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Entrevista exclusiva com
Márcio
Rodrigues Mendes
Físico,
professor e astrônomo amador.
Por Pepe Chaves*
Para
ASTROVIA
Atualização em 20/07/2019
Márcio Rodrigues Mendes e o filho Daniel.
Márcio Rodrigues Mendes é formado em
Física, professor em Dois Córregos-SP, membro da REA (Rede de
Astronômica Observacional) e se trata de um dos grandes difusores da
Astronomia e da Astronáutica no Brasil, seja através das feiras de
Ciências que promove, como também dos muitos artigos e reportagens que
escreveu sobre estes assuntos. Faz alguns anos, está construindo em
sua residência, um moderno observatório espacial. Foi através de seus
equipamentos, sobretudo, uma fotografia celestial feita por ele, que participou do
descobrimento da
V382
Vel, a
Nova Velurum (reconhecida pela IAU como a segunda Nova de maior brilho descoberta no século
passado), ao lado de outros brilhantes astrônomos amadores brasileiros.
Desde a infância Mendes é colecionador (e já teve uma loja) de maquetes de
foguetes, cápsulas e espaçonaves terrestres. Por algumas oportunidades
visitou o Centro Espacial Kennedy, na base militar dos Estados
Unidos, em Cabo Canaveral, Flórida. Márcio Mendes, é colaborador de Via
Fanzine desde 2005, onde tem sua página exclusiva:
www.viafanzine.jor.br/mmendes.htm. Nascido em 1958, Mendes
acompanha todo o processo evolutivo que culminou nas viagens lunares -
como também os atuais projetos que pretendem retornar com o homem ao
ambiente lunar, como o
Constellation, da Nasa. Desde sua infância já era um
“apaixonado” pelo espaço, em especial, pelas viagens lunares e as
histórias de
Arthur
C. Clarke. Ele tinha apenas 11 anos quando, faz quatro décadas, repleto de
adrenalina, assistiu em 1969, pela tevê, “via satélite”, a chegada do
homem à Lua. De lá para cá, ele acompanhou de várias maneiras, todo o
desenrolar das viagens tripuladas à Lua, até chegarmos aos dias atuais,
quando a
sonda LRO, da Nasa, em órbita lunar, nos envia imagens de alta
definição que mostram
os vestígios deixados pelas missões Apollo na superfície da Lua. Márcio
Mendes é autor da série "Do
Vale do Antílope ao solo lunar", sobre a conquista lunar, publicada em capítulos pelo portal
Astrovia.
Via
Fanzine: Professor Márcio, como se iniciou seu fascínio pela Astronomia,
Astronáutica e, em especial, pelas viagens lunares?
Márcio
Rodrigues Mendes:
Algumas vezes já parei para pensar nisto e simplesmente não consigo
definir um período ou um fato que tenha me chamado a atenção para
assuntos do tipo. Desde tenra infância, o céu noturno me fascinou. Meu
pai nunca soube muito sobre estrelas e planetas, mas recordo-me
vividamente de uma noite, em uma propriedade rural, ele me mostrou o
Cruzeiro do Sul. Aquilo me encantou. Mais tarde, mesmo com as limitações
da tevê na época, lembro-me de ter visto alguns astronautas se
acomodarem em cápsulas muito apertadas, em seus trajes prateados. Muito
provavelmente era o começo do Programa Gemini, da Nasa, anterior ao
Apollo e que levava somente dois astronautas. Fiquei fascinado ao saber
de meus pais que aqueles homens estavam tentando chegar na Lua. Ao longo
de toda a minha infância não posso deixar de considerar também a
influência dos seriados da televisão e os poucos filmes no cinema. Nos
meus primeiros anos na escola, não fui um aluno exemplar, contudo, minha
mãe, sendo professora do Ensino Fundamental, argumentava que os
astronautas eram pessoas que se dedicavam muito aos estudos. Foi ouvir
aquilo dela e a minha vida escolar mudou. Passei a me dedicar muito e
tomar gosto pelo estudo, em especial, as Ciências exatas.
VF: E
exatamente hoje, 20 de julho de 2009
faz 40 anos que o homem chegava à Lua pela primeira das seis visitas
que faria à superfície do satélite terrestre. Qual sua idade naquele 20
de julho de 1969 e quais as lembranças que guarda daqueles dias que
ficariam marcados por toda a história humana?
MRM:
Acredite, foram dias magníficos. Acompanhei tudo da melhor maneira
possível. Comprava todas as revistas e jornais sobre as viagens
espaciais. Havia muita expectativa quanto ao objetivo em atingir à Lua.
Havia também muitas dúvidas se tudo fora, de fato, bem planejado. Quando
a missão Apollo 11 desceu na Lua, eu estava com exatos 11 anos,
completos no mês anterior. Lembro-me que no dia 20 de julho de 1969,
estava com um primo e meus tios em casa, e a tevê anunciava programas
especiais durante o dia. Era um preparativo para o grande acontecimento
daquela noite. Por estarmos com visitas, meus pais resolveram sair para
almoçar em um restaurante da cidade vizinha. Não podendo assistir os
documentários exibidos durante o dia, fiquei muito bravo. Em protesto,
praticamente não almocei e permaneci o dia todo de forma bastante
anti-social. Dias atrás combinei com minha esposa que iríamos almoçar
neste mesmo restaurante e fomos hoje
(18/Julho). Confesso que me senti estranho ao levar meu filho
(agora com sete anos) e contar-lhe os fatos de 40 anos atrás. Numa
enorme coincidência, bem ao lado de nossa mesa, havia um garotinho,
extremamente insatisfeito com alguma coisa. Minha esposa perguntou-me se
minha condição, 40 anos atrás era parecida com a do garoto, ao que
respondi, “não, era bem pior”, (risos). Mas a experiência em ter
vivenciado a descida do homem na Lua, naquela noite, tendo uma boa
consciência do que acontecia, superou tudo.
VF:
Como o senhor vê hoje, depois de quatro décadas, estas recentes imagens
disponibilizadas pela Nasa faz poucos dias, colhidas através da câmera
da
sonda LRO (em orbitar lunar) mostrando materiais deixados pelas
missões Apollo na superfície da Lua?
MRM:
Vejo como uma grande evolução na capacidade de executar a tarefa de
explorar nosso satélite natural. Evoluímos de um período onde a Lua
inteira era um “alvo” – pois, a princípio, muitas sondas simplesmente
erraram o alvo, passando longe dele - para uma situação onde podemos
buscar um detalhe de apenas alguns metros na (já) conhecida superfície
lunar. No início, contentávamos com algumas imagens borradas,
fotografias comuns, sem grande definição, obtidas pelas primeiras sondas
lunares. Com a
LRO temos imagens de alta definição, além da capacidade de elaborar
um mapa global em 3D, com uma boa idéia do potencial mineralógico de
determinadas regiões, bem como a capacidade de “cheirar” traços de água
nas proximidades dos pólos lunares. Contudo, a
LRO
tem como principal incumbência, proporcionar a escolha dos pontos de
interesse para futuras missões tripuladas ou não. Por fim, há um lado
saudosista envolvido ou mesmo entusiasta, ao poder (re)ver, de outros
ângulos, as primeiras sondas e artefatos das missões Apollo, lá deixados
pelos astronautas. Sem dúvida, houve um progresso considerável em nossa
capacidade de explorar o satélite natural da Terra.
Márcio Mendes e seu telescópio.
VF:
Recentemente uma pesquisa feita nos EUA mostrou que 6% da população
daquele país não acreditam nas viagens lunares. O senhor acredita que estas
novas imagens da sonda lunar da Nasa exibidas recentemente ao mundo podem mudar este conceito?
MRM:
Sinceramente, não acredito que mude muita coisa. Caso eu esteja errado
(em crer nas viagens lunares), posso adiantar que a surpresa será toda
minha, assim como foi descobrir ao longo do tempo pessoas com alguma
formação que também não acreditam. Fiquei pasmo em conhecer publicações
seriadas que se ocupavam do assunto, mostrando “provas” absurdas,
construídas com grande desinformação e até como uma predisposição, pelo
simples fato da “conquista” ter sido feita pelos EUA. Não creio que haja
argumento suficiente para satisfazer esses 6% de lá, bem como a qualquer
outra cota nos outros países. As fotos ora disponibilizadas, com certeza
serão tachadas de “manipuladas” e coisas assim. Há pessoas que conseguem
acreditar, sem problema, numa foto com um borrão ou com uma luz
qualquer, sem maiores referências, como sendo “provas concretas” de
artefatos de uma civilização fantástica e ultra-avançada que nos visita;
mas não conseguem acreditar que as fotos do solo lunar modificado pela
presença de artefatos humanos ali deixados que foram, de fato, levados
até lá. Para essas pessoas, mudar de opinião é dificílimo. O feito da
chegada do homem à Lua foi - de certa forma - um produto da Guerra Fria
e teve os maiores interessados em comprovar o chamado “hoax”,
países como a Rússia. Eles jamais contestaram e aceitaram o feito. Creio
que seria uma impossibilidade manter milhares de pessoas que trabalharam
diretamente na suposta “farsa”, caladas por tanto tempo. Enfim, creio
que não haverá mais tempo nem necessidade, nem sentido em trabalhar a
fim de convencer a alguns quanto ao feito, afinal, isso não mudará uma
realidade e as pessoas são livres para escolherem como querem ver o
mundo. Insistir em querer acreditar no fato como sendo hoax, só
depende da grande ingenuidade ou, antagonicamente, do fato de tratar-se
de pessoa extremamente bem informada. As pessoas devem fazer uma
auto-análise e ver em que caso se encaixa. Ainda há quem não acredite
que a Terra seja redonda, mas isso não evitou que ela continuasse
girando... (risos).
VF:
Segundo a Nasa, a
sonda LRO
representa a retomada das viagens lunares. Quais são os novos projetos
da Agência Espacial Americana para retornar com o homem à Lua?
MRM:
A promessa de colocar o homem na Lua foi um fato político, militar e na
ocasião haveria muito mais a ser respondido e melhorado para uma
continuidade do programa. Além disso, como já foi dito, é como se fosse
construído um transatlântico só para três pessoas usarem e, a cada
viagem, ele fosse afundado, para depois se construir uma nova embarcação
para os próximos passageiros. Nem a poderosa economia norte-americana
pode arcar com tamanhos custos. As viagens à Lua chegaram a durar quase
duas semanas e a autonomia de cada missão Apollo não era para muito mais
que isso. Não havia tecnologia para uma permanência de meses, nem
estavam claras as implicações no organismo humano, destas estadias
prolongadas em ambientes de baixa gravidade. Havia, na verdade, muitas
perguntas para serem respondidas, além da preocupação em se desenvolver
sistemas reutilizáveis. Uma vez encerrado o programa Apollo, os russos
passaram a investir pesado nos avanços para estadias prolongadas,
enquanto os norte-americanos investiram em sistemas reutilizáveis, como
os ônibus espaciais (shutles). E assim, ambos, juntamente com
outros países iniciaram uma era de cooperações que culminou na
construção da
Estação Espacial Internacional
(ISS).
Uma vez que os interesses políticos e militares tenham - como se imagina
- alcançados os seus objetivos, o futuro imediato da Astronáutica passou
a ter um caráter mais científico. Como por exemplo, o envio de sondas
não tripuladas aos confins do Sistema Solar e com a proposta de ocupação
permanente da Lua. Tal ocupação tem como objetivo a exploração de
recursos minerais, bem como a de dar apoio para que futuras missões
possam ir além da Lua. Para tanto, o
Projeto
Constellation,
da Nasa, que envolve o casamento de diversas novos equipamentos (alguns
que lembram muito
as missões Apollo), apresentará, de imediato um substituto para os ônibus
espaciais. Mais adiante, por volta de 2020, o
Constellation
será o novo meio para novas incursões tripuladas à Lua. O projeto já
está saindo do papel, com diversos segmentos em fase de testes, alguns
dos mais essenciais já estão ocorrendo ainda este ano, como projeção e os testes em
campo dos novos veículos lunares.
VF:
Temos visto também um crescente interesse de outros países, sobretudo,
os asiáticos, pela
exploração lunar. China,
Japão e até a
Índia já têm sondas em órbita da Lua. O que desperta o interesse
desses países para a exploração lunar?
MRM:
Uma viagem exploratória do nosso satélite natural não é um
empreendimento barato e a
sonda indiana, por exemplo, tem capacidades para exploração dos
potenciais mineralógicos lunares. Acredito que de forma, independente ou
na forma de cooperação, esses países já esboçam intenções de conhecer
melhor o ambiente para explorações “in loco”, num futuro próximo. Os feitos das
agências espaciais
japonesa e
indiana
(de enviarem e manter sondas em órbita lunar) mostram independência e
domínio de uma tecnologia espacial. Contudo, desde já, esboça-se alguma
cooperação entre esses países no esforço em explorar conjuntamente o
espaço e o nosso satélite natural. A Índia manteve alguma relação com a
Nasa nesta empreitada, assim como o Japão mantém atualmente,
compartilhando os ônibus espaciais para complementar seu módulo
Kibo, um moderno
laboratório anexado à ISS.
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Turma da "II Reunião de Astronomia Extragaláctica" realizada em
Córdoba, Argentina (1988), quando Mendes fazia mestrado no Instituto
Nacional de Pesquisas Especiais (INPE). Esta é a foto oficial que
consta no resumo de trabalhos apresentados na Academia Nacional de
Ciências de Córdoba.
1 - Márcio R. Mendes (Brasil) - INPE
2 - Carlos Rabaça (Brasil) - INPE
3 - Duília de Mello (Brasil) – INPE (hoje, na Nasa)
4 - Fernando Kokubun (Brasil) - INPE
5 - J. L. Sérsic (Argentina) - Observatório Astronômico Córdoba
6 - Sverre Aarseth (Inglaterra) - University of Cambridge
7 - Simon White (EUA) - Steward Observatory
8 - Jean Luc Nieto (França) - Observatório du Pic du Midi
9 - Massimo Capaccioli (Itália) - Observatório di Padova
10 - S.O. Kepler (Brasil) - Inst. de Física de Porto Alegre
11 - Márcio A. G. Maia (Brasil) – Observatório Nac. do Rio de
Janeiro
12 - Victor Blanco (Chile) - Cerro Tololo
13 - Jesus H. Calderon (Arg) – Observatório Astronômico de Córdoba
14 - M. de Fatima Schroder (Brasil) - Inst. de Física de Porto
Alegre
15 - Thaisa S. Bergmann (Brasil) - Inst. de Física de Porto Alegre
16 - Christopher Willmer (Brasil) – Observatório Nac. do Rio de
Janeiro |
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VF:
Neil Armstrong, Michael Collins e Edwin Aldrin, os primeiros
astronautas que chegaram à Lua ainda estão vivos e comemorando os 40
anos do grande feito. Qual a sua impressão sobre estes homens?
MRM:
Os três, por coincidência, tinham 38 anos quando voaram na Apollo 11 e
estão atualmente revivendo, aos 78 anos, sua maior aventura, com o
LRO
enviando essas recentes imagens da superfície lunar em alta definição. Tendo
cumprido seus trabalhos, um antes que o outro desligou-se do Programa
Espacial, mas ainda continuaram atuando em áreas correlatas. Trata-se de
pessoas íntegras que tiveram, sem dúvida, um treinamento intenso para
cumprir a tarefa, porém, nenhum para continuar uma vida normal, após terem
pisado em outro mundo. Armstrong enveredou-se por áreas de ensino
superior relacionadas às ciências espaciais. Collins também manteve-se
ligado à preservação das memórias desses feitos como diretor de Museu.
Aldrin, embora tenha enfrentado problemas de alcoolismo, conseguiu
superar e mantém alguma atividade no ramo de consultoria.
Particularmente, toda vez que vejo fotos deles, da época ou as atuais,
já com as
marcas dos tempos, sinto alguma satisfação em tê-los tido como “heróis”
de infância. Atualmente vejo-os como pessoas normais, com seus problemas
e com suas virtudes, mas com a diferença de terem tido a oportunidade de
fazer algo pela humanidade. Se eles fossem palestinos, russos ou de
qualquer outra nacionalidade, minha admiração seria a mesma, com
certeza.
VF: Em
recente entrevista Edwin Aldrin declarou que a Nasa deveria investir
na exploração de Marte e não da Lua. Como o senhor vê estas declarações?
MRM:
Há diversas idéias de como se chegar a Marte, que é um objetivo bem mais
difícil. Começando pela distância, o que irá acarretar em uma
permanência muito maior fora da Terra. Nesse caso, a Lua é vista por
alguns como um “trampolim” essencial para ir além ou também como fonte
de recursos (matéria-prima). Contudo, embora próximo, a Lua trata-se de
um ambiente hostil e perigoso. Não que seja diferente em Marte, mas
neste caso, as semelhanças deste com a Terra se acentuam. Tanto a
exploração como a permanência na Lua ou em Marte, gira em torno da
descoberta de água nesses mundos. Atualmente vejo estes esforços sendo
realizados tanto na Lua como em Marte. E os seus resultados deverão
definir as prioridades a serem traçadas.
VF: O
senhor já esteve por duas oportunidades visitando o
Centro Espacial Kennedy
em Cabo Canaveral, na Flórida, EUA. No local estão expostos diversos
equipamentos usados nas missões Apollo. O que mais lhe impressionou
vendo de perto aqueles objetos usados nas
viagens lunares?
MRM:
Praticamente tudo! É fascinante ver as dimensões, a abrangência da
infra-estrutura e o nível da tecnologia empregada. Não é fácil ter a
noção completa de todas as ramificações da Nasa. Contudo, o que vi
restrito ao Cabo Canaveral foi mais que suficiente para me convencer da
grandiosidade do empreendimento. Descrever os detalhes de cada item
visitado não é tarefa fácil, embora sinta enorme satisfação em fazê-lo.
Conhecer o Rocket Garden, o monstruoso VAB, as réplicas em tamanho
original dos atuais ônibus espaciais e seu tanque externo, os complexos
de lançamento, casamatas, os laboratórios onde se desenvolvem
componentes da ISS e toda
estrutura para visitantes; o gigantesco foguete Saturno V, o Módulo
Lunar, as inúmeras simulações... Foram, cada uma, preenchendo e
construindo uma idéia de tudo o que foi e representa hoje o Programa
Espacial dos EUA. Mas, emocionei-me muito diante da enorme lápide preta,
com alguns nomes dos astronautas que deram suas vidas para que
pudéssemos ter os benefícios de hoje, assim como a profundidade com que
conseguimos olhar para o Cosmo atualmente A tevê que assistimos,
os computadores que usamos, as roupas que vestimos, os medicamentos dos
quais dependemos e até utensílios de cozinha tiveram uma parcela de sua
evolução, graças a esse homens que tiveram a coragem de ir pela primeira
vez, sem conhecer ao certo onde estavam indo. Talvez, então, minha
admiração não esteja tanto em veículos e em construções espaciais, mas
na ousadia do ser humano, ali, tão bem representada.
O
professor Márcio Mendes, a esposa Doralice e o filho Daniel,
comemoram
os 40 anos da Apollo 11 com um bolo temático.
VF:
Quais são as perspectivas com relação às próximas viagens espaciais
tripuladas, para além da Estação Espacial Internacional?
MRM:
Assim como qualquer empreendimento, elas estão se tornando cada vez mais
seguras, cada vez mais práticas, viáveis e cada vez mais ao alcance de pessoas
comuns - embora isso ainda seja um tanto difícil atualmente. Aprendemos
a viver no espaço por longos períodos, aprendemos a nos orientar, temos
alguma consciência dos perigos lá fora e de como evitá-los. Creio que o
caminho esteja aberto. Doravante, ouviremos muito do
Projeto
Constellation
e acredito que em pouco tempo o mesmo será uma realidade tão certa e
comum como a dos atuais ônibus espaciais. Mais que isso, acredito
também que, de forma crescente, a cooperação entre nações seja acentuada
cada vez mais. Novas e inovadoras tecnologias serão usadas e divulgadas
em breve e, por fim, acredito que possamos também vislumbrar algum
benefício maior ao nosso planeta no sentido de suprir-lhe as reservas
esgotadas, assim como diversas melhorias no controle ambiental com a
expansão aos domínios mais imediatos, como a Lua e Marte. Sei que se
trata de uma visão um tanto otimista, mas é nela que quero acreditar e é
neste sentido que vejo as coisas evoluírem... Num compasso próprio.
VF: Qual a mensagem que o senhor nos deixa, nesta
data comemorativa dos 40 anos da viagem da Apollo 11?
MRM: Igualmente aos desbravadores Marco
Pólo, Colombo e tantos outros; temos agora os desbravadores da Era
Moderna. A Apollo 11 foi um divisor de águas entre nossa condição como
uma raça presa ao seu mundo de origem e outra, que poderá se tornar
livre para expandir-se. Gostaria muito de aproveitar a ocasião e ceder
meu espaço, nestas últimas linhas, para uma mensagem do cientista e
escritor que tanto admirei e já não está mais entre nós,
Arthur
C. Clarke. Confesso que não consigo imaginar mensagem
melhor que esta, referindo-se às futuras viagens espaciais: “Para um
ser humano, ‘moradia’ é o lugar onde nasceu e passou sua infância, seja
ela nas estepes da Sibéria, uma ilha de coral, o vale dos Alpes, o
cortiço do Brooklyn, um deserto marciano, uma cratera lunar ou uma arca
interestelar de milhas de comprimento. Mas para o Homem, moradia nunca
pode ser um simples país, um simples mundo, um simples Sistema Solar, um
simples agrupamento de estrelas. Enquanto resiste e sofre pacientemente
numa forma identificavelmente humana, a raça não pode ter nenhum lugar
duradouro e permanente a não ser o Universo com tal. Esta insatisfação
divina faz parte do nosso destino. É um dos maiores e, talvez, o maior
dom que herdamos do mar que se revolve tão impacientemente em redor do
mundo. Será um descontentamento de espírito que acompanhará os nossos
descendentes que rumam para miríades de términos inimagináveis de viagem
até quando o mar estiver aplacado eternamente e a Terra em si não passar
de uma lenda que se esfuma e se perde no meio das estrelas”.
* Pepe Chaves é editor do diário digital
Via Fanzine e da
ZINESFERA (Brasil).
- Fotos: Doralice Mendes/Daniel
Mendes/Arquivo M. Mendes/Arquivo VF.
- Esta entrevista foi feita em 2009, com atualização
e revisão em 20/07/2019.
- Links indicados:
Página
exclusiva do professor Márcio Rodrigues Mendes
Entre os
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- visita de Márcio Mendes ao Centro Espacial Kennedy.
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-
matéria de Márcio Mendes.
Arthur C.
Clarke - matéria de Márcio Mendes.
Sonda
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Do Vale do Antílope ao solo lunar - matéria especial de Márcio Mendes,
em capítulos.
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