Astronomia:
Reencontrando Copérnico em tempos atuais
Recentemente, o
mundo da Astronomia teve uma confirmação bombástica
relativa a um de seus personagens mais ilustres: Nicolau
Copérnico.
Por
Márcio R. Mendes*
De
Dois Córregos-SP
Para
Via Fanzine
Reconstituições do semblante e perfil de Nicolau
Copérnico
Ecos de um passado distante
Em 2005 Jerzy Gasowski da Pultusk School of Humanities,
da Polônia, usando um radar para pesquisar o subsolo da Cadetral de
Frombork, no norte daquele país, encontrou os supostos restos mortais do
Cônego Nicolau Copérnico. Análises de DNA confirmaram a idade do cadáver
como sendo a de um homem com idade de 70 anos, sendo feito nos últimos
três anos trabalho minucioso por parte de arqueólogos, permitindo a
reconstituição facial de Copérnico.
Gasswski disse que especialistas forenses da polícia usaram
o crânio para reconstruir a face que se assemelha bastante com as
características - incluindo um nariz partido e uma cicatriz acima do
olho esquerdo - observadas num auto-retrato de Copérnico. O túmulo
estava em más condições e nem todos os restos foram encontrados, disse
Gassowski, acrescentando que a equipe irá tentar encontrar descendentes
de Copérnico para fazer uma identificação de DNA mais precisa. Embora
não tenha deixado descendentes conhecidos, os cientistas esperam
encontrar alguns familiares seus em outras plagas.
O passado pela ótica
da tecnologia atual
A análise do DNA de dois fios de cabelo de um livro que se
sabe ter pertencido a Copérnico - Calendarium Romanum Magnum, por
Johannes Stoeffler - coincide com o DNA de um dente e de um fêmur
retirados dos restos em Frombork. O livro, em conjunto com um número de
outros volumes pertencentes a Copérnico, foi levado para a Suécia
durante as guerras Polaco-Suecas do século XVII, e encontra-se agora na
Universidade de Uppsala.
Copérnico nasceu em 1473, na Polônia e passou a imagem de
um homenzinho medroso, instrospectivo, típico da Idade Média; não
fazendo jus ao gigante intelectual e, certamente, um gênio de sua época.
Copérnico viveu em um período que é, no mínimo, apaixonante
para historiadores, marcou a passagem do obscurantismo para um período
em que a humanidade teve um desenvolvimento notório. Para relembrar:
quando tinha dez anos, nascia Martinho Lutero; foi contemporâneo de
Leonardo da Vinci, Miguel Ângelo, Botticelli, Dürer, Ariosto, Rabelais,
Maquiavel e Inácio de Loyola. Quando tinha quinze anos, Bartolomeu Dias
dobra o Cabo da Boa Esperança e estava com dezenove quando Cristóvão
Colombo descobriu as Américas. Quando tinha 39 anos, Balboa vê pela
primeira vez as águas do Oceano Pacífico e aos 44, Fernão de Magalhães
inicia sua viagem de Circunavegação. Morre dois anos antes do Concílio
de Trento. Visto dessa forma, pode parecer um período pleno de
desenvolvimento tecnológico, científico e cultural, mas é preciso ter em
mente que esses processos eram "localizados". A cidade de Thorn, por
exemplo, (atual Torún), onde nasceu Copérnico estava ainda mergulhada
nas obsessões da Idade Média, sendo uma cidade dividida onde se falava
ao mesmo tempo o polonês e o alemão.
Copérnico se tornou órfão quando ainda criança e foi criado
por um tio, ligado ao clero, o que o fez encaminhar seu pupilo nesta
área. Mal completa seus dezoito anos, ingressa na Universidade da
Cracóvia, uma das melhores da Europa e famosa pelas cátedras de
Astronomia e Matemática. Segue sua vida acadêmica estudando Direito,
porém, Astronomia era sua paixão. Encontrou tempo ainda para a
Filosofia, Medicina e Grego. É um intelectual completo, pois em 1500
viaja para Roma, a fim de fazer uma conferência sobre matemática para um
córum selecionado.
Tem sua vida garantida pelo tio Lukas, quando retorna à
Polônia, assegurando-lhes a cátedra de Cônego na cidade de Frauenburg.
Na verdade, em sua época, Copérnico foi muito mais conhecido como médico
do que como astrônomo e nunca foi um padre, já que era vedado aos padres
exercer medicina. Prova disso é que vários Bispos o chamam ao seu leito
de morte, como Maurício Ferber e Dansticus, numa época em que os
medicamentos são feitos de raspas de marfim, escaravelhos triturados e
corações de cervos.
Envolve-se em questões locais que não são típicas de uma
pessoa reclusa, defendendo oprimidos, e encontra tempo para cultivar a
língua grega, não por amor à erudição, mas, para poder ter acesso a
documentos científicos que possam corroborar com suas idéias. Enquanto
vai estudando dados restritos a poucos, ainda apaixona-se por questões
financeiras e problemas técnicos da cunhagem de moedas, chegando mesmo a
publicar um ensaio sobre isto. Chega a fazer parte de uma comissão
encarregada de encontrar um novo padrão monetário, comum aos reinos da
Polônia e da Prússia Ocidental.
Para se ter uma idéia do atraso vivido na Astronomia,
naqueles tempos, o fato de ter a terra sólida e firme sob os pés,
produzia modelos absurdos, também baseados em interesses e influências
de pseudo-sábios. Há devotos que chegam a dar a Terra a forma de um
tabernáculo. São Basílio afirma que os céus são constituídos por "águas
supercelestes", enquanto Cosmas Indikopleustes afirma que a Terra é
retangular e rodeada pelo oceano, num Universo sustentado por quatro
muros, tudo sob um teto onde anjos transportam os astros.
Como escreveu S. Groueff em seu livro "O enigma do Cosmo",
referindo-se ao caos reinante na época: "Deve-se desesperar? Não,
porque apesar dessa incrível confusão, tem-se a impressão que a luz
tenta penetrar, timidamente, por meio de raios furtivos que depressa se
perdem na opaca escuridão ambiente".
Logo mais adiante, referindo-se a Copérnico como um
revolucionário para sua época, ele descreve: "Ao mesmo tempo em que
tira o chapéu ao velho Ptolomeu, examina os sistemas dos adversários.
Conhece bem a famosa teoria de Heráclito do Ponto, segundo a qual Vênus
e Mercúrio giram em torno do Sol. Quanto mais Copérnico avança nas suas
pesquisas, ele começa a por em dúvida o ensino oficial".
A
Catedral de Frombork, local onde se encontra sepultado Nicolau
Copérnico.
Axiomas
De forma prudente, acabou desencadeando uma guerra às
teorias absurdas, inclusive de Ptolomeu - que adotou o sistema
heliocêncitrico (astros giram em torna da Terra); revelando de forma
impiedosa as contradições evidentes nos velhos modelos.
Trabalhando silenciosamente em seu gabinete, pretendeu ir
até as últimas consequências de seu raciocínio. Num cenário acorrentado
aos velhos dogmas, Copérnico escreve com mão segura sete axiomas que vão
abalar o mundo, para não dizer revolucioná-lo. Embora hoje pareçam mais
que evidentes, esses axiomas foram descomunais heresias para os sábios
de sua época.
São eles:
1 - Nem todas as esferas celestes giram em torno de um
único centro.
2 - O centro da Terra não é o centro do Universo, mas
apenas o da gravidade e o da órbita da Lua.
3 - Todas as esferas giram em torno do Sol e,
consequentemente, o Sol é o centro do Universo.
4 - As distâncias das estrelas fixas é tão imensa que, em
comparação, a da Terra ao Sol é insignificante.
5 - Os movimentos que aparecem no firmamento não provém do
movimento do firmamento e sim da Terra, que, a cada dia, gira em torno
do seu eixo.
6 - O que nos parece movimento do Sol não é senão o
movimento da Terra que, como os outros planetas, gira em torno do seu
eixo.
7 - Os movimentos aparentemente retrógrados dos planetas
devem-se apenas ao movimento da Terra, que basta para explicar todos os
movimentos irregulares nos céus.
Clássica
obra de Copérnico.
Commentariuolus
O Commentariuolus, no início, do qual se encontram
esses sete axiomas e constitui uma tremenda inovação para a Astronomia
da época, jamais será publicado. Copérnico o faz circular como cópias,
de mão em mão, nos meios eruditos. Foram poucas cópias, sendo que
atualmente só existem três delas.
Trinta anos após, apesar de incentivado por seguidores,
Nicolau Copérnico prefere se calar e surge a tese de que tem medo da
Igreja, pois até de Roma, onde chegara cópias do Commentariolus,
ele recebeu uma carta incentivando-o a expor suas idéias. Copérnico teme
a reação dos astrônomos da época, pois a noção de que a Terra está
imóvel e no centro do Universo era fortíssima na época. Temia ter sua
figura ridicularizada, pois até Lutero referiu-lhes com desprezo ao
comentar sobre "esse novo astrólogo que deseja provar que a Terra
gira".
Foi um jovem gênio, prodígio, chamando Rheticus, que tendo
conhecido o trabalho de Copérnico resolveu manter contato, prevendo um
encontro de algumas semanas. Seu entusiasmo foi tamanho que este período
foi estendido para dois anos, no qual o incentivou a ponto de conseguir
convencê-lo a publicar. Não foi uma tarefa fácil. Arriscando-se,
Rheticus consegue colocar nas mãos de Copérnico, em seu leito de morte o
livro publicado e intitulado De revolutionimbus orbium coelestium
(Das Revoluções dos Orbes Celestes).
Esta obra se tornaria o sustentáculo de outros gênios da
astronomia, como Galileu Galilei e Isaac Newton, que produziram
trabalhos gigantescos.
*
Márcio Rodrigues Mendes é físico, astrônomo
amador e professor em Dois Córregos-SP. É consultor em astronomia e
astronáutica para os portais
Via Fanzine e
UFOVIA.
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Imagens:
- Wikipedia, e dos
sites:
http://zdjecia.astronomia.pl/wiadomosci/kkgp/kkgp.jpg
http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/7/7d/Katedra_we_Fromborku.jpg
http://www.library.usyd.edu.au/libraries/rare/modernity/images/copernicus1-1.jpg
http://www.library.usyd.edu.au/libraries/rare/modernity/images/copernicus2-1.jpg
- Colaborou: J.
Ildefonso P. de Souza (SP).
- Leia outros artigos
de Márcio R. Mendes:
www.viafanzine.jor.br/mmendes.htm
-
Produção:
Pepe Chaves.
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