Mitos oceânicos:
Monstros marinhos sustentam a mitologia
oceânica
Em suas águas existe um verdadeiro mundo
à parte, e em suas profundezas
jazem ainda assuntos, se não fantasiosos,
pelo menos desconhecidos dos homens.
Por Fabiano Mauro
Ribeiro*
Do Rio de
Janeiro-RJ
Para
Via Fanzine

Antiga ilustração
mostra uma serpente marinha devorando um homem.
Miragens oceânicas?
A divisão da natureza
em quatro elementos, fogo, terra, água e ar, recebeu a acolhida dos
filósofos estóicos. Mas beligerantes não filósofos, pós Era Industrial,
declinaram da quaternidade e, para efeito de guerra disseram, “terra,
mar e ar”. O mar entraria nessa tríade como potência auxiliar nas
conquistas.
Em suas águas existe um
verdadeiro mundo à parte, e em suas profundezas jazem ainda assuntos, se
não fantasiosos, pelo menos desconhecidos dos homens.
Aristóteles já falara
em uma serpente marinha monstruosa capaz de “se enroscar numa trireme e
destroçá-la”. O francês Gautron (“A Verdade Sobre a Grande Serpente
Marinha”, 1905), fala sobre esse e outros mitos dos mares, mostrando
que essas histórias cresceram a partir do século XVI ao XVIII. Talvez,
as causas seriam o fortalecimento e a evolução da navegação. O século
XIX, segundo Bernard Henelmens (“Le Grand Serpent de Mer”) marca o
aumento efetivo das aparições. Contam-se algo em torno de 300 vezes. No
século XX até 1980, quando Robert de La Croix, fez pesquisas
significativas, mais de 200 notícias foram catalogadas. Pode ser
comparado ao fenômeno dos avistamentos de OVNIs.
Há relatos de cobras
gigantescas da cor de chumbo, surgindo sempre entre os mares do
Atlântico e Pacífico. A coloração pode variar do chumbo ao negro, do
negro ao amarelo – já se falou do branco ou de um rajado de vermelho.
Alguns as classificam como verdadeiros demônios, bizarros assustadores,
mas via de regre, não agressivos. Tripulações surpreendidas usam, por
isso, orações de exorcismo.
Canhoneiras e o
Leviatã
Num dia cinzento de
1896, a Canhoneira Avalanche, tenta na Baía de Along, perseguir uma
suposta dupla de monstros marinhos. O evento gera relatório com
testemunhas, mas falou-se que tudo teria sido arquivado, como prova de
uma reação armada contra o fantástico. Ocorre, porém que a mesma
canhoneira, um ano depois comandada por Agresille, presencia a mesma
visão. O Comandante afirma que avistara um leviatã, mas optara por não
persegui-lo. O monstro foi descrito em detalhes como “medindo cerca de
30 metros, pele lisa e brilhante, forma arredondada, movimentos
ondulatórios na vertical”. O animal, ao final do bailado assustador,
teria soltado um jato de vapor em direção ao barco.
A velha Canhoneira
Avalanche reincide, e uma semana depois, transportava pessoas ilustres
para as Ilhas Fai-Tsi-Long, quando foi avistada a tal serpente. O fato
foi logo avisado por um marinheiro a todos os presentes. Segundo De La
Croix (“História Secreta dos Oceanos”) lavrou-se até mesmo um auto, mas
tudo foi encerrado, com medo do pânico ou do ridículo.
Igual passagem teria
presenciado a Canhoneira Decidée, que avistaria um monstro de 20
metros, “semelhante a um réptil de pele castanha rugosa”. Vista de
perto, a fera mostrava uma cabeça triangular, com olhos franzidos.
Expelia “água vaporizada em direção ao barco”.

Serpente marinha - obra do artista
plástico Roger Dean.
Mais monstros
marinhos
Em 1915 o submarino
alemão U-28 torpedeou o cargueiro inglês Iberian. Devido à explosão e
afundamento do navio, formou-se no lugar um gêiser (onda de vapor e
gases) e entre os destroços que boiavam no meio da bruma, surgiu o
grande réptil, visto por toda a tripulação do feroz U-28 que julgou
tê-lo ferido.
Em maio de 1917, homens
do cruzador Ilary, avistaram uma grande serpente, com as costumeiras
características já narradas. Houve uma tentativa - sem se saber o
resultado - de atingi-la com um tiro de obus.
Os tripulantes do
cargueiro Saint-François-Xavier, se encontravam na Costa Leste da
Austrália em 1925 e juram terem avistado um enorme réptil, cujo diâmetro
descreveram como igual ao de “grandes barricas bordalezas”. Houve choro
e orações no navio. O monstro mergulharia, para aparecer depois bem
nítido com seu corpo de mais de 15 metros e formado por vários anéis.
Outras visões desse
tipo vão sendo observadas no decorrer do século XX. Os responsáveis pela
condução do paquete Santa Clara já em 1947, a caminho das Antilhas,
teriam se defrontado com uma gigantesca serpente. Ela teria se erguido
em frente à embarcação – porém o navio abalroou o corpo imenso, que
desapareceria, deixando um rastro de sangue.
As características das
visões são repetidas – animais com as mesmas semelhanças e feições.
Contudo, é pitoresco e intrigante notar que há sempre a afirmação dos
visionários de que tais seres são de bom humor e estariam prontos a
fugir, ante à menor reação.
Uma nota que merece um
recuo de data consta de registros históricos, em 8 de julho de 1876,
teria ocorrido em terras brasileiras. Naquela data, tripulantes da
brigue Pauline, no Cabo de São Roque, teriam assistido por longo tempo
uma luta entre uma serpente marinha e um cachalote, sendo que esse
último terminou por ser torturado pela antagonista “que possuía grossos
anéis” (também pesquisado por Robert de La Croix).
A fraude de Le
Serret
Como em toda literatura
de mistérios ou supostos mistérios, existe a fraude notória, até com
pitada de certo humor. O autor mencionado, que aprofundou com esmero os
socavões dessas fábulas, narra que o francês R. Le Serret, que
compararíamos a um Amyr Klink às avessas, apareceu com uma eletrizante
história, já na era da fotografia e do cinema, na década de 1930.
Le Serret alardeou que
se tornara náufrago em seu périplo em torno da Grande Barreira de
Adelbran. Náufrago privilegiado, conseguiu sobreviver com uma filmadora.
Uma vez alcançada uma pequena ilha, Le Serret, às tantas da noite, teria
avistado uma serpente de grande porte, com dois olhos saltados numa
cabeça oblonga. Com a filmadora, ali estaria a prova a que a ciência
daria boas vindas, e o francês a filmou.
No seu retorno à França
houve grande ansiedade – a imprensa fervilhava em torno dele, embora
peritos sempre se mantivessem no silêncio do ceticismo. O francês
revelou o filme, mas o que se viu foi algo risível: um biólogo
identificou a filmagem (feita a curta distância) de um animal conhecido
como “bicho de sete cabeças”. O mesmo é encontrado nos costões daquela
região.
Mito que atravessa
séculos
Toda a trajetória do
mito das serpentes marinhas se assemelha no seu mecanismo, ao de outros
conhecidos, com, o do Yeti (O Abominável Homem das Neves), para se citar
somente um exemplo. Até o presente não se conseguiu um cadáver de
serpente, o que leva a maioria dos observadores a optar pela hipótese de
fenômenos alucinatórios.
Como todos os mitos, o
das serpentes marinhas, precisa existir na mente da gente do mar. É
preciso haver hora e local certo para visões e, contra elas, como tudo
que é mitológico, jamais haverá uma prova científica.
Bernard Henelmens opina
em sua acurada obra que, finalmente, a lenda surgiu pouco a pouco da
observação fugaz de toda uma série de animais marinhos de grande porte.
A sensatez e a análise
fria matam os sonhos e afugentam assombrações.
*Fabiano Mauro Ribeiro é pesquisador de historia e arte, e colaborador
de
Via Fanzine.
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Imagens:
Gravura Século XVIII, do livro de Robert de La Croix - Historia Secreta
dos Oceanos - Ed e Livraria Bertrand. Lisboa 1978:
Ilustração de Roger Dean.
- Produção: pepe
Chaves.
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