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Musical

 

35 anos da morte de Raul:

Raul Seixas, uma mensagem jogada ao tempo

O mês de agosto marca mais uma passagem

da morte daquele que se tornou a sua própria música.

 

Da Redação VF*

De Belo Horizonte

ATUALIZADO EM

21/08/2024

 

Raul: o tempo não conseguiu segurá-lo.

 

Um baiano 'enrockado'

 

O intérprete e compositor baiano Raul Seixas se projetou na Música Popular Brasileira (MPB) na década de 1970, quando, levado pela sua música e suas ideias, caiu na graça nacional. Sua irreverência e o conteúdo das letras de suas canções conquistariam legiões de fãs em todo o país, mesmo após muitos anos da sua morte.

 

Raul Santos Seixas, nasceu em Salvador-BA, em 28 de junho de 1945 e faleceu em São Paulo, em 21 de agosto de 1989, aos 44 anos, dois dias depois de lançar o álbum “A Panela do Diabo”, em parceria com o conterrâneo e último parceiro Marcelo Nova.

 

Em uma carreira de sucesso na música nacional, ao seu lado esteve o parceiro que escrevia a maioria de suas letras, Paulo Coelho, que mais tarde seria um consagrado (quem diria!) escritor "imortal" pela academia Brasileira de Letras. Seixas se tornou um símbolo da cultura alternativa do país, num tempo de ditadura em que muitas mensagens era passadas pelas em músicas, após driblar a censura. Contudo, o envolvimento de ambos com drogas, rituais de magia negra criou um coquetel que culminaria em fases “negras” de suas vidas, como bem tornaram público em livros e entrevistas.

 

Filho do casal Raul Varella Seixas e Maria Eugênia Seixas, Raul cresceu na cidade de Salvador, caracterizada por sua tradição e a rica diversidade cultural. Em casa, obtém uma cultura que o faria se adiantar àquilo que era ensinado nas escolas. Mergulhando nos livros que tinha à disposição, na biblioteca do pai. Até o final de sua vida, sempre foi considerado avançado para sua época, o que é comprovado pelas músicas por ele compostas e que até hoje são executadas.

 

Seu gosto musical foi se moldando: primeiro, no rádio, acompanha o sucesso de Luiz Gonzaga, e nas viagens, onde acompanha o pai (inspetor de ferrovia), ouve os matutos desfiarem repentes - e esta "raiz" nordestina nunca o abandonara. Raul Seixas era um garoto muito tímido na infância e na adolescência, e só vivia trancado no quarto lendo e compondo. Seu sonho no início era ser um escritor, até o Rock'n Roll aparecer em sua vida. Nesse momento, nas telas dos cinemas, encanta-se com o talento de Elvis Presley, de quem torna-se fã - e aponta-lhe o rumo musical: o Rock'n Roll.

 

Juntamente com alguns amigos de Salvador, monta um conjunto, "Os Relâmpagos do Rock", mais tarde "The Panters", e por último conhecido como "Raulzito e os Panteras". Fazem shows no estado e, a convite do amigo Jerry Adriani, vai para o Rio de Janeiro em 1967, onde gravaria um disco pela Odeon. A produção foi um total fracasso e o disco que seria o primeiro registro da voz de Raul Seixas (hoje uma raridade) encalhou nas lojas.

 

Havia um Rio no caminho

 

No início dos anos de 1970, Raul retorna ao Rio, agora contratado por outra gravadora, a CBS (atual Sony). Participa da produção de diversos artistas da Jovem Guarda, como Jerry Adriani, Leno e Lilian e mais tarde Sérgio Sampaio, Diana, entre outros. Também compõe mais de 80 músicas para a Jovem Guarda, algumas de muito sucesso, como: "Doce, Doce, Doce Amor", "Sha-la-la-la", "Tudo que é bom dura pouco", "Ainda queima a esperança" entre outras.

 

E naqueles anos 70 Raul acaba se "rebelando". Aproveitando a ausência do presidente da empresa, Evandro Ribeiro, Raul grava seu segundo LP ("Sociedade da Grã-Ordem Kavernista"), em que faz parceria com Sérgio Sampaio (que depois ficaria conhecido com "Eu é quero botar meu bloco na rua"), Miriam Batucada e Edy Star. O disco, todavia, foi retirado do mercado sob o argumento de não se enquadrar à linha de atuação da gravadora.

 

Em 1972 participou do VII FIC (Festival Internacional da Canção), promovido pela Rede Globo, e conseguiu a classificação de duas músicas, "Let me sing" (um misto de baião e rockabilly)e "Eu Sou Eu, Nicuri é o Diabo", o que lhe deu projeção nacional.

 

No ano de 1973, Raul conseguiu um estrondoso sucesso com a música "Ouro de Tolo", com letra quase autobiográfica, mas também um deboche com a Ditadura e o "milagre" econômico. Naquele mesmo ano foi contratado pela Philips (atual Universal Music), onde gravou o LP "Krig-Ha, Bandolo", com o qual Raul finalmente alcançou o sucesso, imortalizando a parceria com Paulo Coelho. Juntos, lançaram canções que se configuram entre os maiores hits nacionais da história, tais como,  "Metamorfose Ambulante", "Mosca na Sopa", "Ouro de Tolo", "Al Capone", "O Trem", "Gita", entre tantas outras. E assim, "Krig Ha Bandolo" seria desde então, a principal referência da obra de Raul.

 

Graças ao seu talento e ousadia, Raul Seixas conquistou seu espaço na música brasileira e alcançou grande repercussão nacional. No ano de 1974, por divulgar a Sociedade Alternativa [ideia de se criar uma sociedade rural, independente do sistema capitalista], juntamente com Paulo Coelho, acabou preso e torturado pelo DOPS [Departamento de Ordem Política e Social, espécie de "FBI" da ditadura brasileira].

 

'Antes de ler o livro que o guru lhe deu, você tem que escrever o seu'.

(Raul Seixas)

 

Exílio e sucesso

 

Foi exilado pela Ditadura nos Estados Unidos, o que não impediu que o sucesso de seu recém lançado álbum, "Gita" e da música homônima lhe rendesse um disco de ouro, com 600 mil cópias vendidas. O feito fez com que ele retornasse ao Brasil, meses depois. Neste mesmo ano, ele se separou de sua primeira esposa, Edith Wisner, com quem teve uma filha chamada Simone.

 

Em 1975, casou com Glória Vaquer, e grava o LP "Novo Aeon", no qual Raul compôs, uma de suas músicas mais conhecidas, "Tente Outra Vez". Em 1976, grava o álbum "Há Dez Mil Anos Atrás", que também é um LP recheado de clássicas composições. Nesse ano nasce a sua segunda filha, Scarlet.

 

Raul Seixas lançou mais outros três discos pela WEA (hoje Warner Music Brasil), a partir de 1977, que fizeram sucesso de público e desgosto na crítica, sendo eles, "O Dia Em Que A Terra Parou", "Mata Virgem" e "Por Quem Os Sinos Dobram".

 

No final dos anos 70, intensifica-se a parceria com o amigo Cláudio Roberto, com quem Raul viria compor várias de suas canções mais conhecidas, como "Maluco Beleza", "O Dia em que a Terra Parou", "Rock das Aranhas", "Aluga-se", entre outras.

 

Raul se tornou uma grande referência nacional. Ele estava exposto nas bancas de revistas de todo o país, nas rádios e nos principais programas da tevê. Sua música, se tornara para muitos, trilha sonora de um tempo, de uma situação ou por tantas outras identificações reconhecidas.

 

Saúde e decadência

 

A partir do ano de 1978, começa a ter problemas de saúde devido ao consumo de álcool, que lhe causa a perda de um terço do pâncreas. Separa-se de Glória, que seguiu para os EUA levando a filha Scarlet. Naquele ano, conhece Tania Menna Barreto, com quem passa a viver.

 

No ano seguinte, separa-se de Tania e passa a sofrer de depressão, sendo internado para tratar do alcoolismo. Conhece Angela Affonso Costa, a Kika Seixas, sua quarta companheira. No ano de 1980, assinou contrato novamente  com a CBS, lançou mais um álbum, "Abre-te Sésamo" e rescindiu o contrato. Em 1981 nasce a terceira filha, Vivian, fruto de seu casamento com Kika.

 

Seus dois discos seguintes, "Raul Seixas" (1983) e "Metrô linha 743" (1984), além do livro "As Aventuras de Raul Seixas na Cidade de Thor" fizeram sucesso, mas depois Raul teve as portas fechadas novamente, devido ao seu consumo excessivo de álcool e as constantes internações para desintoxicação. Em 1985, separou-se de Kika Seixas. Faz um show, em 1º de dezembro daquele ano, no Estádio Lauro Gomes, na cidade de São Caetano do Sul. Só voltaria a pisar no palco no ano de 1988, ao lado de Marcelo Nova.

 

Conseguindo um contrato com a gravadora Copacabana (de propriedade da EMI), em 1986 , grava um disco que foi grande sucesso entre os fãs, "UAH-BAP-LU-BAP-LA-BEIN-BUM" (1987). Naquela época, conheceu Lena Coutinho, que se tornaria sua companheira. A partir de 1987 estreitou relações com Marcelo Nova, fazendo uma participação no LP "Duplo Sentido", da banda Camisa de Vênus.

 

Um ano mais tarde, em 1988, já sozinho, grava aquele que seria o seu último álbum solo, "A Pedra do Gênesis". A convite de Marcelo Nova, realizaram juntos alguns shows em Salvador, após três anos sem pisar num palco. No ano de 1989, realiza uma turnê com Marcelo Nova, agora parceiro musical, totalizando mais de 50 apresentações pelo Brasil.

 

Morte e obra

 

O último disco lançado em vida foi feito em parceria com Marcelo Nova, "A Panela do Diabo", que foi lançado pela Warner Music Brasil, um dia após a sua morte. Raul Seixas faleceu no dia 21 de agosto de 1989, aos 44 anos. Seu corpo foi encontrado às oito horas da manhã, pela sua empregada, Dalva. Pereceu vítima de parada cardíaca, causada por alcoolismo e agravada por ser diabético e por não ter tomado insulina na noite anterior. A causa da morte foi pancreatite aguda e fulminante.

 

O álbum "A Panela do Diabo" vendeu 150 mil cópias, rendendo ao Raul um disco de ouro póstumo, entregue à sua família e também a Marcelo Nova (parceiro de Raul, com quem gravou o LP), se tornando um dos discos de maior sucesso de sua carreira.

 

Depois de sua morte, Raul permaneceu por muito tempo entre as paradas de sucesso. Foram produzidos vários álbuns póstumos, como "O Baú do Raul" (1992), "Metamorfose Ambulante" (1993), "Documento" (1998), "Anarkilópolis" (2003) e "Raul Seixas - Série BIS Duplo" (2005). Sua penúltima mulher, Kika, já produziu um livro do cantor, "O Baú do Raul", baseado em escritos dos diários de Raulzito desde os seis anos de idade até a sua morte.

 

Muitos dos fãs de Raul Seixas consideram uma das marcas mais fortes nas suas músicas a sua capacidade de, através de um estilo jovial e descontraído, transmitir mensagens ou fazer questionamentos sobre temas como o amor, a vida, e a existência em si.

 

Raul deixou essa vida, mas sua obra e sua voz permanecem vivas, encantando àqueles que estão entre nós, como também encantaram tantos que assim como ele já foram e que agora podem ter o privilégio de assistir suas apresentações "ao vivo", do outro lado da vida...

 

As várias faces da maluquês e da lucidez.

 

Pensamentos de Raul

 

"A arte de ser louco é jamais cometer a loucura de ser um sujeito normal."

 

"Ninguém tem o direito de me julgar a não ser eu mesmo. Eu me pertenço e de mim faço o que bem entender."

 

"Todos os partidos são variantes do absolutismo. Não fundaremos mais partidos; o Estado é o seu estado de espírito."

 

"Só há amor quando não existe nenhuma autoridade."

 

"O sonho do careta é a realidade do maluco."

 

"A desobediência é uma virtude necessária à CRIATIVIDADE."

 

"Ninguém morre, as pessoas despertam do sonho da vida."

 

"Quero a certeza dos loucos que brilham. Pois se o louco persistir na sua loucura, acabará sábio."

 

"Eu não sou louco, é o mundo que não entende minha lucidez."

 

"Somos prisioneiros da vida e temos que suportá-la até que o último viaduto nos invada pela boca adentro e viaje eternamente em nossos corpos."

 

"A formiga é pequena, mas elas são um exército quando juntas."

 

"De que o mel é doce é coisa que eu me nego a afirmar, mas que parece doce eu afirmo plenamente."

 

"Nunca é tarde demais pra começar tudo de novo."

 

"Há Homens que nascem póstumos."

 

"Que capacidade impiedosa essa minha de fingir ser normal o tempo todo."

 

"Antes de ler o livro que o guru lhe deu, você tem que escrever o seu."

 

* Com informações das agências e portais especializados em Raul Seixas.

 

- Fotos: Arquivo VF/divulgação.

 

- Produção: Pepe Chaves.

 

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