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Inconfidência Mineira

 

Inspiração à liberdade:

Inconfidência Mineira e a história de Tiradentes

“Oh, que montanhas verdes. Oh, que vales verdes. Eu andei por todo o país e senti essa geração.

Um povo tão forte, que há muito resiste aos limites que procuram segurá-lo”.

Jon Anderson - "Limites" (Boundaries)

 

 Por Pepe Chaves*

De Belo Horizonte

Para Via Fanzine

20/04/2013

 

Tiradentes: muitos rostos e uma história única.

 

Riquezas transoceânicas

 

Descoberto por navegantes portugueses no ano de 1500, a Terra de Santa Cruz, depois chamada de Brasil, se transformou na maior colônia da Coroa daquele país europeu. Depois do descobrimento, aportaram nos litorais brasileiros, incontáveis gêneros de aventureiros, caçadores de riquezas e muitos homens a serviços da Coroa.

 

Durante séculos, a riqueza brasileira, sobretudo, no que se refere aos minerais preciosos, foi sendo levada para a Europa a título de tributo cobrado pelo reino de Portugal. As Bandeiras, movimentos que levaram os chamados Bandeirantes – exploradores de riquezas minerais – cada vez mais ao interior do país, abriam passo para a criações dos primeiros arraiais e, para tanto, dizimando índios e subtraindo ouro e brilhantes.

 

Com o passar dos tempos e após praticamente exaurida a extração dos minerais para os métodos da época, o país-continental dominado por portugueses, ainda tão desengonçado equilibrando-se sobre si, com seus negros escravos, índios, bandidos deportados de Portugal e aventureiros gerais, emanava sinais de emancipação.

 

Mas somente em finais do século 18, quando uma sociedade já abrasileirada sonhava em traçar o seu próprio destino, sobretudo, negando-se a pagar caros impostos aos detentores do poder, a ideia de independência começara a se esboçar verdadeiramente.

 

O sonho separatista

 

Em busca da liberdade e do condão do seu destino, o país efervescia a ideia separatista que somente muitos anos depois seria consolidada pelo grupo chamado de Inconfidentes. No ano de 1789, surgiu o movimento da Inconfidência Mineira, ou Conjuração Mineira, numa tentativa de revolta de natureza separatista abortada pela Coroa portuguesa, na então capitania de Minas Gerais, no Estado do Brasil. O movimento insurgia, destacadamente, contra - entre outros motivos - a execução da derrama e o domínio português nos desígnios administrativos das terras do Brasil.

 

A Coroa portuguesa, percebendo a inquietação brasileira, tratou de intensificar o seu controle fiscal sobre a sua colônia na América do Sul, proibindo, em 1785, as atividades fabris e artesanais na Colônia e taxando severamente os produtos vindos da Metrópole.

 

Desde 1783, fora nomeado para governador da capitania de Minas Gerais D. Luís da Cunha Meneses, mandatário reputado pela sua arbitrariedade e violência. Naquela época, as jazidas de ouro em Minas Gerais começavam a se esgotar. Esse fato não foi compreendido pela Coroa, que instituiu a cobrança da chamada "derrama", uma taxação compulsória em que a população local deveria completar o que faltasse da cota imposta por lei de 100 arrobas de ouro (1.500 kg) anuais quando esta não era atingida na extração.

 

Conspiração mineira

 

A cobrança da derrama foi o estopim para a tentativa frustrada de emancipação. Todos estes fatos atingiram expressivamente a classe mais abastada de Minas Gerais (proprietários rurais, intelectuais, clérigos e militares) que, descontentes, começaram a se reunir para conspirar. No grupo dos descontentes destacavam-se, entre outros, os poetas Cláudio Manuel da Costa e Tomás Antônio Gonzaga, os coronéis Domingos de Abreu Vieira e Francisco Antônio de Oliveira Lopes, os padres José da Silva e Oliveira Rolim e Carlos Correia de Toledo e Melo, o cônego Luís Vieira da Silva, o sargento-mor Luís Vaz de Toledo Pisa, o minerador Inácio José de Alvarenga Peixoto e o alferes Joaquim José da Silva Xavier, apelidado posteriormente de maneira depreciativa pelos portugueses como "Tiradentes".

 

Os objetivos dessa conjuração era eliminar a dominação portuguesa das Minas Gerais, estabelecendo ali um país livre. Não havia no momento a intenção de libertar toda a colônia brasileira, pois naquele momento uma identidade nacional ainda não havia se formado e Minas assim, partiu para a busca de se libertar das rédeas de Portugal.

 

Posteriormente, chamados pelos portugueses de "Inconfidentes" (ou infiéis ao rei),  esse grupo acreditava que a forma de governo ideal para o sua nova nação seria a República, inspirados pelas ideias iluministas da França e da recente independência norte-americana, tão comuns à época. Não havia ainda uma intenção clara de libertar os escravos - apesar de essa ideia já ter sido aventada por membros do grupo -, já que muitos dos participantes do movimento eram detentores dessa mão-de-obra.

 

O Símbolo maior no alto foi o primeiro a ser usado pelos inconfidentes

como a sua bandeira, abaixo o símbolo verde do mesmo movimento

e o vermelho da atual bandeira do Estado de Minas Gerais.

 

Articulações confidentes

 

Os chamados Inconfidentes se reuniam corriqueiramente nas casas de Cláudio Manuel da Costa e de Tomás Antônio Gonzaga, entre outros locais, onde se discutiram os planos e as leis para a nova ordem. Inclusive, a bandeira da nova República, – branca com um triângulo originalmente verde e a expressão latina "Libertas Quæ Sera Tamen" – idealizada pelos inconfidentes, cujo dístico foi aproveitado de parte de um verso da primeira écloga de Virgílio e que os poetas inconfidentes interpretaram como "liberdade ainda que tardia".

 

E, em tal contexto, o governador da capitania de Minas Gerais, Luís António Furtado de Castro do Rio de Mendonça e Faro, Visconde de Barbacena, estava determinado a lançar a cobrança da derrama. Destarte, os conspiradores acertaram que a revolução deveria irromper no dia em que fosse decretado o lançamento da cobrança extra (derrama). Eufóricos, esperavam contar naquele momento, com o apoio do povo descontente e da tropa sublevada, coroando o vitorioso movimento.

 

Contudo, a conspiração foi desmantelada pela Coroa em 1789, mesmo ano da Revolução Francesa. O movimento foi traído por um de seus integrantes, Joaquim Silvério dos Reis, que denunciou o grupo para obter perdão de suas dívidas com a Coroa.

 

E assim, o Visconde de Barbacena mandou abrir em junho de 1789 a sua Devassa com base nas denúncias de Silvério dos Reis, nas de Basílio de Brito, Malheiro do Lago, Inácio Correia Pamplona, tenente-coronel Francisco de Paula Freire de Andrade, Francisco Antônio de Oliveira Lopes, Domingos de Abreu Vieira e de Domingos Vidal de Barbosa Laje.

 

De acordo com as leis portuguesas, os réus foram sentenciados pelo crime de "lesa-majestade" nas Ordenações Filipinas, Livro V, título 6, e definidas como "traição contra o rei", cujo texto reza:

 

"Lesa-majestade quer dizer traição cometida contra a pessoa do Rei, ou seu Real Estado, que é tão grave e abominável crime, e que os antigos Sabedores tanto estranharam, que o comparavam à lepra; porque assim como esta enfermidade enche todo o corpo, sem nunca mais se poder curar, e empece ainda aos descendentes de quem a tem, e aos que ele conversam, pelo que é apartado da comunicação da gente: assim o erro de traição condena o que a comete, e empece e infama os que de sua linha descendem, posto que não tenham culpa".

 

A crueldade portuguesa parecia ultrapassar o limite de simples dominação de patrimônio material. Anteriormente, por igual crime de lesa-majestade, em 1759, no reinado de D. José I de Portugal, a família Távora, no processo dos Távora, havia padecido de morte cruel: tiveram os membros quebrados e foram queimados vivos, mesmo sendo os nobres mais importantes de Portugal. De acordo com historiadores, após a ocorrência, a Rainha Dona Maria I passou a sofrer pesadelos devido à cruel execução dos Távora, ordenada por seu pai D. José I, e terminou por enlouquecer.

 

Da Vila Rica ao Rio de Janeiro

 

Com o desmantelamento do grupo inconfidente, os líderes do movimento foram detidos e enviados para o Rio de Janeiro, onde responderam pelo crime de lesa-majestade, materializado em “inconfidência” (falta de fidelidade ao rei), pelo qual foram condenados. Cláudio Manuel da Costa faleceu na prisão, ainda em Vila Rica (hoje Ouro Preto), onde acredita-se que tenha sido assassinado, suspeitando-se, atualmente, que a mando do próprio Governador.

 

Durante o inquérito judicial, todos negaram a sua participação no movimento, exceto o alferes Joaquim José da Silva Xavier, que assumiu a responsabilidade de chefia do movimento.

 

Em 18 de abril de 1792 foi lida a sentença no Rio de Janeiro e 12 dos inconfidentes foram condenados à morte. Mas, em audiência no dia seguinte, foi lido decreto de D. Maria I, pelo qual, todos, à exceção de Tiradentes, tiveram a pena comutada para degredo em colônias portuguesas na África.

 

Óleo sobre tela mostra a resposta de Tiradentes à comutação da pena

 de morte dos Inconfidentes. A pintura do final do século 19 foi encomendada pela

Câmara Municipal de Ouro Preto  ao pintor Leopoldino de Faria para homenagear Tiradentes,

considerado o Mártir da Inconfidência, após à Proclamação da República.

 

Ecos da inconfidência

 

Com o passar dos anos, a Inconfidência Mineira transformou-se em símbolo máximo de resistência para os mineiros, a exemplo da Guerra dos Farrapos para os gaúchos, e da Revolução Constitucionalista de 1932 para os paulistas. Mudando-se apenas a cor do triângulo, de verde para o vermelho, a bandeira idealizada pelo movimento dos inconfidentes foi adotada como bandeira do Estado de Minas Gerais.

 

Tiradentes, o conjurado de mais baixa condição social do grupo, foi o único condenado à morte por enforcamento, sendo a sentença executada publicamente em 21 de abril de 1792 no Campo da Lampadosa. Outros inconfidentes haviam sido condenados à morte, mas tiveram suas penas reduzidas para degredo, na segunda sentença. A casa onde viveu Tiradentes foi destruída pela Coroa à época.

 

Cabe destacar que, as crueldades portuguesas não terminaram depois que o movimento foi desmantelado. A Coroa desejava também impressionar a população e mostrar que ela seria incapaz de provocar levantes em prol de sua independência. E assim, após a execução de Tiradentes, seu corpo foi levado em uma carreta do Exército para a Casa do Trem (hoje parte do Museu Histórico Nacional), onde foi esquartejado.

 

Imagens do corpo de Tiradentes esquartejado povoa livros das histórias brasileira e portuguesa por mais de dois séculos. As imagens [veja abaixo] consideradas traumáticas até para os atrozes dias atuais, causaram ranço e até pavor em várias gerações de alunos, do Oiapoque ao Chui. Estaera a impressão imposta pela Coroa àqueles que desejassem desobedecer às leis portuguesas em terras transcontinentais.

 

A reconstituição ilustrativa a óleo - pois a fotografia só chegaria no país alguns anos depois – procura ser bem realista e mostra os membros do mártir cortados como que de um animal num açougue. O tronco desmembrado do corpo foi entregue à Santa Casa de Misericórdia, sendo enterrado como indigente - observe-se os requintes de crueldades da Coroa à época. A cabeça e os quatro pedaços do corpo (membros) foram salgados (para não apodrecerem rapidamente), acondicionados em sacos de couro e enviados às Minas Gerais. Na capitania em que irrompeu o levante antireinado, as partes do corpo do mártir foram pregadas em postes do “Caminho Novo”, onde Tiradentes pregou suas ideias revolucionárias.

 

A pintura de Tiradentes esquartejado foi

produzida em 1893 por Pedro Américo,

 

Corpo esparramado

 

A história registra que a cabeça de Tiradentes foi exposta na Vila Rica, no alto de um poste e defronte à sede do governo. Pouco depois, a cabeça foi furtada, cujo paradeiro se desconhece até a atualidade. Destarte, o castigo seria exemplar, visando claramente dissuadir qualquer outra tentativa de questionamento do poder português na colônia e, em particular, naquela capitania.

 

Os requintes de crueldade e a teatralidade montada pela Coroa ainda foram além: o sangue de Tiradentes foi usado para lavrar a certidão de cumprimento da sentença. Destruíram totalmente a casa em que Tiradentes morava e jogaram sal no terreno, para que nada mais germinasse. Além disso, foram declarados infames a sua memória e todos os seus descendentes.

 

A história também registra que parentes de Tiradentes em até terceiro grau sofreram perseguição da Coroa, mesmo após muitos anos de sua morte. Inclusive, membros dessa família tiveram que abrir mão do sobrenome Xavier e adotar outros para escapar à perseguição portuguesa.

 

De acordo com as pesquisas mais recentes, ao contrário do que se pensa, Tiradentes, não estava barbado e de cabelos longos quando de seu enforcamento. Na prisão, onde ficou por algum tempo antes de cumprir sua pena, teve o cabelo e barba raspados para evitar a proliferação de piolhos. Conforme os defensores dessa ideia, que rebatem a imagem que mostra Tiradentes com barba, a própria posição de alferes não permitia a ele manter tal aparência.

 

Cabe registrar que toda a gama de gravuras e reconstituições relacionadas à Inconfidência Mineira e Tiradentes seria criada com base em documentos históricos e, somente algumas décadas depois. O pintor que mais retratou Tiradentes em vida foi Leopoldino Joaquim Teixeira de Faria (1836-1911) que produziu uma série de pinturas destacando o mártir mineiro. Já a pintura que mostra o corpo de Tiradentes esquartejado é de autoria do pintor italiano que viria a residir no Brasil, Pedro Américo de Figueiredo e Melo, nascido na Florença em 1843 e que reproduziu pinturas que retratam algumas passagens marcantes da história do Brasil. 

 

Um Brasil livre

 

A independência do Brasil ou o processo que culminou na emancipação política do reino de Portugal, viria se consolidar somente três décadas depois da morte de Tiradentes, já no século 19. Oficialmente, a data é comemorativa foi fixada em 7 de setembro de 1822, quando ocorreu o episódio do chamado "Grito do Ipiranga". De acordo com a história oficial brasileira, a independência brasileira de Portugal se consolidaria pela frase “independência ou morte”, bradada nas margens do ribeirão Ipiranga, em São Paulo, pelo então Príncipe Regente, D. Pedro I, diante à sua comitiva.

 

A República ainda seria proclamada décadas mais tarde, em 15 de novembro de 1889, durante o derradeiro reinado português nas terras tupiniquins pelo imperador D. Pedro II, filho do independente Pedro I, que retornou a Portugal, onde faleceu alguns anos depois.

 

Não com a chegada da independência à colônia, mas somente após alçada décadas depois à República do Brasil, a condição revolucionária de Tiradentes foi reconhecida como a de um dos principais mártires desse desvinculo administrativo nacional e, evidentemente, um dos precursores da instalação do regime republicano no país. Seu movimento foi um precursor do sonho separatista e veio alimentar outros movimentos brasileiros que também objetivavam o desvinculo da nação portuguesa.

 

Outra obra de Leopoldino Joaquim Teixeira de Faria

retrata a 'Leitura da sentença', óleo sobre tela.

  

Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes

 

Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, nasceu na Fazenda do Pombal, batizado em 12 de novembro de 1746 e morreu no Rio de Janeiro, em 21 de abril de 1792. Trabalhou como dentista, tropeiro, minerador, comerciante, militar e ativista político que atuou no Brasil colonial, mais especificamente nas capitanias de Minas Gerais e Rio de Janeiro. No Brasil, é reconhecido como mártir da Inconfidência Mineira, patrono cívico do Brasil, patrono também da Polícia Militar dos Estado (que traz o seu rosto nas fardas dos agentes policiais) e herói nacional.

 

O dia de sua execução, 21 de abril, é feriado nacional. A cidade mineira de Tiradentes, antiga Vila de São José do Rio das Mortes, foi renomeada em sua homenagem.

 

Tiradentes nasceu em uma fazenda no distrito de Pombal, próximo ao arraial de Santa Rita do Rio Abaixo, à época território disputado entre as vilas de São João del Rey e São José do Rio das Mortes, nas Minas Gerais. O nome da fazenda "Pombal" é uma ironia da história: O Marquês de Pombal foi arqui-inimigo de Dona Maria I, contra a qual Tiradentes conspirou, e que comutou as penas dos inconfidentes.

 

Joaquim José da Silva Xavier era filho do reinol Domingos da Silva Santos, proprietário rural e da brasileira Maria Antônia da Encarnação Xavier (prima em segundo grau de Antônio Joaquim Pereira de Magalhães), tendo sido o quarto dos sete filhos.

 

Em 1755, após o falecimento de sua mãe, seguiu junto ao seu pai e irmãos para a sede da Vila de São José; dois anos depois, já com 11 anos, faleceu o seu pai. Com a morte prematura dos pais, logo sua família perdeu as propriedades por dívidas. Não fez estudos regulares e ficou sob a tutela de um padrinho, que era cirurgião. Trabalhou como mascate e minerador, tornou-se sócio de uma botica de assistência à pobreza na ponte do Rosário, em Vila Rica e se dedicou também às práticas farmacêuticas e ao exercício da profissão de dentista, o que lhe valeu o apelido (alcunha) de Tiradentes, considerado um tanto depreciativo.

 

Com os conhecimentos que adquirira no trabalho de mineração, tornou-se técnico em reconhecimento de terrenos e na exploração dos seus recursos. Começou a trabalhar para o governo no reconhecimento e levantamento do sertão brasileiro. Em 1780, alistou-se na tropa da Capitania de Minas Gerais; em 1781, foi nomeado comandante do destacamento dos Dragões na patrulha do "Caminho Novo", estrada que servia como rota de escoamento da produção mineradora da capitania mineira ao porto Rio de Janeiro.

 

Foi a partir desse período que Tiradentes começou a se aproximar de grupos que criticavam a exploração do Brasil pela metrópole, o que ficava evidente quando se confrontava o volume de riquezas tomadas pelos portugueses e a pobreza em que o povo permanecia em Minas Gerais. Insatisfeito por não conseguir promoção na carreira militar, tendo alcançando apenas o posto de alferes, patente inicial do oficialato à época, e por ter perdido a função de comandante da patrulha do Caminho Novo, pediu licença da cavalaria em 1787.

 

Morou por volta de um ano no Rio e Janeiro, período em que idealizou projetos de vulto, como a canalização dos rios Andaraí e Maracanã para a melhoria do abastecimento de água no Rio de Janeiro; porém, não obteve aprovação para a execução das obras. Esse desprezo fez com que aumentasse seu desejo de liberdade para a colônia.

 

Brasão da Polícia Militar do Estado de Minas Gerais que destaca

o patrono Tiradentes integra o uniforme da PMMG.

 

De volta às Minas Gerais, começou a pregar em Vila Rica e arredores, a favor da independência daquela província. Fez parte de um movimento aliado a integrantes do clero e da elite mineira, como Cláudio Manuel da Costa, antigo secretário de governo, Tomás Antônio Gonzaga, ex-ouvidor da comarca, e o minerador Inácio José de Alvarenga Peixoto. O movimento ganhou reforço ideológico com a independência das colônias estadunidenses à época e a formação dos Estados Unidos da América. Ressalta-se que, então, oito de cada dez alunos brasileiros em Coimbra eram oriundos das Minas Gerais, o que permitiu à elite regional beber de fontes dos ideais liberais que circulavam na Europa.

 

Além das influências externas, fatores regionais e econômicos contribuíram também para a articulação da conspiração nas Minas Gerais. Com a constante queda na receita provincial, devido ao declínio da atividade da cana de açúcar, a administração de Martinho de Melo e Castro instituiu medidas que garantissem o Quinto, imposto que obrigava os moradores das Minas Gerais a pagar, anualmente, cem arrobas de prata, destinadas à Real Fazenda.

 

A partir da nomeação de Antônio da Cunha Meneses como governador da província, em 1782, ocorreu a marginalização de parte da elite local em detrimento de seu grupo de amigos. O sentimento de revolta atingiu o máximo com a decretação da derrama, a tal medida administrativa que permitia a cobrança forçada de impostos atrasados, mesmo que preciso fosse confiscar todo o dinheiro e bens do devedor, a ser executada pelo novo governador das Minas Gerais, Luís Antônio Furtado de Mendonça, 6.º Visconde de Barbacena (futuro Conde de Barbacena), o que afetou especialmente as elites mineiras. Isso se fez necessário para se saldar a dívida mineira acumulada desde 1762, referente ao quinto, que àquela altura já somava 538 arrobas de ouro em impostos atrasados.

 

O movimento se iniciaria na noite da insurreição: os líderes da "inconfidência" sairiam às ruas de Vila Rica dando vivas à República, com o que ganhariam a imediata adesão da população. Porém, antes que a conspiração se transformasse em revolução, em 15 de março de 1789 foi delatada aos portugueses por Joaquim Silvério dos Reis, coronel, Basílio de Brito Malheiro do Lago, tenente-coronel, e Inácio Correia de Pamplona, luso-açoriano, em troca do perdão de suas dívidas com a Real Fazenda. Anos depois, por sua delação e outros serviços prestados à Coroa, Silvério dos Reis receberia o título de Fidalgo.

 

Entrementes, em 14 de março, o Visconde de Barbacena já havia suspendido a derrama, o que esvaziaria por completo o movimento. Ao tomar conhecimento da conspiração, Barbacena enviou Silvério dos Reis ao Rio para apresentar-se ao vice-rei, que imediatamente (em 7 de maio) abriu uma investigação (devassa). Avisado, o alferes Tiradentes, que estava em viagem licenciada ao Rio de Janeiro escondeu-se na casa de um amigo, mas foi descoberto ao tentar fazer contato com Silvério dos Reis e foi preso em 10 de maio. Dez dias depois o Visconde de Barbacena iniciava as prisões dos inconfidentes em Minas.

 

Estátua alusiva na Praça Tiradentes, em Belo Horizonte.

 

Prisão de Tiradentes, por Antônio Diogo da Silva Parreiras

 

Dentre os inconfidentes, destacaram-se os padres Carlos Correia de Toledo e Melo, José da Silva e Oliveira Rolim e Manuel Rodrigues da Costa, o tenente-coronel Francisco de Paula Freire de Andrade, comandante dos Dragões, os coronéis Domingos de Abreu Vieira e Joaquim José Silvério dos Reis (um dos delatores do movimento), os poetas Cláudio Manuel da Costa, Inácio José de Alvarenga Peixoto e Tomás Antônio Gonzaga, ex-ouvidor.

 

Os principais planos dos inconfidentes eram: estabelecer um governo republicano independente de Portugal; criar manufaturas no país que surgiria; uma universidade em Vila Rica e fazer de São João del Rey a capital da nação mineira. Seu primeiro presidente seria, durante três anos, Tomás Antônio Gonzaga, após o qual haveria eleições. Nessa república não haveria exército – em vez disso, toda a população deveria usar armas, e formar uma milícia quando necessária. Há que se ressaltar que os inconfidentes visavam a autonomia somente da província das Minas Gerais, e em seus planos não estava prevista a libertação dos escravos africanos, apenas daqueles nascidos no Brasil.

 

Negando a princípio sua participação, Tiradentes foi o único a, posteriormente, assumir toda a responsabilidade pela "inconfidência", inocentando seus companheiros. Presos, todos os inconfidentes aguardaram durante três anos pela finalização do processo. Alguns foram condenados à morte e outros ao degredo; algumas horas depois, por carta de clemência de D. Maria I, todas as sentenças foram alteradas para degredo, à exceção apenas para Tiradentes, que continuou condenado à pena capital, porém não por morte cruel como previam as Ordenações do Reino: Tiradentes foi enforcado.

 

Os réus foram sentenciados pelo crime de "lesa-majestade", definida, pelas ordenações afonsinas e as Ordenações Filipinas, como traição contra o rei. Crime este comparado à hanseníase pelas Ordenações Filipinas.

 

Em parte por ter sido o único a assumir a responsabilidade, em parte, provavelmente, por ser o inconfidente de posição social mais baixa, haja vista que todos os outros ou eram mais ricos, ou detinham patente militar superior. Por esse mesmo motivo é que se cogita que Tiradentes seria um dos poucos inconfidentes que não era tido como maçom.

 

E assim, numa manhã de sábado, 21 de abril de 1792, Tiradentes percorreu em procissão as ruas do centro da cidade do Rio de Janeiro, no trajeto entre a cadeia pública e onde fora armado o patíbulo.

 

O governo geral tratou de transformar aquela numa demonstração de força da coroa portuguesa, fazendo verdadeira encenação. A leitura da sentença estendeu-se por dezoito horas, após a qual houve discursos de aclamação à rainha, e o cortejo munido de verdadeira fanfarra e composta por toda a tropa local.

 

Ruínas da sede da Fazenda do Pombal, atual município

de Ritápolis, nesse local nasceu Tiradentes.

 

Bóris Fausto aponta essa como uma das possíveis causas para a preservação da memória de Tiradentes, argumentando que todo esse espetáculo acabou por despertar a ira da população que presenciou o evento, quando a intenção era, ao contrário, intimidar a população para que não houvesse novas revoltas.

 

A sentença proferida contra os réus do levante e conjuração de Minas Gerais, ditava, “Portanto, condenam o réu Joaquim José da Silva Xavier, por alcunha o Tiradentes, alferes que foi do Regimento pago da Capitania de Minas, a que, com baraço e pregão seja conduzido pelas ruas públicas ao lugar da forca, e nela morra morte natural para sempre, e que depois de morto lhe seja cortada a cabeça e levada a Vila Rica, onde no lugar mais público dela, será pregada em um poste alto, até que o tempo a consuma, e o seu corpo será dividido em quatro quartos, e pregados em postes, pelo caminho de Minas, no sítio da Varginha e das Cebolas, onde o réu teve as suas infames práticas, e os mais nos sítios das maiores povoações, até que o tempo também os consuma, declaram o réu infame, e seus filhos e netos tendo-os, e os seus bens aplicam para o Fisco e Câmara Real, e a casa em que vivia em Vila Rica será arrasada e salgada, para que nunca mais no chão se edifique, e não sendo própria será avaliada e paga a seu dono pelos bens confiscados, e mesmo chão se levantará um padrão pelo qual se conserve em memória a infâmia deste abominável réu; (...)”.

 

* Pepe Chaves é editor do diário digital Via Fanzine e da Rede VF.

 

- Fotos: Reprodução/divulgação/Arquivo VF.

 

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  Inconfidência, a busca por liberdade

 

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 - Produção: Pepe Chaves.

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