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ESPECIAL:
Natal & Ano Novo na Rússia
Passado e presente: Tradições do Natal e Ano Novo na Rússia: história e atualidade Nos países onde o inverno é quente, ou simplesmente não existe, o Natal e o Ano Novo não são exatamente os mesmos que num país onde o inverno dura cinco meses. Aqui, as relações entre o inverno e a gente, mesmo que não de todo “quentes”, são bastante amigáveis. Além disso, muitas vezes pode se ouvir expressões russas bem antropomórficas em relação ao inverno, que no idioma russo é do gênero feminino: mátushka zimá (матушка зима — “a mãezinha invernal”) e zimá-krasávitsa (зима-красавица — “a bela invernal”). Um detalhe característico: é difícil encontrar terminologia correspondente para a diversidade de palavras russas referentes ao inverno, frio e geada em outras línguas, cujos falantes praticamente não têm contato com tais fenômenos naturais.
Por Natália P. Dyakonova* De Moscou/Rússia Para Via Fanzine 21/12/2012
Dyed Moróz na troika de cavalos.
Festa da Natividade do Sol dos antigos eslavos
Os nossos distantes ancestrais eslavos como também outros povos europeus, eram pagãos, tiveram um grande panteão de deuses e divindades, sendo um dos principais, o Sol, que dá vida a tudo na terra. Eles seguiram de perto o movimento deste astro no céu, e entre as mais importantes festividades eram os dias de solstícios de verão e inverno.
No inverno, em nossas latitudes o sol no meio-dia sobe cada vez mais baixo acima do horizonte, os dias estão cada vez mais curtos e mais frios e, finalmente, chega o momento em que o sol é quase invisível (22 de dezembro), chegando a “morrer” visivelmente. E, em três dias mais escuros e curtos, ele aparece novamente no horizonte, começa a se mover na direção oposta, para, com cada dia, subir cada vez mais alto. Ou seja, neste momento dá-se a mudança radical do inverno e o tempo vira para o verão. Os eslavos no seu calendário chamavam isso de solntzevorót (солнцеворот — “viragem do sol”). No solstício de verão, tudo acontece exatamente ao contrário. O dia 25 de dezembro era a festa de natividade do novo sol, ou, de fato, o Ano Novo astronômico.
Esse tempo era precisamente o mais escuro e frio. Surgiu um provérbio do povo, dizendo que “o sol gira para o verão e o inverno, para o frio”, pois após essa data ainda temos dois meses invernais muito frios, janeiro e fevereiro. Na espera de aparecimento do sol, a gente tentava ajudá-lo, andando pela aldeia com a sua imagem em uma vara longa, cantando canções que chamavam o astro de volta, acendendo fogueiras em todas as partes, tocando sinetas para dispersar a escuridão.
A juventude rural usava máscaras, representando os espíritos bons e maus. Os jovens andavam pelas casas vizinhas, cantando canções especiais sob as janelas, e os donos das casas lhes davam comida de presente. Acreditava-se que, isso, recompensava os espíritos dos seus antepassados por cuidar da sua geração, da cria do gado e do bom tempo, assim como aplacavam os espíritos do inverno e do frio. Essa festividade foi chamada de kolyadky (колядки), porque a divindade do sol novo e jovem dos eslavos foi Kolyadá, e os dias feriados do 25 dezembro até o 6 janeiro eram dedicados a ele.
Posteriormente, com o advento de cristianismo, esses dias de um calendário natural foram adaptados pela igreja cristã para o Natal. Mas o hábito de cantar as kolyadkas e celebrar à moda antiga se preservou, e até mesmo 700 anos após a cristianização, em 1688, o Patriarca (supremo hierarca da Igreja Ortodoxa) teve de emitir uma proibição sobre a adoração de Kolyadá. Não obstante, a tradição ficou, embora começasse a adicionar imagens cristãs aos símbolos do sol (para evitar as punições).
A contagem do ano novo na Rus (nome antigo da Rússia) naquele tempo começava segundo o calendário da natureza, em 1º de março, quando terminava o inverno e a natureza começava a despertar. Nestes dias, os eslavos celebravam essa festividade com a queima do espantalho de inverno, danças, louvor e apaziguamento dos deuses pagãos, a cozedura dos bliny (блины — panquecas russas), que eram o símbolo do sol. Deste modo, a gente pedia uma primavera boa e um verão abundante.
Natal e Ano Novo na Rússia czarista
Em 988 veio para a Rússia, a partir de Bizâncio, o cristianismo, encontrando a resistência interna do povo ainda por um tempo muito longo. Em 1492, por ordem do Grão Príncipe Ivan III Vasílyevitch (casado com Sofia Paleólogo, sobrinha do último imperador bizantino), começaram a contar o ano novo a partir de 1º de setembro, segundo a tradição bizantina. Não restaram muitas das antigas tradições russas de celebrar o início do ano, enraizadas no paganismo, apenas os mascarados e as kolyadkas, ou canções. A festividade começou a se celebrar à semelhança da estabelecida por Constantino, o Grande, em Bizâncio. O clero realizava cerimônias cristãs, rezando pela saúde do Czar e seus súditos. Neste dia, era necessário pagar os diversos obróks (оброки — tributos em dinheiro ou em produtos) às tesourarias do soberano e da igreja. Em uma cerimônia solene nas câmaras de Kremlin, o czar recebia assim os boiardos, como gente comum, que vinha para pedir misericórdia e justiça. À noite, havia celebrações em massa, festas e torneios. Continuou assim por dois séculos, até 1699.
A noite de 31 dezembro a 1º de janeiro, passou a ser a de Ano Novo, graças a Pedro I, o Grande. Como se sabe, este czar, que foi educado pelos professores europeus e viajou muito pela Europa, se esforçava muito por trazer ao Estado russo o espírito e as tradições do Ocidente, mas quase sempre, tais reformas eram muito dolorosas e encontravam oposição no povo.
Em 31 de agosto de 1699 (véspera do Ano Novo, em 1º de setembro) os mensageiros levaram por todo o país o real decreto, mandando “não acender as luzes à noite, não celebrar o ano novo”. A gente russa ficou muito intrigada com isso: o que mais inventou o czar-reformador? Mas só para o inverno tudo se esclareceu. Em 31 de dezembro, Pedro I mandara decorar as casas com ramos de abeto, divertindo-se, felicitando uns aos outros na ocasião da festividade, disparando os canhões, acendendo fogueiras e fogos de artifício e assim, celebrando desse modo o início do ano novo em 1º de janeiro. Celebrações em massa, diversões invernais, festins, danças em roda e mascaradas se tornaram então ingredientes necessários para a festa do Ano Novo.
Após a morte de Pedro, o Grande, algumas das suas inovações forçadas chegaram a se esquecer. Em particular, o povo parou de decorar por muito tempo as casas com ramos de coníferas para a festa de Ano Novo. Apenas poucos proprietários de tabernas deixaram as decorações assim.
Sob o reinado de Catarina, a Grande, que era considerada a continuadora de todos empreendimentos de Pedro I, muitas das tradições foram revividas, incluindo o simbolismo de abeto como uma árvore perenifólia do Ano Novo. Decoraram-na com pão de mel, nozes e doces.
As celebrações de Natal e Ano Novo passaram a ser realizadas amplamente: havia mesas abundantemente servidas, passeios do alto das montanhas geladas, competições em tróicas de cavalos, etc.
Com o tempo, apareceram também cartões postais sobre o tema do Natal e o Ano Novo. Na Rússia pré-revolucionária, os russos gostavam de desenhá-los ou pintá-los no estilo folk patriarcal, onde o principal motivo eram as crianças de diferentes classes sociais, uma família feliz; ou no estilo ocidental, com anjos, sacos de dinheiro, folhinhas de trevo.
Ano Novo na URSS
Isto continuou até que, em 1917, ocorreram na Rússia os eventos revolucionários. A idéia principal dos revolucionários bolcheviques era destruir o velho mundo de violência e sobre suas ruínas, construir um novo mundo de igualdade e justiça.
Em meados dos anos de 1930, os ideólogos mudaram de tática e começaram a tratar a árvore decorada como um atributo do Ano Novo e não do Natal. O momento do triunfo para a árvore natalina chegou a ser o ano de 1935, quando, pela iniciativa do membro do Presidium do Comitê Executivo Central da URSS P. Postyshev foi organizada em Kharkov a matinê do Ano Novo para as crianças. Após 11 meses, a Secretaria do Conselho Central dos Sindicatos Soviéticos determinou: “Desde que a celebração do Ano Novo se tornou um feriado nacional, e é celebrado pelos trabalhadores, há que se legitimar esse feriado”.
Quando, em outubro de 1937 Kaganovich perguntou à Stalin: “Onde vamos colocar a principal árvore de Ano Novo?”, ao que respondeu: “Todas as nossas árvores de Ano Novo são as principais”. Estas palavras foram entendidas literalmente e consideradas como uma ordem. Dos paraquedistas das esquadrilhas de agitação, prontamente, começaram a se formar grupos caracterizados de Dyed Moróz, o Papai Noel russo, para atirar presentes de Ano Novo nas partes mais inacessíveis do país. Esta ação, segundo os seus organizadores, fazia uma clara propaganda às possibilidades da aviação soviética e dos paraquedistas ali transportados. Para outras populações, saíram na véspera do ano 1938, os trens e automóveis de agitação e propaganda, os trenós a hélice, saíram voando os aviões civis e partiram os esquiadores e até os mensageiros especiais em trenós puxados por renas.
Cartão postal soviético.
O Ano Novo começou a ser celebrado amplamente e de uma forma pomposa. Em Moscou, no Parque Gorky e na praça Manézhnaya foram instaladas duas maiores árvores de Ano Novo. A estrela de Belém foi substituída pela estrela vermelha de cinco pontas ou simplesmente por uma forma pontiaguda, semelhante a um pingente de gelo.
No primeiro dia de janeiro, na Casa das Uniões (antiga assembléia da nobreza), se deu um baile de carnaval para os melhores alunos das escolas. É aqui onde remonta a tradição de montar festas especiais de Ano Novo para crianças naquela bonita sede. Lá, os milagres estavam aguardando desde o primeiro passo. No topo das escadas, dispostas em forma de um monte de fadas, se encontrava o avião de estrelas vermelhas.
Naquela época, o povo inteiro acompanhou de perto a conquista do Ártico e os nomes dos pilotos polares eram conhecidos de todas as crianças soviéticas. A Sala do Ártico, especialmente equipada na Casa das Uniões para o tempo dos espetáculos do Ano Novo, estava sempre cheia de gente. A amostra mais atraente era um grande modelo do quebra-gelo em processo da construção. No entanto, as crianças mesmo, não se entediam nas outras salas: numa delas olhavam para os animais selvagens trazidos de um zoológico, na outra, encontravam-se os heróis dos contos de fadas e personagens populares dos livros infantis soviéticos, na terceira, atrações para todos os gostos estavam à espera. Mas o centro da festa era uma bela árvore, brilhando nos raios dos holofotes com 10 mil decorações, incluindo o simbolismo socialista e o dos operários e camponeses.
Mas não permitiam ao povo relaxar e festejar demasiado: o 1º de janeiro manteve-se um dia de trabalho. Apenas em 23 de dezembro de 1947, por decreto do Presidium do Soviete Supremo da URSS, o 1º de janeiro foi declarado “feriado e um dia de folga”. Após a morte de Stalin, em 1953, as festas com árvores de Ano Novo começaram a se realizar na magnífica Sala de São Jorge do Grão Palácio do Kremlin. Recebiam convites para lá os destacados em especial, melhores alunos das escolas, filhos de herois falecidos.
Festa de árvore de Ano Novo no Kremlin, década de 1950.
A temática das festas de Ano Novo no Kremlin e na Casa das Uniões foram escritas pelos melhores escritores infantis, e os papeis principais nesses espetáculos coloridos eram interpretados pelos artistas mais famosos.
Festa de árvore de Ano Novo na Casa das Uniões, 1977.
Durante as férias de inverno, todos os alunos soviéticos assistiam às matinês festivas e recebiam um pacote obrigatório de doces.
Das memórias pessoais da minha infância: os meus pais sempre adornavam a árvore de Ano Novo tarde da noite, quando meu irmão e eu dormíamos, para que na manhã nos esperasse uma surpresa agradável. Além de brinquedos, sempre havia na árvore de Ano Novo um monte de doces, pães de mel, pequenas maçãs rosadas, tangerinas e nozes em papel dourado e prateado (assim era a tradição ainda nos tempos de Catarina, a Grande). As mesmas iguarias podiam ser encontradas também sobre a mesa festiva, mas aquelas da árvore pareciam especialmente saborosas.
Os cartões de Ano Novo da era soviética, em contraste com a anterior, tiveram uma variedade de temas muito maior. Em primeiro plano, estava tudo aquilo, do que viveu o país: criação, ciência, esportes, cosmos e, até mesmo, cenas da Segunda Guerra Mundial. Mas, claro, havia muitos temas de contos de fadas, como também envolvendo crianças.
As duas imagens acima são cartões postais do período da Segunda Guerra Mundial, “1942” está escrito no projétil de artilharia, que irá abater os fascistas; e a menina põe na caixa de correio a carta com o endereço “ao Papa na frente”.
Nem o cinema deixou de fora o tema de Ano Novo, em 1956, foi lançada a comédia musical “A Noite de Carnaval”, ainda querida do nosso público.
Assim, a partir de 1917, até a atualidade, para a maioria dos cidadãos russos a principal festa da temporada invernal é a do Ano Novo, e não a do Natal, que é celebrado apenas pelos cristãos ortodoxos (de acordo com as estatísticas, no ano de 2011, esta festividade foi celebrada por 2,6 milhões de pessoas, dentre uma população de 143 milhões de russos).
Personagens do Ano Novo russo
Nos países ocidentais, o personagem principal do Natal é o Papai Noel. O seu protótipo foi São Nicolau, que consistia em uma pessoa real, Arcebispo de Myra, famoso por suas obras de caridade, adquirindo traços de um caráter fantástico. Segundo narra a lenda, ele atirava bolsas com dinheiro para os pobres através da chaminé, que caíam dentro dos sapatos que estavam secando perto da lareira. Imigrantes da Europa levaram essas histórias para os Estados Unidos, onde, em 1822, surgiu um poema do professor de literatura Clement Clarke Moore que, dedicado aos seus próprios filhos. O poema era sobre São Nicolau, que aparece na noite da véspera do Natal, quando até os ratos dormem, e desceu pela chaminé com um saco cheio de presentes para as crianças.
Dentro de um casaco de peles, com uma longa barba branca e um nariz vermelho, ele dirige um trenó com oito cervos, e a sua aproximação pode ser reconhecida pelo ranger dos patins do trenó e o toque das sinetas. Esse poema foi divulgado rapidamente e se tornou popular, fato que chegou a ofender o professor, já ele era de comportamento sério e avesso à diversão para a qual evoluiu a celebração do Natal.
Os personagens principais do Ano Novo russo
Em um país onde a partir do início de novembro, até os finais de março, a neve cobre tudo e o frio reina, é claro que não poderia deixar de aparecer um caráter mitológico ou dos contos de fadas, que dirigisse e governasse tudo isso. E, de fato, apareceu. Agora, seu nome é Dyed Moróz (Дед Мороз — “O Avô Frio”), mas ele teve alguns antepassados.
Entre os povos eslavos orientais (russos, ucranianos, bielorussos) têm sido muito popular a imagem do conto de fadas de Moróz, o “Frio”, um herói e ferreiro mágico, que liga a água e a terra com “frios de ferro”. O próprio Moróz é frequentemente identificado com os violentos ventos do inverno. Existem vários contos populares, onde Moróz, na imagem do Vento do Norte, ajuda aos viajantes que se perderam, mostrando-lhes o caminho. Os eslavos orientais tinham o ritual de “alimentação de Moróz” para o solstício de inverno, ou seja, nas mesmas datas, que mais tarde tornaram-se o Natal. Para cumprir com esse ritual, o membro mais velho da cada família devia sair para a soleira da casa ou inclinar-se para fora da janela, ofertando ao Moróz uma colher de kisel (кисель — antigo prato russo, espécie de geléia de frutas e fécula), dizendo, “Moróz! Moróz! Vem a comer o kisel. Moróz! Moróz! Não firas a nossa aveia!”, e logo seguia a enumeração das plantas e gramíneas que o Moróz não devia castigar.
Eis aqui alguns dos outros ancestrais do moderno Dyed Moróz russo.
Dyed Moróz Treskún (Дед Мороз-Трескун — “O Avô Frio de Rachar”), o dono do tempo, inverno e geadas. O nome Трескун (Treskún) vem do verbo трещать (“rachar”, “estalar”), pois, com as fortes geadas, as árvores ficam crepitando. Imaginavam-no como um velhinho pequeno da longa barba e um temperamento severo, como os frios russos. De novembro a março, o Dyed Treskún era senhor absoluto da terra. Até o sol tinha medo dele! Era casado com uma senhora muito raivosa, a Zimá (Зима — “Inverno”).
O Dyed Treskún era identificado também como o janeiro, primeiro mês do ano e o meado do inverno. Frio e gelado é o primeiro mês do ano, o czar dos frios, é a raiz do inverno e seu soberano. É rigoroso, gelado, tempo de nevascas e tempestades de neve.
Dyed Moróz Treskún
Pózvizd (Позвизд) — deus eslavo das tempestades e mau tempo. Ele só tinha que sacudir a cabeça para que se derrubasse sobre o chão o farto granizo. Em vez da capa, se arrastavam por detrás dele, os ventos, e da aba das suas roupas caiam flocos de neve. Pózvizd percorria rapidamente os céus, acompanhado por uma comitiva de tempestades e furacões.
Zímnik (Зимник — “O Hibernal”) — igualmente a Moróz-Treskún, era representado como um velho de pequena estatura, com cabelos brancos e uma longa barba cinza, com a cabeça descoberta, em quentes roupas brancas e com uma clava de ferro na mão. Por onde ele passasse, havia de se esperar um frio do cão.
Entre as divindades eslavas se destacou pela sua ferocidade o Karachún (Карачун) — um espírito do mal, que reduz a vida. Os eslavos antigos acreditavam que ele era um deus subterrâneo, que comandava os frios.
Karachún
Os traços destas divindades eslavas de invernos e frios eventualmente se fundiram em uma única imagem de Dyed Moróz — o majestoso soberano do Inverno, senhor dos frios, um mago. Ele mora na casa de gelo no país frio do sono eterno, aonde se pode chegar através de um poço (mesmo em calor extremo, a água no poço permanece gelada). O Dyed Moróz nos contos russos é retratado como exigente, caprichoso, rigoroso, mas justo... No conto “Morózko”, por exemplo, ele provou com o frio à resistência e deferência a uma moça muito trabalhadora, enviada para a floresta invernal pela sua madrasta má, mas depois, vendo a boa natureza da jovem, Moróz fez-lhe generosas doações; congelando depois, até a morte, à filha má e preguiçosa da madrasta.
Além dos contos populares, a imagem de Moróz, o velho severo, é refletida também da literatura russa, como a peça “Snegúrochka” por Alexander Ostrovsky, o poema “Moróz, Nariz Vermelho”, por Nekrasov, o poema “Ao Czar do Pólo Norte”, por Bryúsov, entre outros. Hoje, o nome de Dyed Moróz é preservado por diversos povos eslavos: naquelas regiões, seu nome é Dyado Koleda na Bulgária, Dyeda Mraz na Sérvia, Montenegro e Bósnia-Herzegovina e Dedek Mraz na Eslovénia.
Dyed Moróz
Dyed Moróz foi representado (e é representado até agora) como um velho de cabelos grisalhos, com uma barba que chega até o chão; vestindo um longo casaco grosso (vermelho, azul e branco), gorro bordado com pérolas, botas ou válenqui (валенки — botas de feltro em cano alto, quem mantém o calor em qualquer frio), luvas bordadas com prata, e com o cajado (com a ponta prata ou uma estrela de gelo na parte superior), com o qual ele congelava as pessoas, se fossem más ou quem não lhe agradava. Comparemos a jaqueta leve, calças curtas e barrete do Papai Noel, seu cajado curvo, lembra o cajado bispal de São Nicolau. Debaixo de casaco de peles, Dyed Moróz geralmente tem uma camisa e calças de linho, bordadas com padrões geométricos. O seu cinto é branco, com enfeites vermelhos — símbolo de ligação entre os antepassados e descendentes. Como um ser sobrenatural, Dyed Moróz não pode sofrer, por exemplo, dos defeitos de vista, deste modo, é completamente impossível imaginar os óculos sobre o seu rosto, como no caso do Papai Noel, demonstrando que este é um detalhe puramente humano.
Ele se traslada a pé, gosta de contornar as suas posses e restaurar a ordem, tocando tudo com seu báculo mágico, ou em uma rápida tróica de cavalos com sinetas.
Dyed Moróz entra na casa pela porta da frente, não pela chaminé, como o Papai Noel, pois, segundo as representações russas, assim entram apenas os espíritos impuros. Por exemplo, na “Noite antes do Natal”, uma história mágica por Nikolay V. Gogol, um escritor clássico da literatura russa, o diabo entra na casa através do tubo do forno. Dyed Moróz coloca os presentes sob a árvore de Ano Novo, e não nas meias.
Com o tempo, a imagem de Dyed Moróz se suavizou, especialmente com o advento de sua neta, a Snegúrochka.
Snegúrochka (Снегурочка — “Donzela de Neve” ou “Nevezinha”) também é um personagem do folclore russo. Trata-se de uma moça ou uma menina, que foi esculpida da neve e animada. Seu nome vem da palavra снег, “neve”, mas não tem absolutamente nada a ver com a Branca de Neve. Ela é doce e amável, todos ao seu redor a amam. A imagem de Snegúrochka é única, esse é um personagem puramente russo. Na tradição ocidental do Ano Novo e Natal não existem imagens femininas. Só recentemente ao lado do Papai Noel apareceu a Sra. Mamãe Noel. À parte dos contos de fadas russos, a Donzela de Neve está presente na literatura, música e pintura russas. O famoso compositor russo Rimsky-Korsakov escreveu a bela ópera “Snegúrochka”, baseada na peça do dramaturgo russo Alexander Ostrovsky; e nem artistas famosos deixaram de lado essa imagem.
Snegúrochka
Mas, a imagem da Snegúrochka na celebração do Ano Novo começou a ser usada de maneira mais ativa, precisamente, na era soviética.
Dyed Moróz é querido do povo russo e a recíproca é verdadeira. Assim, durante as invasões de Napoleão e Hitler na Rússia desencadearam-se frios de uma força sem precedentes, o que ajudou a lidar com os inimigos, que até chegaram a dizer que eles foram vencidos pelo “General Frio”.
Para os modernos Dyed Moróz e Snegúrochka foi construída uma residência na cidade de Veliky Ústyug, em forma de um enorme térem (терем — casa de madeira em forma da torre no antigo estilo russo). Mas este é apenas, por assim dizer, um centro de negócios, que não tem nada em comum com as antigas tradições eslavas.
O Ano Novo na Rússia é considerado uma festa familiar, e acredita-se que é necessário festejá-lo em círculo da família e das pessoas mais próximas. Portanto, todos procuram voltar à casa para o Ano Novo e celebrá-lo em família.
Antes do Ano Novo acostuma-se fazer a limpeza da casa e livrar-se de tudo que é velho. É recomendável pagar todas as dívidas, para não arrastá-las ao novo ano.
No círculo familiar, geralmente se reúnem para uma mesa servida com abundância, com as melhores roupas, pois, segundo diz o provérbio popular, “Do jeito que celebrar o ano novo, assim o passarás”. Um ítem obrigatório da mesa do Ano Novo são as iguarias variadas: caviar, balýk (балык — lombo de esturjão salgado e secado em charque), salada russa, arenque, tangerinas e champanhe, e o restante fica a critério da dona de casa.
Às 23:50 do dia 31 de dezembro, aparece na tevê o líder do país, com cumprimentos e desejos de um feliz Ano Novo para o povo. Logo em seguida, soam as 12 badaladas poderosas do relógio na Torre Spásskaya, do Kremlin.
Ao som das badaladas pelo carrilhão do Kremlin, em todas as casas o champanhe é aberto, as pessoas felicitam umas às outras e, naquele instante, pensam o maior número possível de desejos, pois acredita-se que eles irão se cumprir.
Algumas famílias têm a tradição de fazer pasteis de Ano Novo, entre os quais há três com surprêsas: no primeiro, coloca-se uma moeda, o outro é salgado, e o terceiro, doce. Já à mesa de Ano Novo, ao som das badaladas do carrilhão, a pessoa deve escolher um pastel, entre o monte deles no prato. Aquele que obter o pastel com moeda, será rico no próximo ano, o dono do pastel salgado fica à espera de provações e o dono do pastel doce terá uma vida feliz e doce.
Nos últimos 10 a 15 anos, cada vez mais gente, na sua maioria jovem, tenta encontrar-se no momento da chegada do Ano Novo na Praça Vermelha - no caso de Moscou -, ou na praça principal da sua cidade, onde é possível celebrar com fogos de artifício e petardos.
Estão tornando-se populares as viagens aos países tropicais durante as férias de inverno, para festejar o ano novo, não mais debaixo da árvore enfeitada, mas sob uma palmeira tropical.
Curiosidades
A transição da Rússia para o calendário gregoriano em 1918 mudou as datas festivas aos 13 dias que ficaram para trás. O resultado disso foi o aparecimento da festa não-oficial com o título paradoxal de “Velho Ano Novo”. Ou seja, é celebrada de acordo com o antigo calendário juliano, na noite de 13 a 14 de janeiro, por muitas pessoas, mas apenas no seu círculo estreito, tal é o tributo à tradição. Assim, a Rússia, em alguns aspectos, é um país único, onde “o novo ano ocorre duas vezes por ano”, nas palavras de uma canção.
Outra homenagem à antiga tradição pagã, que remonta o festejo do ano novo ainda em 1º de março, manteve-se neste dia a celebração da Máslenitsa (масленица — o entrudo), ou “Despedida do Inverno Russo”, durante a qual continuam a queimar um espantalho de palha, representando o inverno, são cozidos montes de bliny (símbolo do sol), o povo se diverte, canta e organiza celebrações festivas em massa.
Pessoas profundamente religiosas não festejam o Ano Novo em 31 de dezembro. A razão é que por causa da mudança do calendário russo, o Natal não mais cai em 25 de dezembro, mas em 7 de janeiro, isto é, no jejum natalino, quando não se pode divertir, tomar álcool e etc.
A mesma atitude de desaprovação é manifestada pela Igreja Ortodoxa Russa e seus adeptos para com a imagem de Dyed Moróz: para eles, é uma divindade pagã e mágica, assim como a Snegúrochka. Um dos bispos até sugeriu que eles deveriam ser batizados ou devia se efetuar alguma outra forma da cristianização desses personagens folclóricos – o que fez muita gente achar engraçada tal proposta.
A partir do Ano Novo, os primeiros 12 dias do mês a gente fixa o tempo em cada dia. Pelos sinais, como será o tempo em cada dia no intervalo dado, assim também será o tempo no mês do ano, correspondente com o número do intervalo. Finalizando a história, desejamos aos leitores de Via Fanzine em todo o mundo, um feliz Natal e próspero Ano Novo.
* Natália P. Dyakonova é filóloga e pintora profissional, pesquisadora e historiadora por inclinação. É consultora em Cultura e História para VF em Moscou.
- Seu blog é http://protocivilizacion.blogspot.ru (Com dispositivo para tradução automática).
- Tradução do russo: Oleg I. Dyakonov - Revisão final e adaptação: Pepe Chaves
- Imagens: Imagens do folclore russo/divulgação.
- Produção: Pepe Chaves. © Copyright 2004-2012, Pepe Arte Viva Ltda.
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