse a celeuma e a verdadeira revolução que a exposição de 1874 causou. O salão de 1874 também foi filho de um movimento anterior que buscava inspiração no ar livre, liderado por Eugène Delacroix, Eugène Fromentin e Théodore Chassériau, todos eles mobilizados pela palavra de ordem "il faut sortir de l'atelier!", era preciso sair-se do atelier. A crítica os tachou de preguiçosos fabricantes de borrões para baixo e, como em tantos outras oportunidades, a palavra "impressionistas", como pejorativamente foram apelidados, tornou-se o lema da bandeira estética deles. Seja como for, a exposição de 1874 marcou o declínio da arte acadêmica e deu impulso a uma extraordinária desordem estética criativa da qual o pintor holandês Vicent van Gogh vai ser um dos maiores exponenciais. Provavelmente, Paul deu-se contra que a loucura de Vicent era um caso perdido. Na noite de Natal, andando pela rua, ele sentiu-se seguido. Ao virar-se para ver quem era deparou-se com Vicent, com um olhar desvairado, empunhando uma navalha. Ao ser reconhecido, desatou a correr. Paul, que já havia se mudado para um pequeno hotel, tratou de voltar para Paris. No dia seguinte, porém, ele foi avisado do desatino de Vicent. O seu amigo havia cortado parte da orelha e a enviado, enrolada num lenço, a uma das rameiras, vizinhas dele. A cama e o quarto de Vicent havia se transformado numa grande poça de sangue. Quem mantinha Vincent na sua intenção de ser pintor era o seu irmão mais moço Theo Van Gogh, um modesto, mas premonitório, negociante de artes em Paris, que nunca poupou um tostão sequer para ajudá-lo. Graças a intensa correspondência trocada entre eles, entre Vicente e Theo, felizmente preservada, sabe-se com detalhes da evolução da pintura de Van Gogh, bem como suas impressões gerais sobre a arte, a dele e dos outros. Pelas cartas percebe-se como Vicent era um extraordinário sensitivo, um meticuloso, captando tudo ao seu redor para transformar em arte, em maravilhas extraídas do pincel. Theo, por sua vez, jamais faltou com o irmão, sendo o único a lhe reconhecer a genialidade, apesar de Vicent não ter conseguido vender nada em vida. Ao ser chamado com urgência a Arles para socorrer o irmão mutilado, Theo, desolado, não encontrou outra solução senão interná-lo numa clínica de alienados em Saint-Rémy. Um ano e meio depois, em 1890, Vicent, num outro ataque, dos tantos que já tivera, disparou contra o seu estômago, matando-se aos 37 anos de idade. Theo, seu irmão, logo o seguiu, morreu em 1891, aos 33 anos. Ambos estão enterrados no mesmo local. *Antonio Siqueira é pesquisador musical, cronista e correspondente de Via Fanzine no Rio de Janeiro/RJ. - Imagens: art in the picture www.artinthepicture.com - Produção: Pepe Chaves. © Copyright 2004-2007 Pepe Arte Viva Ltda.
* * * A volta do lobo mau: Lobão em nova roupagem ‘Eu sou nada e é isso que me convém, eu sou o sub do mundo, o que será que me detém?’.
Por Antônio Siqueira* Do Rio de Janeiro-RJ Para Via Fanzine
Lobão grava seu acústico pela MTV.
O Acústico MTV do carioca Lobão é um dos melhores produzidos até hoje no planeta música. Contraditório ou não, o "velho lobo" acertou em cheio com seu primeiro Acústico MTV e afirmou, categoricamente, em várias ocasiões que a idéia desse projeto foi dele. Num telefonema à MTV, teria perguntado:"O que vocês têm de melhor aí?", Lobão queria uma coisa de grande impacto, no tamanho da importância de sua obra dentro do cenário pop nacional.
A Sony se manifestou e o seu "Acústico" saiu rápido do papel. Mesmo estando em uma disputa judicial com a gravadora, Lobão enxergou que era preciso separar as coisas. O DVD saiu e se tornou uma das grandes obras da série da MTV.
O cantor agora critica a "nova MPB" e artistas da música independente. "Quem fica imitando a Tropicália e a Bossa Nova, movimentos que já tinham suas falhas e não evolui, tem mais é que se f*" - vociferou, recentemente, o "Lobo Mau" no programa Sem Censura, da TVE. Sobre os artistas independentes, disse que alguns esperam tudo na mão e não correm atrás, "Nenhum artista tem a moral de falar um 'A' para mim. Todo mundo assinou o manifesto e caiu fora depois de tomar bronca de gente de gravadora. Lutei por isso o tempo todo. Posso não ter moral nenhuma, sou um ser amoral, mas tenho ética", afirmou.
O Lobão de sempre, mas um Lobão que tem tino para tratar de sua obra como poucos andam fazendo no Brasil. Aos 49 anos, com a mesma pegada de sempre, nos brindou com um cd-dvd dos mais bem produzidos ao vivo que já aconteceram. Alguns hits como "Vida Bandida" e "Vida Louca Vida" ficaram de fora, porém pérolas do Rock Brasil como "Canos Silênciosos", "Me Chama", "Essa Noite, Não (Marcha Ré em Paquetá)", "Corações Psicodélicos" tiveram tratamento luxuoso; "Abolimos todos os violões de nylon e apostamos em novos timbres e tecnologias. É um acústico que ninguém ouviu igual. Daqui a alguns anos, vão estudar esse disco". Salientou Lobão em entrevista recente.
Lobão trouxe o melhor material humano para a ficha técnica do seu DVD, incluindo os músicos Edu Bologna e Luce nos violões, Daniel no baixo, Roberto Pollo nos teclados, Pedro Garcia na bateria e Stephane San Juan, na percussão. Talvez seja um dos melhores trabalhos de João Luiz Woerdenbag Filho, contraditório ou não, ele ajudou a escrever com muita competência a história da música pop brasileira.
Como no poema com aroma urbano aos moldes do compositor de "Vou te Levar": "Pensar em tudo que se passou, que se pôde sonhar e não realizou. A vida tentando escapar, mas não por agora. Ao mesmo tempo, tanta coisa se amou, se refez, se perdeu, se conquistou. Retratos estampados do nosso amor, em preto e branco, pregados na parede, revelando pra sempre a gente, nosso orgulho um do outro, olhando pra lente como quem dissesse ‘não queremos mais nada nesse mundo’ e que me lembrasse a cada instante que valeu a pena cada lance e valerá, tenha certeza, pra toda a vida...".
Sim, Lobão... para toda a vida!
Faixas do Lobão Acústico, cd-dvd
01 - El Desdichado 02 - Essa Noite, Não (Marcha Ré em Paquetá) 03 - Décadance Avec Élégance 04 - Bambina 05 - Vou Te Levar 06 - Quente 07 - Por Tudo que for 08 - Noite e Dia 09 - Me Chama 10 - Você e a Noite Escura 11 - A Queda 12 - A Vida é Doce 13 - Pra Onde Você Vai 14 - O Mistério 15 - Canos Silenciosos 16 - Blá Blá Blá... Eu Te Amo (Rádio Blá) 17 - Corações Psicodélicos 18 - A Gente Vai Se Amar
Antonio Siqueira é pesquisador musical, cronista e representante de Via Fanzine no Rio de Janeiro/RJ. - Fotos: http://lobao.uol.com.br - Produção: Pepe Chaves. © Copyright 2004-2007 Pepe Arte Viva Ltda.
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