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 Isaac Bigio

 

* O professor Isaac Bigio é analista internacional em Londres.

Lecionou política latino-americana na London School of Economics,

é autor de artigos veiculados em comunidades latinas de todo o mundo.

Seus artigos exclusivos são publicados em português por Via Fanzine.

ACESSE O ARQUIVO BIGIO 2012

 

Leia também outros textos de Bigio:

www.viafanzine.jor.br/mundo_politico.htm

 

 

 

Europa e Plutão

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

30/12/2011

 

Europa é tanto a denominação de uma região terrestre como de um mundo onde existe mais possibilidades de encontrar o desenvolvimento da vida em nosso sistema solar. No entanto, é um erro considerar a Europa terrestre como um continente e o astro Plutão como um planeta.

 

Europa é uma lua de Saturno, coberta por inúmeros quilômetros de gelo, mas cujo oceano interno (que contém mais água que todos os nossos mares juntos), devido à pressão gravitacional do planeta, propicia aquecimento suficiente para albergar flora ou fauna extraterrestres.

 

Por outro lado, na Terra, o fato de o território da Europa estar junto à Ásia e África e figurar como um dos três primeiros continentes a serem catalogados como tal, não implica que devemos continuar considerado-o como tal.

 

Segundo as ciências astronômicas há dois mundos que foram elevados à categoria de planetas para depois serem desclassificados. Um deles foi Ceres, o primeiro asteróide descoberto, e outro é Plutão, a primeira grande esfera transnetuniana descoberta.

 

A desclassificação de Plutão ainda gera protestos, particularmente, na megapotência americana, pois este seria o único ‘planeta’ descoberto nos EUA, onde o seu nome foi também dedicado ao cão do Mickey Mouse.

 

No entanto, para a ciência foi vital ter uma definição precisa. Ceres, Plutão e os novos mundos que são encontrados nos rincões do nosso sistema solar poderão ser considerados ‘planetas anões’, pelo fato de serem esféricos e girarem em torno do sol, mas carecem de uma órbita própria e planejada, como às dos atuais oito planetas conhecidos.

 

Hoje não só as ciências geográficas, mas também as históricas e sociais precisam deixar de ver a Europa como um continente e, ainda, como o crisol global.

 

Na verdade, só deveria haver seis continentes catalogados como grandes extensões de terra rodeadas de águas (e ilhas): América do Sul, América do Norte, Antártica, África, Austrália e Ásia (composta por várias regiões: desde o extremo ocidental europeu até o extremo oriental chinês-nipônico).

 

A desclassificação de Plutão não eliminou o interesse da ciência por este astro, mas lançou sobre ele um novo olhar. Fazer com que a Europa volte a ser vista como uma península asiática ajudaria a compreender melhor a sua atual crise e o seu futuro num contexto onde irrompe também a China, Índia e Rússia.

 

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A vez de Kim III

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

27/12/2011

 

A Coreia do Norte é a única república do mundo onde o poder vitalício é passado de pai a filho. Seu sistema combina monarquismo com uma economia e um partido único stalinista.

 

Stalin impôs o culto à personalidade no socialismo, mas nem ele nem futuros chefes de revoluções ‘comunistas’ (Mao na China, Tito na Iugoslávia, Hoxha na Albânia ou Ho no Vietnã) deixaram o cargo aos seus filhos.

 

Fidel Castro retirou-se por motivos de saúde do comando central de Cuba, observando que seu irmão Raúl encabeçou o comando do país, mas quem deverá substituí-lo pode não ser daquela família.

 

Kim Il-Sung, pai do falecido estadista, liderou a Coreia do Norte durante meio século. Depois de comandar o bando militar que ocupava aquela região em meados da década de 1940, ele passou a ser o todo poderoso premiê e depois presidente da República Democrática Popular da Coréia, desde sua criação, em 1948, até sua morte em 1994.

 

Depois seu filho Kim Jong-il, que o substituiu, permaneceu durante 17 anos no poder absoluto, ainda que não ocupou o cargo de presidente, pois a constituição nortecoreana  afirma que o finado fundador da pátria, Kim Il-sung, será o seu ‘presidente eterno’.

 

Kim Jong-il teve uma esposa Kim Young-sook - escolhida por seu pai, tal como se passa em diversas cortes - com quem teve a sua primeira filha em 1974 (Kim Sul-song).

 

Apesar de ela a ser a única filha de um casal e ser uma leal e eficiente primogênita, talvez, por ser mulher, está em inferior condição ao restante de seus três irmãos mais novos filhos de seu pai com duas de suas três posteriores concubinas.

 

O segundo filho de Kim Jong-il é King Jong-nam, o único que teve com sua primeira amante, Song Hye-rim. Ele perdeu o direito à herança quando foi preso no Japão ao entrar no país com um passaporte dominicano falso para se divertir na Disneylândia nipônica.

 

Depois disso, a imprensa oficial saiu elogiando a segunda amante do líder supremo, Ko Young-hee, ainda que ele não optou por indicar como seu sucessor o primeiro filho que teve com ela (Kim Jong-chun) - a quem supostamente descrevia como uma ‘pequena menina’ -, mas ao que viria em seguida, Kim Jong-um.

 

Apesar de ter menos de 30 anos, Kim Jong-um foi condecorado como general de quatro estrelas e, aparentemente ganhou respeitabilidade nas Forças Armadas após dirigir um grupamento num bosque sulcoreano, em março 2010.

 

O novo líder supremo Kim Jong-um tem apenas 28 anos e recebeu pouca preparação para ocupar o cargo máximo do país, por isso, especula-se que Chang Sung Taek, esposo da irmã caçula do finado Kim Jong-il, atuaria como o seu regente ou dirigiria o poder por detrás do trono.

 

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O declínio europeu

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

19/12/2011

 

Pelas Américas há certa dificuldade para entender a profundidade histórica do declínio da União Europeia e do euro, porque este continente se tornou o modelo ou o berço de sua civilização.

 

Desde o primeiro instante em que a América manteve contato com os espanhóis foi completamente europeizada. Dos europeus, dos escravos e imigrantes vieram os genes de 90% dos 900 milhões de americanos. Todas as línguas, religiões, ideologias e modelos adotados pelo Novo Mundo provêm daquele continente.

 

No entanto, a Europa só desempenhou um papel de liderança no mundo, somente na primeira fase em que se unificou comercialmente (entre meio milênio e meio século atrás). Até antes de os ibéricos descobrirem a rota atlântica para as Américas e os demais oceanos, a Europa se manteve atrás.

 

A maior civilização que surgiu na Iberia foi produto da invasão muçulmana africana, do século XV até inícios do XX, quando os maometanos turcos remodelaram os Bálcãs.

 

Na Antiguidade, a Europa manteve somente três impérios que transcenderam o seu continente. Um foi o macedônio de Alejandro Magno, o qual acabou desintegrado e absorvido pelas culturas mais avançadas que o conquistou (como Pérsia ou Egito). Os outros dois foram os da Roma ocidental e oriental, que sucumbiram às diferentes invasões que provinham da Ásia, de onde também chegaram numerosas outras hordas (mongóis, turcos, húngaros, búlgaros, etc.). Os europeus perderam nas cruzadas e não puderam evitar que a pátria de Jesus e a Bíblia se descristianizassem.

 

Foram os árabes que salvaram aos textos clássicos gregos do obscurantismo medieval europeu e os trouxeram ao ocidente, criando técnicas mais avançadas. Séculos antes da Europa, índios inventaram dígitos matemáticos com o zero, e os chineses, a pólvora, as pistolas, minas e canhões, a bússola e a impressão. As três caravelas de Colombo, em 1492, eram pequenas e pouco modernas em relação às centenas de navios que os chineses já tinham lançado ao mundo em 1421.

 

A invasão napoleônica, de 1807-1815, conduziu ao desmembramento dos impérios espanhol e português. Um século depois, a Primeira Guerra Mundial (1914-18) fez a Alemanha perder a posse de suas colônias. E depois da Segunda Guerra Mundial (1939-45) os impérios, britânico, francês, belga, holandês e italiano tiveram que renunciar às suas grandes dependências.

 

Em 1991, caiu o bloco soviético e com isso a última potência europeia que pudesse contrabalancear os EUA.

 

O 'boom' da China e Índia - somado à ascensão da África e América Latina - tende a desestabilizar ainda mais a antiga predominância europeia pelo mundo. O Brasil acaba de ultrapassar o Reino Unido como a sexta economia mundial. Além disso, Goldman Sachs prevê que, ainda em 2050, nenhuma das cinco maiores economias será europeia.

 

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Tiros pela culatra

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

15/12/2011

 

As intervenções militares promovidas no Oriente Médio e periferia definem o que se passou em todo o mundo no último terço do século passado. Agora, Washington tem praticado uma política de vias duplas que, por fim, acabou explodindo em suas próprias mãos.

 

No início, tanto a rede terrorista Al Qaeda, quanto o governo de Saddam Hussein, foram armados e financiados pelo Pentágono. Com isso, ambos decolaram e consolidaram seus primeiros momentos como instrumentos contra aquilo que Reagan considerava o maior inimigo: a revolução iraniana pós-1979, e o governo esquerdista afegão, apoiado por tropas soviéticas.

 

O Ocidente impulsionou a invasão iraquiana ao Irã, que culminou em cerca de um milhão de mortos entre 1980 e 1988, promovendo o resguardo do Afeganistão a milhares de fundamentalistas do mundo islâmico que ali se tornariam famosos massacrando civis e obrigando às mulheres a andar totalmente cobertas.

 

No entanto, seus dois aliados acabaram como corvos. Primeiramente, em 1991, Hussein, que não conseguiu conquistar territórios iranianos e desejava aproveitar seu enorme aparato militar, construído graças à ajuda da OTAN, se atreveu a invadir o Kuwait. Este emirado que mantinha um caráter bem mais antidemocrático que o regime dos Aiatolás, já era considerado uma das peças conquistadas pelos EUA.

 

Dez anos depois, a Al Qaeda passou a lançar operativos terroristas, não mais contra os civis ‘inimigos’ dos EUA como antes, mas dentro dessa megapotência e seus aliados.

 

Para castigar os “Frankesteins” que criou, Washington lançou duas prolongadas guerras contra o Afeganistão e no Iraque. Nessas lutas, seus dois antigos aliados - agora tornados inimigos públicos - foram depostos sobre o sangue de centenas de milhares de mortos e bilhões de dólares gastos em despesas bélicas que, por sua vez, contribuíram para gerar o atual desaprumo econômico ocidental.

 

O paradoxo nisso tudo é que, após essas intervenções ocorridas em duas repúblicas que estão localizadas ao lado do Irã, um dos grandes beneficiários foi este mesmo governo persa, o qual os EUA sempre consideraram como o seu principal inimigo na região.

 

Hoje, o Irã consegue manter partidos armados afinados entre si e co-governando no Iraque, Afeganistão e no Líbano, sob a influência da Síria e do Hamas, em Gaza.

 

Por outro lado, ao derrubarem Kadafi (que até poucos meses reconciliava-se com o Ocidente), os EUA abriram as portas para que partidos religiosos islâmicos agora sejam os mais fortes na Líbia, Tunísia e Egito, acrescentando sua influência em toda aquela região.

 

E assim, as guerras da Ásia ocidental e a recessão dos EUA são as faturas que esta megapotência deve pagar pelos seus tiros que saíram pela culatra.

 

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Aniversário matrimonial dos Windsor

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

21/11/2011

 

No domingo, 20/11, enquanto a Espanha votava e elegia o retorno do seu maior partido conservador e monarquista ao poder, sob uma votação histórica, no outro único reino do mundo com população maior e mais tradição imperial (o britânico), os seus soberanos comemoravam 64 anos de união matrimonial.

 

Naquela data, Elizabeth II e seu esposo Felipe, de 85 e 90 anos respectivamente, festejaram seu aniversário nupcial em uma cita privada no Castelo de Windsor que, além disso, na mesma data, recordava que faz 19 anos se salvou de seu pior incêndio.

 

Naquela tarde, eu estive naquele mesmo castelo milionário que tem sido a residência preferida dos monarcas britânicos e cujo nome foi adotado como próprio pela atual família regente (em vez de seu inicial sobrenome, Sachsen-Coburg und Gotha, abandonado por sua origem alemã).

 

Os turistas se maravilham com seus mais de 10 mil quadros e peças de arte (incluindo sua sofisticada casa de bonecas) ou os troféus de numerosas conquistas militares e doações (como jóias e coroas de outras monarquias, até uma inca).

 

Como historiador, o que mais me surpreende é a capacidade que tem esta instituição tão antiga para se modernizar e reinventar a si mesma, após ter se salvado de vários incêndios militares e sociais. Apesar de sua origem feudal, esta família conseguiu encabeçar a revolução industrial e hoje co-lidera as intervenções militares pró-democracia pelo mundo.

 

Quando a imprensa enaltece as derrocadas de Hussein, Mubarak ou Kadafi, poucos dizem que Elizabeth II, a mesma que celebrará as Olimpíadas de Londres em 2012, em seu 60º aniversário no trono, é a chefe de Estado não eleita do Reino Unido (a única potência ocidental em que sua câmara nunca foi eleita) e de outros 16 países, cujos territórios se encontram espalhados pelos cinco continentes e somam um sexto da superfície terrestre.

 

Muitos questionam os fundamentalistas islâmicos, mas aceitam que os Windsor herdem tanto a chefia de seus Estados como do clero oficial, o que não ocorre em nenhum dos 55 países muçulmanos.

 

As democracias ocidentais transformaram os Windsor na família mais fotografada e admirada do mundo.

 

O casamento de William e Kate, o evento mais transmitido nesse milênio, só teve como convidados mandatários de outros reinos (muitos deles autocráticos e poligâmicos).

 

Apesar de o nosso mundo ter hoje mais dirigentes eleitos que em nenhuma outra época, os Windsor vêm trabalhando para restaurar vários monarcas. Faz menos de meio século a realeza espanhola voltou ao trono, logo a camboyana substituiu os comunistas, emires e reis árabe. Agora vêm potencializando-se na suposta primavera democrática de sua região – na qual, a Líbia volta a ter oficialmente bandeira e hino do rei Idris e na Síria, querem depor o seu governo pró-ALVA.

 

O modelo pregado pelos Windsor e seguido pelas realezas espanhola e europeias combina aspectos de feudalismo e teocracia com liberalismo e democracia. Assim, garantem tradição e continuidade, propondo ordem e estabilidade, enquanto, ao mesmo tempo, permite parlamentos, pluralismo e “liberdade”.

 

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A Proclamação da República no Brasil

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

15/11/2011

 

Em 15 de novembro de 1889 foi deposta a maior dinastia americana que já existiu. Foi a dos Bragança, os arquitetos do que chegou a ser a nação mais extensa do hemisfério ocidental e também do sulista e que ainda hoje é o maior país latino e sulamericano de todos os tempos, o Brasil. Eles também são os maiores responsáveis pelo desumano tráfico de escravos africanos, cujo sangue nutre ao menos um em cada quatro latinoamericanos.

 

Os Bragança não foram uma família nativa do Novo Mundo nem uma das tradicionais da realeza europeia que reinaram desde o seu continente de origem até o restante de suas colônias espalhadas pelo mundo.

 

Também não se constituiu numa dinastia republicana, na qual o poder passa de pai a filho ou entre irmãos (como os Duvalier do Haiti ou os Somoza da Nicarágua) mediante coerção, ou aquela que, pela via constitucional ou multipartidária mais de um membro da família ocupam posições estratégicas no poder (como os Kennedy, Bush e Clinton nos EUA, os Perón e Kirchner na Argentina, os Frei no Chile etc.).

 

Os Bragança são a única realeza do Velho Mundo que acabou governando em terras do Novo Mundo. Nenhuma outra família real criou a partir de si mesma um grande império europeu, o qual conseguiu sua independência, mesmo sendo a maior colônia.

 

Bragança é a região que fica no Nordeste português divisado pela Espanha. Daquela terra surgiu uma nobreza que, em 1640, liderou a independência de seu país, Portugal, contra Madri e depois sua ramificação proclamou a soberania do Brasil com relação a Portugal, em 1822.

 

Entre 1580 e 1640, a Ibéria e suas colônias permaneceram unidas, sob a tutela dos Felipes, líderes do até então, maior império de todos os tempos. Quando os Bragança separaram Lisboa de Madri receberam também as numerosas colônias na costa Atlântica da África e do centro sulamericano, além daquelas que contornavam todo o oceano Índico, desde o leste africano, passando pela península árabe, Índia e Indonésia, até China e Japão.

 

Entre 1822 e 1889, Dom Pedro I, que também foi rapidamente rei de Portugal - seguido por seu filho Pedro II -, estabeleceu a única monarquia Bragança no Brasil, que se tornou o único império real estável latinoamericano. Em 1910, os Bragança foram os últimos reis de Portugal.

 

Ao contrário da América hispânica, fragmentada depois da independência, os Bragança mantiveram a unidade do Brasil e fizeram deste o país do hemisfério sul, o que mais territórios arrebatou de seus vizinhos.

 

Os Bragança, ademais, são responsáveis por muitas outras coisas: desde a criação da primeira língua franca da África e do oceano Índico e também por levar-lhes o chá e entregado Bombaim aos britânicos. Além disso, transportou brutalmente a maior parte dos escravos africanos ao Novo Mundo, contribuindo para que seus descendentes sejam hoje a maioria em um terço dos países americanos e significativas minorias desde os EUA até o Cone Sul.

 

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Kadafi, ETA e FARC

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

06/11/2011

 

Em 20 de outubro passado, enquanto Kadafi era executado, o grupo basco ETA anunciava o encerramento definitivo de suas ações armadas. Duas semanas depois foi abatido o chefe das FARC colombianas. Esses três acontecimentos podem remodelar o mundo a partir de agora.

 

O kadafismo, o ETA e as FARC surgiram na década de 1970 em três continentes diferentes. Eram movimentos “irmãos” que pregavam a “resistência armada anti-imperialista”. Porém, a Líbia foi se transformando numa espécie de Cuba africana e islâmica, mas patrocinando diversas insurgências e guerras.

 

Kadafi, ao contrário do ETA e as FARC - às quais apoiou-, que foram influenciados pelo marxismo guevarista, propôs uma variante da teocracia islâmica, ao recusar o leninismo e criar uma autocracia nacionalista, com menos pobreza e desigualdade entre classes e sexos naquela região.

 

Ele e sua família manejavam bilhões de euros e andavam com Sarkozy, Berlusconi ou Blair, sempre fazendo transações comerciais e auxiliando-os no combate contra Al Qaeda, Hamas, Hizbola e Irã.

 

Por enquanto não sabemos se grupos armados pró-Kadafi manterão a luta armada no país e região. Mas, certo é que sua queda (seguindo à de Hussein e antecedendo à do sírio Assad) mostra o fim do nacionalismo pan-árabe, que fomentava guerrilhas em outras partes do mundo, quais foram encerradas com o tempo, como em Cuba, China, Vietnã e Coreia do Norte.

 

Assim, pela primeira vez, desde a revolução soviética de 1917, não existe hoje nenhuma república que se proclame “socialista” e promova levantes armados em outros países. Os antigos guerrilheiros agora são presidentes ou vice-presidentes em várias partes da América Latina e aceitam a via constitucional para se chegar ao poder, a diplomacia para lidar com outras nações e o capitalismo para desenvolver suas economias.

 

As únicas duas importantes insurgências que permanecem no Ocidente são a basca e a colombiana. A primeira já decidiu trocar as armas pelas urnas, devido a três razões: o contexto internacional, a repressão estatal e o seu aliado legal, o Bildu, partido que vem se convertendo na segunda força eleitoral basca e, para seguir avançando, necessita que o ETA siga o caminho do IRA norte-irlandês.

 

Enquanto o governo britânico, que sabia como localizar e exterminar os comandantes do IRA, preferiu negociar com eles para cooptá-los ao sistema, colocando-os no novo governo de unidade nacional norte-irlandês, na Colômbia, Santos deseja matar todos os comandantes das FARC.

 

Na Líbia e na Colômbia, os EUA e seus aliados estiveram dispostos a eliminar toda a cúpula dos Kadafi e das FARC, castigando-os, por não aceitar a reintegração como derrotados dentro de suas respectivas sociedades, as quais, devem ser agora liberadas, tanto econômica como politicamente.

 

Diferentemente disso, em Euskadi e na Irlanda do Norte, os países da OTAN mostram disposição para cooptar os seus insurgentes, sob a condição de que deixem as armas e se submetam às instituições contra as quais, antes guerreavam.

 

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A importância das cúpulas iberoamericanas

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

30/10/2011

 

O Paraguai é a atual sede da 21ª AVA, cimeira anual iberoamericana, que deverá aprovar uma declaração em defesa dos migrantes.

 

São mais de 20 milhões de migrantes iberoamericanos e uma parte significativa deles está na União Europeia, onde as portas e influências abertas por países como Espanha e Portugal são fundamentais.

 

Estas cúpulas se iniciaram em 1991, quando se desmantelava a União Soviética e a bipolaridade mundial, se tornando na primeira tentativa da América Latina em criar uma associação com outra região do mundo que não incluísse os EUA, que sempre dominou à OEA; e também com a Espanha e Portugal, países que originaram os seus idiomas nacionais.

 

Todos estes encontros contam com a participação do rei de Espanha e também, até adoecer, Fidel Castro. E, ambos os mandatários, apesar de se encontrar em avessos políticos, se valeram destes para seus interesses próprios.

 

O único Estado iberoamericano dirigido por um partido vermelho (Cuba) pôde reencontrar-se com sua comunidade (da qual havia sido excluído, ao ser expulso da OEA, no início da década de 1960) e estender pontes para a União Europeia que, paulatinamente, tem amenizado o bloqueio imposto pelos EUA.

 

O único Estado iberoamericano liderado por um monarca de sangue azul (Espanha) tem reatado contato com suas antigas dependências. Enquanto Londres, Paris e Amsterdã têm comunidades que vinculam suas ex-colônias, Madri era a única grande capital imperial europeia divorciada dos países que dominou e influenciou com o seu idioma e credo.Cinco anos após a I Cúpula Iberoamericana de Lisboa foi criada a Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP).

 

As cúpulas iberoamericanas desempenharam um papel fundamental por conseguir diminuir o excessivo de peso dos EUA em seu ‘fundo de quintal’, ao afundar o ‘Consenso de Washington’ e o panamericanismo, que desencadeou às cimeiras bianuais entre a América Latina e o Caribe com a União Européia. Tudo isso, e gerou clima para a formação de novos organismos como a UNASUL, a ALVA ou a Comunidade de Estados de Latino América e Caribe .

 

A Comunidade Iberoamericana não pode se transformar em um bloco econômico, pois seus integrantes pertencem a vários destes (como SICA, NAFTA, UNASUL ou UE). No entanto, ao contrário da Commonwealth, a Francofonia, ou a comunidade de língua holandesa, a batuta não está com a antiga metrópole colonizadora. Espanha e Portugal não compõem o grupo das 20 potências, onde estão Argentina, Brasil e México.

 

Enquanto a Commonwealth está liderada pela monarquia inglesa (a ponto de os embaixadores de seus outros 54 países sejam chamados de ‘altos comissionados da rainha’), a casa real madrilena e a presidência lusa têm o mesmo peso na comunidade iberoamericana.

 

A Comunidade Iberoamericana já agrupa todas as ex-colônias hispânicas independentes (como Filipinas e Guiné Equatorial) e bem poderia integrar ao Sahara Ocidental (mostrando rejeição à sua ocupação marroquina), aos cinco países africanos de língua oficial portuguesa, a Timor Leste e a outras antigas cidades luso-falantes da Índia e China.

 

Isso pode ajudar a América Latina a ter um pé na União Européia (onde muitos de seus cidadãos adquirem a cidadania européia mediante pactos iberoamericanos) e a entrelaçar-se com mercados emergentes de zonas que antes falaram português e espanhol.

 

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Os Kirchners e os Argentinossauros

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

24/10/2011

 

Cristina Kirchner foi reeleita com mais da metade dos votos, obtendo o triplo da votação de seu principal rival. Desta maneira, ela tem adquirido medidas de um dinossauro frente aos seus concorrentes.

 

A Patagônia legou dois colossos ao mundo: os Kirchner e os argentinossauros.

 

Estes últimos são os animais mais descomunais que caminharam sobre o nosso planeta. Foram dinossauros seudópodos que mediam, incluindo os seus extensos e alongados pescoços, de 30 a 40 metros e pesavam de 80 a 100 toneladas, como uma manada de elefantes ou mil humanos adultos. Esses dinossauros foram descobertos 95 milhões de anos após terem sido os maiores herbívoros do planeta, no início da década de 1990, quando os Kirchner debutavam em cargos eleitos numa das províncias daquela região.

 

Nestas duas últimas décadas os argentinossauros passaram de fósseis a estrelas de numerosos documentários e, os Kirchner, de políticos pouco conhecidos e provincianos ao casal de mais sucesso numa democracia presidencial do globo.

 

Em 2003, Cristina debutou na Casa Rosada, como esposa do mandatário eleito com a, então, menor percentagem eleitoral nas Américas, pois Néstor mal obteve 22.24% dos votos válidos. Apesar de ter ficado em segundo lugar contra  Menem, ele  assumiu a Presidência, pois seu concorrente abandonou a eleição.

 

Em 2007, Cristina se converteu na protagonista do primeiro intercâmbio de papéis em um casal dirigente. Ela passou de primeira dama a presidente e Néstor de presidente a primeiro cavalheiro da história argentina. Isto foi conseguido duplicando a percentagem e a votação anterior de seu esposo, obtendo o apoio de 45.3% do eleitorado.

 

De 4 de maio a 27 de outubro de 2010, enquanto seguia no comando da Argentina, ela se converteu na ‘primeira dama’ do primeiro secretário geral do primeiro bloco de seu continente: a União de Nações Sul-americanas (UNASUL).

 

A morte de Néstor nessa última data, paradoxalmente, concedeu um sopro de vida a Cristina, ao receber tamanha solidariedade que fez decolar a sua popularidade. Quando ocorreram as internas em 14 de agosto, seus votos alcançaram 10.762.217 eleitores e sua percentagem superou os 50%. Desde então, Cristina tem mantido semelhante perfil nas pesquisas, cujos resultados apontavam que ela iria se converter na primeira mulher do planeta a exercer dois mandatos presidenciais consecutivos.

 

A força de ambos fez com que o partido hispânico sulamericano mais poderoso (o peronista) não se transformasse num dinossauro extinto, mas no colosso que vem dominando a Argentina desde 1990. Este movimento nacionalista que nasceu propiciando um populismo anti-EUA na década de 1940, deu uma reviravolta total durante os anos de 1990, quando o seu governante, Menem, aplicou uma política interna e externa bastante pró-Washington.

 

Os Kirchner reviraram o peronismo a partir do monetarismo, mas sem cair em seu anterior anti-imperialismo, como atualmente propõe Chávez. Isto provocou um reencontro com antigas bases sociais e ideológicas que aproveitaram o ‘default’ e os bons preços da soja e outras de suas exportações, o apoio de novos sócios comerciais (como a China) e a nova tendência ao crescimento econômico regional para retirar a Argentina de uma de suas piores crises.

 

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A união do espanhol e do português

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

19/10/2011

 

Ambas são línguas que podem se entender entre si e até poderiam ser consideradas parte de um mesmo idioma.

 

A definição do que é uma língua e um dialeto é algo que tem muito a ver com política. Por exemplo, o mandarim é uma variedade de 7 a 13 línguas que nem sempre se entende entre si e que deve utilizar um alfabeto de cinco mil caracteres ideográficos, pois não poderiam se comunicar entre si através da fonética.

 

O árabe reúne uma coleção 25 línguas, muitas delas, antigos idiomas semitas que foram substituídos pelo dos conquistadores que traziam o Alcorão.

 

Enquanto diversas variantes - que nem sempre se compreendem mutuamente - se agrupam sob um mesmo idioma, outras línguas que perfeitamente podem se comunicar entre si decidiram, por razões políticas, autoproclamarem-se idiomas diferenciados.

 

Isto é o que ocorreu depois da fratricida guerra iugoslava, entre sérvios, croatas e bósnios ou o que sucede com o hinduísmo da Índia e o urdu do Paquistão, que adotaram alfabetos diferentes (um de origem indiana e outro árabe).

 

Uma das características da Ibéria é que todas suas línguas podem se entender entre elas (salvo o basco que não se relaciona com nenhuma outra do planeta) e buscam manter sua própria identidade. Hoje há várias línguas oficiais em diferentes partes dessa península e, quanto mais perto estão, mais se entendem.

 

Do extremo oeste a leste da Ibéria, se passa do português e galego ao mirandês e asturiano-leonês, depois ao castelhano e, finalmente, ao aragonês e catalão.

 

Os lusofalantes  têm ainda uma maior habilidade para compreender o castelhano, pois os dois países que mais têm falantes do português (Portugal e Brasil) estão rodeados de hispânicos, além das respectivas influências sofridas, através de suas literaturas, cinema e tevê. Contudo, nem todos os hispânicos têm essa mesma facilidade, porque o idioma português possui mais vogais; é uma língua com a qual muitos não se identificam, além de ser mais dispensável que o inglês.

 

O espanhol tem um único dicionário oficial, homogeneizado pelos seus 330 a 500 milhões de falantes e só possui dois dialetos pouco falados (o palenque colombiano e o chabacano filipino), enquanto o inglês, francês ou português, possui a cada um, ao menos uma dezena de dialetos.

 

Depois da conformação da Comunidade de Países de Língua Portuguesa, em 1996, as oito nações lusofalantes decidiram criar um dicionário único, no qual, prevalece a influência brasileira, país que radica mais de 80% dos 220 a 250 milhões de lusofalantes.

 

Os hispânicos e os lusos chegaram a conformar em 1580-1640, a então maior civilização ultramarina. Hoje a necessidade de se chegar a uma forma de interconexão comum entre ambas as línguas proporcionaria que a UNASUL e a América Latina se homogeneizassem mais, fazendo com que o peso desse grupo linguístico (que soma o dobro de falantes nativos do inglês) avançasse na América do Norte, Europa e África. E também, junto às antigas colônias iberas que atualmente exercem grande peso na economia mundial, como os países do Golfo Pérsico, a Índia, o Sudeste asiático, a China e o Japão.

 

O que distingue ao espanhol e português

 

Hoje o inglês é considerado a língua oficial dos negócios, da ciência e da diplomacia, ainda que as primeiras línguas faladas em várias partes dos cinco continentes foram dois idiomas que se entendem entre si, o castelhano e o luso.

 

O inglês tem cerca de 330 milhões de falantes nativos e quase 1,2 bilhões de pessoas que também podem se comunicar neste idioma. No entanto, a grande maioria que o emprega como primeira língua pertence à mesma raça anglosaxônica na qual esta foi criada.

 

Apesar de os britânicos dominarem o mundo e sua Comunidade de Nações deter 54 dos 193 membros das Nações Unidas (incluindo o subcontinente indiano, o mais povoado), o inglês grosseiro desses países é mal falado pela nata de suas sociedades, enquanto as amplas maiorias se comunicam através de suas tradicionais linguagens nativas.

 

O inglês é a língua materna de uns 250 milhões de estadunidenses e de 60 milhões de britânicos, além de algumas dezenas de milhões em outras colônias de descendentes britânicos como Canadá, Austrália ou Nova Zelândia. Também é a língua oficial de vários países caribenhos, onde os antigos escravos que proviam de diferentes partes do continente negro deveriam empregar a língua natal para se comunicar entre eles. Com isso, criaram novos dialetos ingleses africanizados, como os falados entre os habitantes de Belize e Jamaica e outras Antilhas.

 

Na antiga Índia Britânica, onde reside um quarto da humanidade, a imensa maioria tem mantido seus idiomas tradicionais, incluindo o hindi-urdu, uma família de línguas com 250 a 500 milhões de falantes nativos.

 

Segundo a etnologia, sete dos 10 idiomas mais populares são falados em casa por mais de 95% de pessoas que vivem numa mesma região (nas quais os anglofalantes chegaram a manter colônias ou bases militares) e que mantêm um alfabeto próprio tão ou mais antigo que o latino. Estes são o mandarim, hindi-urdu, árabe, bengalí, russo, japonês e punjabi.

 

Os únicos três dos 10 idiomas mais falados que empregam a caligrafia romana e que também são os primeiros que geraram mais falantes nativos em outros continentes fora de seu berço regional são inglês, espanhol e português.

 

Ainda que o inglês apareça hoje como a língua oficial da globalização, espanhol e português foram os primeiros idiomas que se falar em partes dos cinco continentes. Também são os únicos na história que têm mais falantes nativos em raças diferentes.

 

Se a expansão transatlântica do inglês ocorre desde o século XVII, a do espanhol e português ocorre desde o século XV. Cerca de 90% dos falantes nativos do espanhol não são espanhóis e a maioria deles tem sangue indígena, enquanto cerca de 95% dos falantes do português não são portugueses e a maioria deles é de sangue africano.

 

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O drama da dracma

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

06/09/2011

 

Todo leitor sabe o que significa “drama”, mas o mesmo não ocorre com a palavra “dracma”. Não faltou um amigo meu que dissesse pensar que este vocábulo poderia significar um “Drama do Drácula”. Desde o ponto de vista semântico isso é incorreto, mas vendo a crise do euro, isso não está tão afastado da verdade.

 

A dracma é a moeda que existiu na Grécia, antes de ser um dos últimos países europeus a renunciar a seus títulos e abraçar o euro. Hoje, por conta de dois resgates financeiros incapazes de estabilizar a economia helênica, é provável que a Grécia se converta no primeiro dos 17 Estados da eurozona que a abandone e volte à sua antiga divisa.

 

A dracma foi uma das moedas mais antigas da história. Foi usada faz mais de dois milênios e renasceu quando por volta de 1830, quando a Grécia recuperou sua independência ante os otomanos.

 

De 1832 a 2002, surgiram três dracmas. A primeira durou até 1944, quando a ocupação nazista conduziu a um descalabro em que foram impressas notas representando a centenas de milhões de dracmas. Depois da libertação dos germânicos, foi criada uma segunda dracma, equivalente a 500 milhões de dracmas antigas.

 

Uma década depois, apareceu a terceira dracma, equivalente a mil das anteriores. Assim, Grécia se engajava aos acordos da nova ordem econômica mundial de Bretton Woods. Não obstante, a dracma nunca chegou a ser uma moeda estável. Em 1954, um dólar equivalia a 30 dracmas, um quarto de século depois, o mesmo dólar equivalia a 400 dracmas e, por fim, a mais de 300.000 dracmas.

 

Em 2002, no momento da fusão do sistema monetário europeu, um euro equivalia a 340.750 dracmas novas, e a nada menos que a modesta soma de 851.875.000.000.000.000.000.000.000 dracmas antigas. A dracma foi a moeda do primeiro império europeu, com Alexandre Magno, quando apenas com uma destas uma sozinha pessoa podia viver bem. Hoje, se ela renascesse, afetaria à divisa conjunta do último império monetário da União Européia.

 

Se em 2012 renascer a antiga moeda dos olímpicos helenos, haverá o risco de uma concorrência entre novos países que poderiam deixar o euro, no ano das Olimpíadas de Londres. Isso poderia afetar a fortaleza e a confiança nessa moeda ou fazer com que bancos do mundo fossem os mais afetados por uma desvalorização grega.

 

Se a Grécia deixasse o euro, isso poderia baixar os preços de suas exportações e seus preços internos, além do atrativo para os turistas que, por sua vez, impulsionariam a emigração de muitos gregos residentes noutros países da União Européia, competindo com uma mão de obra que já sofre a recessão. Também faria com que muitos bancos não recuperem seus empréstimos, gerando uma espiral infinita. Além disso, a saída de um membro da eurozona poderia concatenar um desesarticulador efeito dominó.

 

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Londres: entre os distúrbios e o 11 de setembro

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

06/09/2011

 

Depois de  quatro semanas dos manifestos na Inglaterra, iniciados em 6 de agosto, a polícia proibiu pela primeira vez em um quarto de século a realização de marchas no centro de Londres. A medida foi por conta do temor de que se chocassem uma mobilização antimuçulmana e outra antirracista, no sábado 03/09.

 

Para o fim de semana anterior ao décimo aniversário do atentado de 11 de setembro, a Liga de Defesa da Inglaterra (EDL), um grupo de ultradireita que organiza marchas contra os dois a três milhões de muçulmanos britânicos, conclamou uma manifestação contra o Alcorão pelas ruas do principal bairro islâmico de Londres, o de Tower Hamlets.

 

Este distrito, onde fica parte do centro financeiro e a sede do comitê olímpico de 2012, tem o seu prefeito, representantes municipais e parlamentares nascidos em Bangladesh.

 

Tanto a EDL, quanto Breivik, o assassino da Noruega, reivindicam abertamente a mesma ideologia ‘islamofóbica’. Ambos são as outras faces da Al Qaeda.

 

A doutrina desta nova corrente difere do nazismo antisemita, pois deseja que os judeus, em vez de ser considerados como seus inimigos, sejam tratados como seus grandes aliados e o alicerce contra dezenas de milhões de islâmicos.

 

Se Hitler lançou o Mufti de Jerusalém e aos muçulmanos da Bósnia e da Albânia contra os israelitas, a EDL e Breivik querem que Israel seja sua ponta de lança contra a maior religião do mundo e que reza em uma língua semita: o Islã.

 

A EDL não apoia Breivik (que se diz co-fundador da cruzada internacional de antiterroristas em Londres e que tem ajudado a organizar ideológica e organizativamente à EDL), mas compartilha esse mesmo ódio contra os muçulmanos.

 

Paradoxalmente, o partido trabalhista e muitos esquerdistas (que, tradicionalmente, vêem a polícia como sua oponente) incentivaram a marcha e pedem que o governo conservador-liberal não promova cortes no orçamento policial.

 

Já o premiê David Cameron, condena abertamente à EDL (e os fascistas do BNP que chegaram a obter um milhão de votos), mas usa ambos para justificar as pressões anti-imigrantes e, neste caso, para conceder mais poderes às forças de segurança, as mesmas que, dado o crescente descontentamento social, vão acabar sendo usadas contra muitos dos mesmos sindicalistas que pediram mais repressão contra a EDL.

 

A Scotland Yard só deixou que a EDL e seus rivais (Unidade Anti Fascista, UAF e outros) façam concentrações estáticas.

 

Duas coisas que me chamaram a atenção ao ter estado em ambas. Uma é que há uma possibilidade para que a violência política entre fascistas e antifascistas volte às ruas inglesas. A outra é o enorme poder que o idioma bengalês tem adquirido em um dos 32 distritos de Londres, onde o prefeito prestava declarações nessa língua rodeado de seguranças bangladeshis.

 

Em Londres também há outros bairros com forte presença latina que, se seguirem esse exemplo, podem terminar adquirindo poder similar.

 

Leia também outros textos de Bigio:

www.viafanzine.jor.br/mundo_politico.htm

 

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Cristina Kirchner reeleita

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

19/08/2011

 

No domingo, 14/08, a presidente argentina foi virtualmente reeleita, antes mesmo de uma eleição geral. Isto, devido a uma controversa "inovação" no sistema democrático do país. Oficialmente, o primeiro turno argentino é realizado em 23 de outubro e a eleição final, em 20 de novembro. No entanto, os 28.853.223 eleitores votaram numa atípica eleição, na qual não se elege nenhum cargo público, mas, a partir de então, estará quase assegurado para que Cristina Kirchner se converta na primeira mulher do mundo reeleita à uma Presidência nacional.

 

A Argentina tem criado um sistema de "três turnos presidenciais". Se nos EUA ou no México o mandatário é eleito em um único turno e na França, além de a maioria da América Central e Sul optar por dois turnos, na Argentina, se criou uma nova eleição nacional, obrigatoriamente prévia chamada de "internas". Estas internas não se assemelham a nenhuma adotada por outras democracias, onde os partidos elegem os seus candidatos em processos voluntários com a participação popular. Já na Argentina, por força da lei, todos devem votar pelo aspirante de algum partido, ainda que não se simpatizem com a respectiva sigla política.

 

Na prática, trata-se de uma "pré-seleção" ou uma "eleição antes de uma eleição", onde são eliminados os partidos menores (ou todos que não atingem 1.5%), evitando que o peronismo volte a se apresentar dividido nas presidenciais. Nestas eleições forma às urnas 21.757.053 argentinos, quantidade superior aos 20.673.170 que compareceram às eleições gerais passadas, em 28 de outubro de 2007.

 

Nestas "internas nada internas", em segundo lugar ficou Ricardo Alfonsín (filho do presidente argentino de 1983-89) com apenas 2.517,839 votos (12.17%) e somente 0.1% acima de outro candidato peronista, o ex-presidente Duhalde.

 

Segundo a Constituição Argentina, a Casa Rosada será comandada por aquele que arrebatar mais de 45% ou mais de 40%, mas nesse caso, com uma dianteira superior a 10 pontos percentuais sobre o seu imediato rival.

 

A estas alturas, resulta praticamente impossível que uma vantagem de 4 a 1 e de quase 40 pontos sobre seu principal concorrente seja revertida. Cristina, que em 2003 foi a primeira dama de Kirchner, o presidente menos votado da América Latina (eleito após ficar em segundo, com menos de 22.5%), aspira hoje ser a primeira mulher reconduzida à Presidência com a diferença e percentagem mais altas da história.

 

Seus rivais, em vez de se unirem contra ela, podem acabar entrando em atrito, pela disputa para comandar a oposição no congresso.

 

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Mês de independências sulamericanas

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

04/08/2011

 

Do início de julho até 10 de agosto, os países sulamericanos comemoram importantes datas nacionais, se fazendo um período oportuno em que todas essas nações e seus mais de 20 milhões de expatriados no mundo se aglutinassem para celebrar seus vínculos comuns num ‘mês andino ou sulamericano’.

 

Em 02 de julho de 1823 consumou-se a independência de Salvador, a primeira capital do Brasil, numa batalha envolvendo o lorde britânico Thomas Cochrane, que teve antes um papel crucial na libertação de Chile e Peru e depois, contra a resistência portuguesa à independência brasileira.

 

Faz 200 anos, em Caracas foi assinada, em 5 de julho de 1811, a ata da independência da Venezuela, o país de onde sairiam as tropas de Bolívar e Sucre que desempenhariam um papel vital na libertação de Colômbia, Panamá, Equador, Peru, Bolívia, Chile, Costa Rica e partes das atuais Guianas.

 

Em 9 de julho de 1816, faz 195 anos, em Tucumán proclamou-se a independência das Províncias Unidas da América do Sul. Esta república ansiava integrar, como seu o nome indica, todo o subcontinente, ainda que sua ata de nascimento foi assinada por uma dúzia de províncias que hoje compreendem a Bolívia, Argentina, Uruguai e o norte do Chile.

 

Na Argentina celebra-se nesta mesma data o dia da independência nacional, ainda que a palavra ‘República Argentina’ começou a ser usada somente a partir da Constituição de 1826.

 

O Chile também celebra o 9 de julho, mas como o dia da bandeira, e três dias depois sempre recorda o nascimento (12 de julho de 1904) do patrício Pablo Neruda, um dos três andinos a ter recebido um Nobel de literatura.

 

Em 18 de julho de 1830, o Uruguai adotou sua primeira Constituição. A primeira nação a conquistar 15 versões da Copa América é famosa por sua garra esportiva, a qual, talvez, seja um reflexo por ter se transformado em um Estado que, enquanto pequeno como território, soube conquistar sua independência diante de dois vizinhos gigantes e dois impérios ibéricos.

 

O dia 20 de julho que, na Argentina se celebra no dia do amigo e em Honduras o dia do índio - em honra ao cacique maya-lenca Lempira, que resistiu aos conquistadores - é a data nacional da Colômbia, recordando o grito de independência de Bogotá, em 1810.

 

Em 24 de julho de 1783, nasceu em Caracas, Simón Bolívar, figura que libertou todos os países dos Andes do norte e do centro, inclusive, até o Estado norteamericano da Flórida. Bolívar é lembrado na nomenclatura de duas nações: a República Bolivariana da Venezuela e o Estado Plurinacional da Bolívia.

 

Em 28 de julho de 1821, o general argentino José de San Martín, depois de ter chegado do Chile encabeçando milhares de voluntários nascidos em todos os países do cone sul, proclama a independência do Peru, país que até poucas décadas antes, chegara a se aglutinar com quase toda a América do Sul hispânica.

 

Em 30 de julho de 1811 foi fuzilado Miguel Hidalgo, herói da pátria mexicana, que em 16 de agosto do ano anterior liderou o primeiro grito de independência do virreinado de Nova Espanha, que se estendia desde Califórnia, Novo México, Texas e Flórida, até todo o istmo centroamericano, ao norte do Panamá. Sua execução, em vez de deter o movimento, jogou lenha na fogueira.

 

Entre 3 e 13 de agosto de 1806, as forças de Francisco Miranda tomaram Coro e seu porto. Ali, na primeira capital venezuelana, foi realizado o primeiro desembarque libertador na América do Sul. O levante se originou em Londres e recrutou pessoal nas únicas duas repúblicas americanas então existentes (EUA e Haiti). Se tornou o primeiro movimento que desencadeou a criação da Colômbia - então identificada como a nação do continente de Colombo - e que também adotou a atual bandeira tricolor, quase idêntica às da Venezuela e Equador.

 

No dia 6 de agosto de 1538 foi fundada Bogotá, a capital da Colômbia, o país andino mais povoado. Nessa mesma data, porém, no ano de 1824, soldados de todos os atuais 10 países hispânicos da América do Sul sofreram a primeira das duas derrotas que levariam, em dezembro daquele ano, a vitória dos realistas. Exatamente um ano depois, em 6 de agosto de 1825, o Alto Peru se proclamaria como a república de Bolívar (Bolívia).

 

Em 7 de Agosto de 1819 se deu a batalha de Boyacá, consistindo no pior golpe sofrido pelo virrei espanhol de Nova Granada e que ainda hoje é celebrado na Colômbia como um feriado e data em que a cada quatro anos deve ser substituído o presidente.

 

E, em 10 de agosto de 1809 ocorreu o primeiro grito da independência em Quito, no Equador.

 

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Peru e Brasil se descobrem

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

17/07/2011

 

O Brasil está na moda no Peru. Os dois candidatos que disputaram a Presidência, Ollanta Humala e Keiko Fujimori, diziam que queriam seguir o modelo de Lula, enquanto o destacado governante quer deixar como sua obra póstuma uma versão do Cristo carioca.

 

Tanto o Cristo do Rio, como Machu Picchu, no Peru, são os representantes sulamericanos das sete maravilhas do mundo moderno. No entanto, os brasileiros celebram o centenário da descoberta da cidadela inca construindo uma réplica desta em seu país.

 

Mas no Peru, os antigos admiradores do caminho cubano ou venezuelano e seus críticos que queriam emular a Chile, agora coincidem em acercar o país que lidera a União de Nações Sulamericanas. O Brasil deseja participar do Conselho de Segurança da ONU e se consolidar como uma das cinco potências econômicas do mundo.

 

O Peru foi o berço de muitas línguas ameríndias, que depois foi a base da hispânica no subcontinente, mantém diários em chinês e japonês e tem educado seus estudantes e elites com o francês ou inglês. Entretanto, o país nunca dera muita importância ao português, porque antes também não teve tanto interesse no Brasil, o colosso onde residem 200 dos 240 milhões de luso-falantes do mundo.

 

Anteriormente, o Brasil também não teve muita influência sobre o Peru. O antigo país dos incas se forjou com a mestiçagem entre os quechuaimaras e os espanhóis, enquanto as heranças indígena ou espanhola são mínimas no Brasil, cuja população tem origem em localidades da Europa e da África.

 

Ambos os países costumavam antes mirar mais às potências do Norte do que àqueles que estavam ao seu lado. Hoje esses dois países, que ocupam um mesmo território no qual começam e terminam o maior rio e a maior selva do planeta, descobrem que se necessitam, entre outras coisas, porque são as duas únicas repúblicas vizinhas que possuem saídas para diferentes oceanos.

 

A influência brasileira, que antes se centrava na arte e nos esportes, agora vai se expandindo ao campo econômico e político.

 

No pós-guerra fria, o Brasil tratou de ser “autônomo” com relação aos EUA e, do outro lado do Atlântico, passou a se focar na América Latina, onde disputa com os EUA uma maior influência sobre esta região.

 

O Brasil tem figurado como um árbitro mediador entre os governos conservadores e os que compõem a ALVA.

 

Se o modelo de Chávez foi seguido pelos primeiros governos "vermelhos" da Bolívia, Equador e Nicarágua, Lula mostrou uma outra senda de convivência com os EUA e com os grandes investidores, que têm influenciado novos governos esquerdistas do Uruguai, Paraguai e El Salvador.

 

Atualmente, Humala se distanciou do seu anterior "bolivarianismo" ao optar pelo pragmatismo do PT brasileiro. Esse partido governa por oito anos o país, com apoio de partidos e ministros do centro e da direita "moderada", sem jamais querer mudar a Constituição, tendo à frente agora, um novo rosto feminino.

 

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A volta de Chávez

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

07/07/2011

 

Quando a Venezuela celebrava o seu bicentenário de independência, Hugo Chávez retornou surpreendentemente ao país, após um mês de ausência.

 

Da sacada presidencial, ele fez uma breve aparição para uma multidão de simpatizantes. Esteve com os três presidentes esquerdistas que o visitaram (da Bolívia, Paraguai e Uruguai). Participou do desfile militar, juntamente com seu alto comando.

 

Chávez tem mostrado que mantém uma alta popularidade, buscando utilizar sua luta contra o câncer como parte de um empreendimento para angariar simpatia, apontando às eleições presidenciais em dezembro de 2012. Além disso, ele insinuou que desejava permanecer no poder até a comemoração do bicentenário da batalha de Carabobo, em 2021.

 

Depois de sua cirurgia, em Cuba, ele não havia aparecido discursando ao público em nenhum vídeo, até 20 dias depois. A única informação era que ele tratava um abscesso pélvico naquele país. Logo depois foi revelado pelo chanceler venezuelano Nicolás Maduro que, inicialmente, o presidente foi operado durante mais de quatro horas, por conta de uma infecção na pélvis. Porém, depois foi descoberto um tumor maligno na área, sendo necessária a sua completa extração, numa cirurgia rigorosa que durou por volta de seis horas.

 

Enquanto Maduro nega que Chávez esteja com um câncer de colón ou escondendo informações graves sobre sua saúde, a oposição diz que muitos segredos não são revelados e que seu câncer poderia ser mais grave e até de consequências letais. Alguns propõem que o comando nacional passe ao vice-presidente Elías Jaua, enquanto outros denunciam que a influência de Cuba tem crescido e, inclusive, mais de mil soldados da ilha teriam desembarcado na Venezuela para se resguardar de uma suposta rebelião antichavista.

 

Os graves problemas na saúde de Chávez devem estar afetando seus compromissos, dietas e a capacidade de trabalho. Enquanto ele demonstra disposição em seguir adiante, não há como saber se o excesso de voluntarismo poderia conduzi-lo a uma grave recaída ou reelegê-lo, ou ainda, mantê-lo em um possível novo mandato por mais seis anos, de 2013 a 2019.

 

O importante da volta de Chávez é que ele esteve na festividade do bicentenário, evitando especulações sobre o futuro incerto de um presidente ausente. Ele se fez presente nessa comemoração histórica e se mostra disposto a enfrentar os muitos rumores e questionamentos que estão a surgir.

 

Neste 28/07, Chávez completa 55 anos de idade e, se sua saúde permitir, ele ainda poderia ter, pelo menos, um quarto ou terço de século de vida, fazendo sua carreira política durar muito. Contudo, tanto seu movimento como os seus opositores, devem estar elaborando planos B ou C, caso sua enfermidade o conduza a deixar temporária ou definitivamente a presidência venezuelana.

 

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O ponto frágil de Humala: a diáspora peruana

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

30/06/2011

 

Em 28 de julho tomará posse o novo presidente do Peru. Ollanta Humala tem muitos desafios propagados por ele a muitos meios. Em especial, queremos mostrar a sua equipe à imprensa e ao público internacional e um aspecto de pequinês que não pode seguir ignorando.

 

De todas as cinco eleições realizadas no Peru, Humala foi o que menos respaldo teve dentre os três milhões de peruanos que votam no exterior. Nas duas vezes que se candidatou aos consulados teve só um 10% dos votos em primeiro turno e 30% no segundo.

 

Os peruanos do exterior formam a diáspora iberoamericana que mais vota em suas respectivas eleições. Seus votos igualam aos de Loreto, a maior região do Peru em área. Tal é seu peso que, Humala venceu em todo o território nacional com quase 4% de diferença, mas ao constar a votação dos consulados terminou vencendo com uma diferença de apenas 2.9%.

 

Bem poderia ter se dado uma situação na qual o novo governo fosse eleito com os votos do exterior, enquanto era derrotado no interior, conforme ocorrido na Itália, em 2006.

 

Se o seu governo se proclama como de acordo nacional, tem como um de seus primeiros desafios, se encontrar com essa diáspora e cumprir as promessas feitas em campanha: a criação de um vice-ministério e cinco congressistas para as comunidades do exterior.

 

O debate sobre a incorporação dos expatriados peruanos ao executivo e legislativo de seu país interessa a toda Iberoamérica.

 

Atualmente, Portugal discute sobre como integrar melhor a sua diáspora (que elege quatro congressistas), pois no mesmo dia que os peruanos votaram para presidente, eles votaram por seus legisladores. Não obstante, a quase duas semanas dessas eleições não se podem revelar os votos do exterior, devido às impugnações e aos reclames de muitos expatriados que não receberam sumulas pelo correio ou porque elas não chegaram. Isto tem aberto toda uma polêmica sobre como superar a ausência e promover o voto eletrônico, como os brasileiros do exterior fazem para eleger os seus representantes.

 

A Colômbia foi o primeiro país sul-americano a ter um deputado para o exterior, ainda que somente este, supostamente, represente quatro milhões de expatriados numa câmera de 166 membros. O Equador tem dedicado 5% de sua assembleia (constituinte e legislativa) à sua diáspora.

 

Enquanto o Uruguai votou um referendo contra o direito de sua massa diáspora votar em suas eleições (condenando esta a ter que viajar ao país para votar), o Brasil criou um ‘parlamento de brasileiros do exterior’, que bem pode ser um modelo para estudo. Na Bolívia, o governo tem pressionado para que seus expatriados comecem a votar em seus consulados. A votação mexicana no exterior ainda é mínima.

 

Como parte deste debate, o presidente do Parlamento Andino, Walter Bendezú, tem proposto que todos os países que integram este bloco mantenham congressistas do exterior e que neste organismo supranacional, a diáspora andina (maior que a população da Bolívia ou Equador) esteja representada.

 

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Chile e Brasil: modelos consolidados

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

30/05/2011

 

Estes dois países são vistos como possíveis exemplos a seguir. A república chilena mostra um alto nível de crescimento por ser uma das nações que mais Tratados de Livre Comércio tem firmado. Já o colosso brasileiro, se projeta ao apresentar um modelo mais protecionista e por ter colocado essa nação como a única do hemisfério a fazer contrapeso ao gigante do norte, ainda sem se chocar frontalmente contra este.

 

Ambos os países se caracterizam por estar divididos em dois blocos (um que vai do centro à direita e o outro do centro à esquerda), que têm conseguido consensos em comum acerca do modelo a seguir. Ambos os campos políticos podem reeleger um novo presidente a partir de seus próprios quadros e também se alternarem no poder. Cada um mantém um determinado peso eleitoral e, em suas eleições, o nível de variação de votos não é abismal (como ocorre no Peru).

 

Nessas duas repúblicas há partidos estruturados e aqueles que se assentam nos sindicatos (como o PT no Brasil e o PS no Chile) têm ajudado a viabilizar o modelo, impedindo greves radicais ou insurgências - como as ocorridas na Colômbia e Peru, e proporcionado que esses países busquem novos líderes da direita.

 

Os dois candidatos presidenciais do Peru se fazem mais próximos a um ou outro desses modelos. No entanto, este país carece de partidos sólidos e de blocos que possam ser reeleitos ou se alternem no poder.

 

A esquerda peruana, que emergiu com certa força após Velasco, acabou abafada entre a polarização Fujimori-Sendero e foi incapaz de estruturar partidos com verdadeiro peso e, muito menos, presidentes como Lagos, Lula, Bachelet e Dilma.

 

O Peru nunca teve um movimento que mantivesse o poder renovando em uma figura. No mais, Belaunde, García, Toledo e, novamente García, começaram com um respaldo majoritário, mas acabaram perdendo mais de 90% de seus eleitores iniciais ao finalizar os seus quinquênios administrativos.

 

O único movimento que vigorou por mais de um mandato, o fez, intervindo em outros poderes, reelegendo o mandatário e criando um partido que se apresentou com a média de uma dúzia de membros diferentes, mas tendo em comum, a subordinação ao líder.

 

De fato, todos os partidos peruanos são lideranças e os líderes tendem a passar por reviravoltas.

 

O fujimorismo, que foi eleito em 1990 com os votos da esquerda contra a direita, hoje quer retornar ao Palácio, unindo a direita contra a esquerda. Vargas Llosa, que então aparecia como ícone da esquerda, atualmente apóia Ollanta. Mas Ollanta carece de uma ideologia clara ou de uma base social como a dos demais partidos de esquerda do continente (desde o social-democrata, tipo Chile ou Brasil, até o "radical", tipo Bolívia).

 

Sem o desenvolvimento dos partidos e blocos estruturados e, com tanta volatilidade eleitoral, o Peru não poderá adotar a quaisquer desses modelos.

 

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Progressos do Bildu basco e do Sem Féin irlandês

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

24/05/2011

 

Nas eleições locais espanholas de domingo 22/05, nas quais a oposição de direita derrotou o dirigente partido socialista, uma grande surpresa foi o fato de o Bildu (bloco dos independentistas socialistas bascos, que tem sido acusado de ser uma das frentes do ETA) tenha ficado em segundo no País Basco (após o Partido Nacionalista Basco) com um quarto dos votos apurados e convertendo-se na força que mais vereadores obtiveram.

 

Uma semana antes das eleições escrevemos uma nota comparando o que seriam dos movimentos eleitorais que tivessem alguma ligação com as três principais organizações formadas no final do século XX, as quais deflagraram os piores atentados em várias capitais ocidentais e nestas últimas semanas têm impulsionado suas frentes eleitorais.

 

Estas organizações são o senderismo peruano, o Exército Republicano Irlandês (IRA) e o ETA basco.

 

Sendero, IRA e ETA

 

O senderismo criou sua própria legenda legal (MOVADEF), e teve três dos 14 candidatos para representar ao Peru no parlamento andino nas eleições gerais do 10 de Abril. Nenhum deles chegou a obter 6,5 mil votos a nível nacional (nem sequer 0.1%).

 

Faz meio século, seu chefe Abimael Guzmán impulsionava a abstenção ou o boicote armado; inclusive chegou a assassinar candidatos que apresentavam outras forças de esquerda. Seus baixos resultados demonstram que nunca se identificaram realmente à população pobre que diziam defender.

 

Um resultado oposto foi obtido nas eleições da Irlanda do Norte, no dia 5 de maio, pelo Sem Féin legenda baseada em antigos militantes do IRA. Nestas eleições, o Sem Féin catalisou os votos de dois em cada três norteirlandeses católicos e nacionalistas, se tornando o único dos quatro partidos tradicionais desta região que cresceu e ficou a poucos pontos da ponta. Nas municipais obteve 24,8% (conquistando 12 novos vereadores ao totalizar 138) e na Assembléia conseguiu o 26,3% obtendo sozinho 20 mil votos do ganhador Unionismo Democrático. Hoje eles detêm 29 dos 108 parlamentares e três dos 10 ministros da Irlanda do Norte.

 

O Sem Féin, inclusive, vem fazendo progressos eleitorais na República da Irlanda, enquanto se transformou no único partido que opera nos dois lados divididos dessa ilha.

 

O objetivo de seu líder, Gerry Adams, é de converter-se no Mandela de uma das duas Irlandas (do Norte e do Sul). Seus avanços beneficiaram-se por que seu movimento trocou as armas pelas urnas. O IRA negociou seu desarmamento e o Sem Féin, sem deixar de lado sua prédica revolucionária ou socialista, tem sido capaz de co-governar com os unionistas contra quem guerrearam.

 

Bildu

 

No País Basco, o ETA não se desarmou, mas promoveu uma trégua. O caminho que buscam seguir é o de seus camaradas norteirlandeses, combinando uma ala eleitoral com uma armada, para conseguir concessões que permitam uma futura plena reintegração ao sistema.

 

O ETA tem apoiado a formação de diversas frentes eleitorais da esquerda independentista basca (‘abertzales’), porém, usualmente estes permanecem proscritos pela Espanha.

 

Para as eleições locais espanholas do domingo 22, os ‘abertzales’ conseguiram legalizar um novo bloco (o Bildu), que apresenta candidatos que, segundo as pesquisas do diário conservador A Razão, poderiam ficar em segundo no País Basco, conseguindo ali, mais vereadores que a soma dos dois grandes partidos espanhóis (o Socialista e o Popular).

 

Os poucos votos obtidos pelos candidatos apoiados pelo Sendero ou o MRTA no Peru mostram que estes movimentos foram derrotados muito antes de querer concorrer em eleições e de que não têm possibilidades de gerar um movimento de massas, como ocorre com os nacionalistas europeus.

 

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À moda Lula no Peru

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

17/05/2011

 

Se as eleições presidenciais passadas do Peru foram tornadas uma espécie de plebiscito entre quem estava a favor ou na contramão do presidente venezuelano, nas de 2011, os dois candidatos (apesar das posições políticas opostas) competem entre si para ver quem poderia melhor emular o ex-presidente brasileiro.

 

Enquanto Ollanta Humala está rodeado de assessores cariocas e diz que agora está mais próximo de Lula do que de Chávez, Keiko Fujimori propõe uma imitação de Uribe e Lula (algo difícil de conseguir, pois ambos ex-mandatários são como água e azeite).

 

Hoje Lula está na moda porque o Brasil transformou-se no principal eixo da União de Nações Sulamericanas (UNASUL) e se perfila como nova potência mundial. Apesar disso, o país mantém um dos mais altos índices regionais de desigualdade social e depredação ambiental.

 

Outro “atrativo” de Lula é que ele tem se feito de ponte entre extremos como, Uribe e Chávez, ou Evo e Obama, além de outros governos de esquerda e direita do seu hemisfério. Diferentemente dos chefes de estado da ALVA, Lula não quis alterar a Constituição para se reeleger ou promover nacionalizações.

 

Nem Humala, nem Fujimori tem a ver com a trajetória de Lula e ambos foram oponentes seus. Durante toda a década de 1990, quando Fujimori esteve no poder, Lula se identificava com a esquerda peruana chamava por ele de ‘ditadora’, ‘neo-liberal’, ‘vendedora da pátria’ e ‘destruidora dos direitos humanos e sindicais’. Enquanto o eixo do fujimorismo lutou com todos os meios possíveis contra à subversão, as FARC e o ELN colombianos são partes do foro internacional do Partido dos Trabalhadores do Brasil.

 

Ollanta Humala fez carreira militar durante o regime fujimorista até que se rebelou em 2000 e passou a coordenar juntamente com seu irmão Antauro, a edição do Quinzenário Ollanta, no qual insultava Lula e se reproduzia citações do General Velasco, alertando que o Brasil era um grande perigo. Em contrapartida, vários dos lulistas peruanos o acusaram, entre outros, de efetuar prisões por causas étnicas.

 

Enquanto os Humala e os Fujimori tiveram berços e educações acomodadas e uniram-se às Forças Armadas, Lula nasceu na miséria e fez carreira política como sindicalista, enfrentando os militares.

 

No fim da década de 1970, Lula saltou ao estrelato ao se converter no líder das greves dos metalúrgicos de São Paulo e depois, ao criar em 1980, o Partido dos Trabalhadores (PT) junto a diversos grupos socialistas e trotskistas. Suas primeiras campanhas eleitorais inspiraram-se nos jargões de ‘trabalhador vota trabalhador’ e ‘não ao patrão’ de Hugo Blanco, que em 1978-80, se tornou a principal figura eleitoral da esquerda peruana.

 

Enquanto o barbudo de Cuzco manteve-se em sua tradicional linha classista e foi perdendo peso, o do nordeste brasileiro foi se ‘socialdemocratizando’, e por sua vez, foi também ‘socialdemocratizando’ a direita brasileira.

 

Lula foi antecedido por oito anos do governo do Partido Social-democrata (PSDB) de Fernando Henrique Cardoso, que atualmente encabeça o bloco opositor.

 

De certa maneira, o Brasil tem um consenso programático no qual a esquerda visa reformas agrárias e sociais radicais e a direita visa postular a ortodoxia monetarista. O PT é a versão sulamericana do que foi o trabalhismo no mundo anglosaxão: um partido que nasce e expressa pelos sindicatos, mas que se adapta ao mercado e ao multipartidismo.

 

No Peru não existe esse consenso, como também não há uma força política significativa baseada nos sindicatos.

 

O fujimorismo e o humalismo carecem de uma origem ou de uma base trabalhista. São duas alas que se relacionam com as Forças Armadas. Enquanto o fujimorismo segue a senda da dureza do oficialismo colombiano, o humalismo pode seguir à evolução de outros nacionalismos castristas, como o peronismo, o chavismo ou o do equatoriano Lucio Gutiérrez.

 

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Netos de Kadafi e de Elizabeth II

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

11/05/2011

 

Líbia e o Reino Unido têm várias coisas em comum. Esses países ficam quase sobre o mesmo meridiano. Os britânicos foram a última potência estrangeira a ocupar militarmente a maior parte de Líbia, enquanto o pior atentado militar já sofrido pelo Reino Unido em seu território após a Segunda Guerra Mundial foi perpetrado por líbios, que em 1988 voaram de um avião civil na Escócia.

 

Se Elizabeth II, que ocupa o trono britânico desde o dia 6 de fevereiro de 1952, é a monarca ocidental a mais tempo no posto, Muammar Kadafi, que substituiu o rei Faisal I, em Trípoli, com um golpe em 1º de Setembro de 1969, é o líder republicano que por mais tempo está no poder.

 

No mesmo dia em que no palácio de Buckingham era festejada a união matrimonial de William, neto e herdeiro de Elizabeth II, a residência dos Kadafi em Trípoli era bombardeada pela coalizão que celebrava o referido casamento. Enquanto o tirano líbio se salvou, foram assassinados três de seus netos menores de idade e o seu sexto filho, Saif a o-Arab.

 

Saif a o-Arab tinha a idade de William, pois ambos nasceram em 1982. Mas a sorte deles, aos vinte e oito anos de idade, seria bem diferente. Ao mesmo tempo que William se convertia no Duque de Cambridge e seu casamento se transformava na maior transmissão televisiva do século, Saif, que não era um ditador militar, teve a vida arrancada, sem que a imprensa desse muita importância a esse fato. Enquanto William se sentia no céu em sua lua de mel, os amigos de Saif, bem poderiam dizer, ele se fora para o céu.

 

Os meios de comunicação ocidentais procuraram mostrar Kadafi como um traidor de seu próprio povo, mas não gostam de falar das centenas de vítimas civis que os bombardeios da OTAN têm produzido.

 

Mal começou a intervenção na Líbia e a imprensa britânica já pedia as cabeças de toda personalidade local que mantivesse algum tratado com os Kadafi. Pouco antes do início da guerra líbia, estive conversando com o reitor da London School of Economics, em uma homenagem ao mais ilustre arabista daquela universidade. No entanto, faz poucas semanas, fomos informados que ele tinha sofrido pressão para renunciar, devido ao fato de ter aceitado doações líbias para a sua instituição. E, além disso, outro filho de Kadafi (que também se chama Saif, mas, a o-islã), se  formou naquela instituição e mesmo sem eu conhecê-lo, teria sido na época, meu colega de universidade.

 

Essa extrema meticulosidade em ver todas as barbaridades dos Kadafi não se aplica às dos piores tiranos do mundo islâmico. Todas as famílias reais árabes foram convidadas para o casamento de William. Dentre estas, estão as mentoras da Al Qaeda e outros terroristas islâmicos, que não permitem eleições, partidos políticos e, inclusive, igrejas. Eles privam de direitos à maioria de sua população, bem como às mulheres, por não ser sunitas ou por ser imigrantes e, além disso, vêm reprimindo brutalmente os manifestos pró-democracia no Bahréin.

 

A imprensa britânica, a pouco realçava esses hóspedes da rainha, mas também que a guerra líbia já não ocorre para supostamente evitar que Kadafi mate civis, e sim, para eliminar à família dirigente daquele país, ainda que vários deles sejam civis ou menores de idade.

 

Enquanto os netos de Kadafi eram enterrados, Obama autorizava o plano para eliminar Osama no Paquistão. Graças a isso, o mundo não falou mais do assassinato dos netos de Kadafi, mas da 'carta branca' concedida à Casa Branca para promover execuções extrajudiciais.

  

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Incertezas da operação contra Osama

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

05/05/2011

 

Depois da noite americana de 1º de maio, quando Obama anunciou a morte de seu arquirival Osama, uma série de dúvidas e interrogações vem aumentando.

 

1 - Toda vez que um Estado captura o líder de seu principal inimigo subversivo, imediatamente são mostradas imagens do capturado ou de seu cadáver. Os EUA afirmam que retiveram o corpo de Osama e o transportaram por pelo menos, mil quilômetros, desde o montanhoso norte paquistanês, até o mar arábico, onde o submergiram. No entanto, não foi mostrada sequer uma foto sua ou de qualquer de seus objetos de uso pessoal. Foram reveladas as fotos de três acompanhantes de Bin Laden mortos na operação, mas é negada a publicação de qualquer foto sua. Também não foram mostrados quaisquer um dos presos, dentre eles, estariam vários filhos, netos, esposas e outros parentes de Bin Laden.

 

2 - Washington afirma que foi decidido dar ao cadáver de Osama, tratamento dentro dos ritos islâmicos, inclusive, por isso, deveria ser enterrado 24 horas após a sua morte. Não obstante, os EUA têm retido os corpos de vários de seus inimigos muçulmanos durante dias e o costume maometano, consiste em sepultá-los na presença de seus familiares, sob a terra e em direção à Meca. E não, disperso no mar, como os EUA afirmam ter sido fato, ainda que também não tenham mostrado imagens de tal cerimônia. Esta forma de se desfazer do corpo de Bin Laden tem gerado muitos questionamentos junto a diversas autoridades clericais muçulmanas (as quais, não apoiam à Al Qaeda).

 

3 - As primeiras versões sustentavam que Bin Laden resistiu ao ataque usando armas e a uma mulher como escudo humano. Depois foi falado que ele estava desarmado e que não se escondeu por trás do corpo de ninguém. Sua filha afirma que Osama se rendeu e foi executado com tiros na cabeça e peito. Estranho é o fato de nenhum dos executantes ter se ferido e que a resistência e equipamentos militares do refúgio de Osama fossem tão medíocres.

 

4 - Há contradições entre quem afirma que o Paquistão participou ou não da operação, ainda que, tudo indica, a única nação nuclear muçulmana, foi humilhada ao nem ser notificada daquilo que se passaria em seu próprio território e a apenas um quilômetro de sua Academia Militar nacional (incrivelmente, a mesma se manteve inativa durante quase uma hora, tempo de duração da dita ação militar).

 

5 - Washington pôde ter priorizado capturar Bin Laden vivo para, através de desmoralização atrás das grades (como ocorreu com o senderista peruano Abimael Guzmán), e tê-lo obrigado a ir empurrando o seu movimento à desestruturação. Ao contrário, preferiu matá-lo, para evitar um julgamento em que Osama poderia revelar como a CIA e os serviços secretos de seus aliados sauditas e paquistaneses o ajudaram a criar a Al Qaeda.

 

6 - Assim, se ocorreu ou não um assassinato a sangue frio de um rendido, a informação sobre onde Osama poderia estar escondido foi conseguida através de crueis torturas autorizadas a vários prisioneiros em Guantânamo. Enquanto muitos aplaudem à frase de Obama afirmando que se fez justiça ao ‘terrorista mais procurado do mundo’, certo é que ele não foi levado à Justiça e vários métodos usados para capturá-lo não estão em consonância com as leis internacionais. Os mesmos continuarão sendo usados em novas execuções extrajudiciais em qualquer rincão do mundo e, portanto, contra as novas justificativas dos jihadistas.

 

7 - As dúvidas sobre isso têm feito a tevê iraniana reviver as declarações da ex-primeira ministra paquistanesa, Benazir Bhutto, que sustentara, faz em alguns anos, que Osama já tinha morrido ou que o principal jornalista britânico especializado no mundo islâmico, Robert Fisk, teme que se tenham matado, em verdade, somente um dos sósias de Osama e se isso se confirmasse, poderia conduzir Obama ao descrédito político. Muitos residentes de Abbottabad duvidam que Osama tenha sido seu vizinho, enquanto em todo o mundo crescem as teorias conspiratórias. Elas sustentam que Bin Laden deixou de existir faz tempo e que só foi usado pelos EUA como pretexto para promover guerras. Uma declaração dos talibãs afirma que não podem confirmar que seu sócio Bin Laden perdeu a vida.

 

8 - É sintomático o fato de a notícia da morte de Osama ter sido revelada meia semana depois de anunciada que a chefatura da CIA passaria de Leio Panetta (que tem cobrado o seu protagonismo na operação de 1º de maio) ao general David Petraeus, comandante dos EUA no Afeganistão. Ambos os fatos, podem indicar que a Casa Branca está prestes a anunciar que o seu objetivo no Afeganistão foi cumprido e por isso, deverá se retirar da região.

 

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Reino Unido: o trono depois do poder

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

29/04/2011

 

O casamento do herdeiro ao trono britânico vem atraindo multidões de turistas e de jornalistas para este que é o casal do ano. No entanto, esta cerimônia transcende o 'jet set' internacional.

 

Enquanto dezenas de milhões de pessoas entusiasmem-se pelos elaborados ritos e pelas histórias do romance real, por trás desse espetáculo sublime há uma realidade que não é tão ressaltada.

 

William é a pessoa que está predestinada a ser o futuro rei da maior monarquia existente no planeta. Ele não ganhou esse direito em um concurso ou votação, mas quando mal se formou no ventre de sua mãe, a Princesa Diana, por ser o primogênito de Charles, filho da rainha Elizabeth II.

 

Sua avó Elizabeth II, em 2012, completará 60 anos de trono. Ela é a mulher mais poderosa do planeta e a chefe de Estado que por mais tempo ocupa um cargo em todo o Ocidente.

 

Apesar de seu país ser uma democracia, nem a rainha, nem a alta câmera britânica têm sido ou são eleitas.

 

Elizabeth, seu filho Charles e seu neto William não são só meras figuras. Ele têm um considerável poder. Os Windsor é a família dirigente de 16 países do mundo, além de ter cerca de quatro dezenas de Estados independentes que integram a sua Commonwealth, a maior comunidade de nações de todos os tempos, tendo em seu seio, mais que a quarta parte da humanidade e dos membros das Nações Unidas.

 

Enquanto o Reino Unido é a nação mais povoada de todas aquelas regidas por Elizabeth II, esta também é a rainha do único país na história que contém todo um continente, a Austrália, além do Canadá, a segunda nação territorialmente mais extensa.

 

Os territórios em que os Windsor reinam somam mais que os da Rússia, o maior país do globo. O sol nunca se põe nos reinos de Elizabeth II.

 

William, quando se converter rei, será, sobretudo, o cérebro da igreja anglicana, a maior de Ocidente, após a de Roma.

 

Ao seu poder territorial e religioso é adicionado o seu poder militar, pois sua nação consiste, juntamente com os EUA, na que lidera a maior quantidade de guerras 'democratizadoras' no mundo.

 

A inteligência da família real está em se manter, não como o poder depois do trono, mas com o trono depois do poder. Eles permitem que seus premiês e bispos tenham muita autonomia, ainda que se reservem o direito a vetar e alterar as decisões finais.

 

- Tópico relacionado:

   O casamento real - por Isaac Bigio

 

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Referendo britânico: haverá mudança eleitoral?

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

19/04/2011

 

Na quinta-feira, 05/05, será realizado o primeiro referendo britânico em 36 anos. Ele ocorre simultaneamente às eleições aos governos dos três países que formam o Reino Unido (Escócia, Gales e Irlanda do Norte) e às municipais na maioria das cidades da Inglaterra, com exceção da Grande Londres.

 

No referendo, o cidadão deverá votar a favor ou contra a proposta de reforma constitucional para criação do Voto Alternativo (AV, da sigla em inglesa), modificando as eleições ao parlamento do Reino Unido.

 

Uma democracia com heranças feudais

 

Apesar de a Grã-Bretanha se conclamar a única potência com uma democracia que não conhece golpes, revoluções ou invasões, durante mais de um terço de milênio, ali, o voto popular não tem o mesmo peso que em outras nações.

 

Seu chefe de Estado – a rainha Elizabeth II - está a quase seis décadas no poder e nem ela, seu predecessor ou seu sucessor foram ou serão eleitos. O Reino Unido é, sobretudo, a única "democracia" que nunca elege a sua câmara federal, pois os seus 792 lordes são designados pela monarquia ou por herança.

 

No parlamento, vê-se uma limitada renovação, pois muitos de seus integrantes são reeleitos durante décadas, mesmo com percentagens de atuação muito baixas.

 

Hoje a Câmara dos Comuns está composta por 650 parlamentares, sendo que cada um deles obteve o primeiro lugar em seu respectivo distrito eleitoral.

 

Essa é uma tradição que vem de séculos, desenhando à atual câmara dos comuns britânicos, na qual só há realmente espaço para dois partidos que se alternam no poder: o do governo e o da oposição.

 

Assim, por exemplo, o prévio governo trabalhista (2005-2010) podia impor suas leis, pois controlava 55% do parlamento, apesar de ter recebido cerca de 35% nas urnas. Além dos dois grandes partidos (trabalhista e conservador) as forças menores não ingressam diretamente no parlamento ou o faz numa percentagem muito inferior a que obtiveram nas urnas.

 

O grande perdedor nesse sistema é o partido liberal democrata. Esta terceira via nunca consegue um décimo do parlamento, ainda que tenha arrebatado a quarta parte de todos os votos (como ocorreu em 1983).

 

Um dos requisitos que pôs esse partido de centro para fazer a atual coalizão de governo junto aos conservadores foi a exigência de um referendo para alterar o sistema eleitoral, o qual deveria ter sido realizado ainda no primeiro ano do novo governo, mas ocorrerá somente no próximo dia 05 de maio.

 

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Peru: uma eleição singular

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

12/04/2011

 

Para o segundo turno das eleições peruanas os três ‘moderados’ se anularam uns aos outros. O detalhe inédito é que agora eles deverão optar entre dois populismos extremos: o nacionalista de Humala (31% dos votos) e o autoritarismo de direita de Fujimori (23% dos votos).

 

Na história latinoamericana ocorreram casos em que o vencedor de um primeiro turno acaba sendo derrotado no final, mas nunca isso se repetiu com o mesmo candidato na vez seguinte.

 

Hoje, novamente Humala vence o turno inicial (inclusive, com uma percentagem similar) e os que ficaram no ‘meio’ devem optar por se unir contra ele ou evitar isso, desde que ele siga se distanciando da ALVA.

 

A possibilidade que Fujimori mais que duplique sua votação inicial e consiga captar os votos dos liberais não é demasiadamente alta. Tanto ela, quanto o seu atual rival devem acercar o centro para evitar “anticorpos”, os quais vão influenciar diretamente na decisão final, cujos resultados hoje são incertos.

 

 

 

Peru: suicídio dos ‘moderados’?

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

08/04/2011

 

Durante todo o século XXI o Peru teve uma posição especial na geopolítica latinoamericana. Tem figurado como um dos baluartes da ortodoxia econômica monetarista. Junto com a Colômbia, tem sido o único país sul-americano no qual o ‘socialismo’ ou o ‘nacionalismo’ não governaram.

 

Essas duas repúblicas, mais Chile, México e América Central têm feito que o oeste latinoamericano se mova para firmar Tratados de Livre Comércio com os EUA, enquanto o leste, liderado por Brasil, Argentina e Venezuela, aposta num maior protecionismo interno.

 

A nível de segurança interna, o Peru é o único país do planeta no qual um ex-presidente foi extraditado ao seu próprio país (onde permanece aprisionado), acusado por corrupção e delitos contra a humanidade. Também é o único onde ocorreu uma forte insurgência armada, a mesma que, ao contrário da Colômbia, tem sido derrotada. Esta também não gerou um significativo movimento eleitoral pós-armado, como o que tem levado antigos guerrilheiros ao poder (casos de El Salvador, Nicarágua, Colômbia, Uruguai, Bolívia e Brasil).

 

Nas eleições peruanas desse domingo, 10/04, cinco candidatos se despontam nas pesquisas, mas há o risco de que os três candidatos que propõem a continuidade do atual modelo (Alejandro Toledo, Pedro Pablo Kuczynski e Luis Castañeda) se eliminem mutuamente em detrimento de um dos dois extremos: Ollanta Humala e Keiko Fujimori, filha do ex-presidente Alberto Fujimori.

 

Ollanta, se vencer, fará com que os três países onde se centrou o incário (Equador, Peru e Bolívia) tenham pela primeira vez em sua história, similares governos nacionalistas andinos, promovendo o populismo para a esquerda. Isto, por sua vez, deixaria o Chile e a Colômbia como os únicos grandes pilares do TLC com os EUA em seu subcontinente.

 

Se Keiko vencer as eleições, deverá manter a ortodoxia econômica fundamentada por seu pai na década de 1990 e instauraria um governo, cujas raízes ditatoriais iriam se contrapor à onda democrática que veio se impondo na região e vem se expandindo recentemente aos mundos árabe e africano.

 

A volta do fujimorismo poderia provocar fortes protestos sociais. Caso Keiko se torne a presidente, poderia anistiar o seu pai e isso arranharia a imagem interna e internacional do Estado e, por sua vez, forneceria combustível para que as diferentes facções senderistas se reativem - uma delas, clama que a anistia também chegue a Abimael Guzmán e as outras duas desejam expandir novas bases militares no Huallaga ou no vale dos rios Apurímac e Ene.

 

Se Humala voltar a vencer o primeiro turno, deverá enfrentar um bloco para impedi-lo de vencer o segundo turno. Há a possibilidade de que seu movimento prossiga a trajetória de Lula - que foi derrotado em três eleições presidenciais (1989, 1994 e 1998), mas quando venceu, fez o seu partido puxar três mandatos consecutivos.

 

Se o fujimorismo recebesse o apoio do centro para combater Humala, poderia surgir um governo similar ao banzerismo boliviano (1997-2002), que produziu a emergência e posterior consolidação do nacionalismo de Evo Morales.

 

Basta apenas que qualquer desses três chegue, ainda que seja em segundo lugar, ao turno final, para conseguir o apoio do restante que não concordará com aquele que vier a figurar em primeiro lugar (seja o centroesquerdista Humala ou a direitista dura Keiko Fujimori).

 

Caso os três candidatos do ‘meio’ não façam coligações entre si (incluindo sacrificar sua própria candidatura em prol de um outro fim), eles correm o risco de que os demais se fechem numa coligação, na qual esses três seriam prejudicados.

 

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Lições da catástrofe japonesa

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

31/03/2011

 

No dia 11 de março passado, o Japão voltou a demonstrar que é o país do mundo mais propenso a sofrer sismos, além disso, quase volta a sofrer uma grande explosão nuclear, após ter sido o único povo em ter sido bombardeado atomicamente, em 1945.

 

O professor escocês Iain Steward, num especial para a BBC, sustenta que este terremoto foi 600 milhões de vezes mais poderoso que a bomba de Hiroshima. Em poucos segundos, o fenômeno fez com que a costa leste nipônica se submergisse em até um metro e se afastasse quatro metros, produzindo um deslocamento de 25cm no eixo do planeta, modificando com isso, a velocidade de rotação da Terra, que encurtou levemente os dias.

 

Para o professor irlandês John McClousy este sismo de 9 graus foi precedido por um outro de 7.2 graus, ocorrido dois dias antes. Entretanto, o impacto deste sobre o outro teve uma força tão leve como a de um aperto de mãos. Como o subsolo já estava estressado, isso foi como a gota d’água para ocorrer a tragédia. Vários dos 700 tremores que se sucederam têm demonstrado que o subsolo de Tóquio se foi estressando. Entretanto, as possibilidades de que isso gere em breve um terremoto nessa cidade onde vivem 30 milhões de pessoas é algo hoje não muito provável, mas será inevitável que tarde ou cedo um outro sismo ocorra na região.

 

Todo terremoto produz duas ondas que viajam mais rápido que o som. A primária, que os detectores localizam no instante, e a secundária, que vem depois e que é a mais letal, pois sacode tudo. O dito documentário mostrou a sessão do parlamento japonês, quando a tevê anunciava o início da primeira onda, enquanto todos os deputados seguiam debatendo normalmente e, em poucos segundos, ocorreu o abalo produzido pela segunda onda.

 

Estes poucos segundos são preciosos para prevenir, ainda que o pior estrago foi causado pelo maremoto que chegou à costa nipônica entre 24 minutos a três horas após o terremoto. Cerca de 40% da costa daquela nação está protegida por altos muros anti-tsunami. No entanto, este último gerou 10 ondas que viajavam a um quilômetro de distância uma da outra. Além disso, algumas das quais, superaram os 10 metros de altura, ultrapassando as barreiras e criando uma muralha que avançava arrastando água, lodo, concreto, ferro e até fogo, por até 10 quilômetros terra adentro.

 

Todo isso produziu mais de 10 mil mortos, 17 mil desaparecidos e 500.000 desabrigados. Não obstante, esse número é menor que os 100 mil mortos em Tóquio (1923) e os 230 mil mortos do Haiti (2010), apesar de a potência do sismo em março de 2011 ter sido de ao menos uma dezena de vezes superior à de qualquer destes. O Japão, pai onde ocorre um terço dos sismos de todo o mundo, lidera a indústria antisísmica global.

 

Uma terceira tragédia que pode ter feito com que o Japão tenha uma nova Hiroshima foi a explosão de quatro usinas de energia nuclear. A situação se agravou, já que o sismo destruiu os mecanismos de resfriamento das usinas. Felizmente, segundo o professor inglês Jim A o-Khalili, a radiação aérea tem sido contida e nunca ultrapassou os 50 quilômetros da usina nuclear de Fukushima, situada a 240 quilômetros de Tóquio. Um perigo maior seria se esta radiação contaminasse a água e os alimentos, o que ainda está para se saber.

 

Apesar de todos os progressos da ciência, esta se mostra incapaz de predizer qualquer sismo. Não obstante, John Maclousy sustenta que já estão sendo desenvolvidos, mapas que mostram os pontos vermelhos do planeta, onde tarde ou cedo, ocorrerá sismos de grande magnitude e onde devem ser desenvolvidas construções e sistemas antisísmicos.

 

- Leia outros artigos de Isaac Bigio em Mundo Político.

 

 

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Tsunamis nas duas costas do Pacífico

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

18/03/2011

 

Enquanto o mundo está compenetrado no sismo de 11/03, que produziu a maior devastação do país mais avançado do Pacífico asiático, queremos recordar outros tsunamis que afetaram à capital sulamericana dos séculos XVI, XVII e XVIII: Lima, quando chegou a ser a urbe mais rica de toda a costa do oceano, o maior do planeta.

 

Esta cidade fundada pelos espanhóis em 1535, transformou-se, sete anos depois, na capital do Virreinado de Nova Castilla (depois renomeado de Peru), o mesmo que se anexava àquele que tinha sido o maior império do mundo de então (inca) e abarcava grande parte da América do Sul. Leste foi o virreinado mais extenso de todos os tempos, o qual até 1717, incluía o norte e, até 1776, o sul dos Andes.

 

Uma das coisas que mais surpreenderam os conquistadores era a grande quantidade de sismos que açoitavam àquela que denominaram como a ‘cidade dos reis’. Segundo uma reportagem de Carlos Bachman no ‘Comércio’, no dia em que Lima celebrou seu 400º aniversário, os primeiros escribas registraram diferentes classes de sismos ocorridos nos períodos de 1513 e 1515, 1533, 1552, 1553, 1558, 1568 e 1578.

 

O pior deles ocorreu no primeiro meio século de Lima, às 7h pm, da quarta-feira, 9 de julho de 1586. Leste produziu a queda de muitas construções, incluindo a torre da catedral. No Callao, o porto adjacente de Lima, que foi o mais importante do continente, surgiram ondas com mais de 20 metros de altitude (o dobro das que se viu em Sendai), que chegaram a inundar terras até 10 quilômetros adentro. O virrei Torres e Portugal se salvou por milagre e teve que dormir ao relento.

 

O portal Callao.org descreve o terremoto de 24 de novembro de 1604, que açoitou entre 1500 e 2000 quilômetros do Pacífico central sul-americano, atingindo portos como os de Callao, Camaná e Arica e levando ondas de até 16 metros de altura por quilômetros adentro do continente.

 

Esse veículo, também sustenta que tremores ocorridos em 20 e 21 de outubro de 1687, produziram ondas de 5 a 10 metros de altura no Callao e, isso teria repercutido até no Japão.

 

Na sexta-feira, 28 de outubro de 1746, Lima sofrera seu pior terremoto, que só deixou de pé somente 25 de suas três mil moradias.

 

Leste desencadeou um tsunami que arrasou o Callao com duas ondas. Uma delas, seria do tamanho de um edifício de 10 andares e chegou a inundar cinco quilômetros contíguos. Todos os 23 barcos ali ancorados foram destroçados e alguns apareceram a mais de um quilômetro terra adentro.

 

Bachman cita uma fonte afirmando que somente 1% dos quatro mil habitantes do Callao pereceu naquele  maremoto, cujas sequelas teriam refletido do Acapulco ao Japão.

 

Felizmente, o tsunami da sangrenta sexta-feira, 11 de março de 2011, no Japão, não produziu proporcionalmente, nem de longe, as mesmas calamidades ocorridas no da outra sexta-feira, no fatídico 28 de outubro de 1746.

 

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Líbia seguirá a Tunísia e Egito?

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

 

Depois da queda dos ditadores da Tunísia e do Egito, a Líbia, o país que está no meio destas duas repúblicas árabes do norte africano, se vê sacudida por uma guerra civil que já supera amplamente mil mortes.

 

De todos os 53 Estados da África, a Líbia é o que tem o melhor índice de desenvolvimento humano, os maiores PIB e expectativa de vida para sua população (74 anos, em média).

 

A Líbia tem pouco menos de 6,5 milhões de habitantes, que se encontram espalhados num vasto território de 1.759.541 km2. Esta área é similar à do México ou da Indonésia, que são, respectivamente, as repúblicas hispânica e muçulmana mais povoadas do mundo.

 

Entre 1911 e 1951, a Líbia teve dependência italiana. Foi uma das últimas colônias europeias na África e também uma das primeiras a se tornar independente. No Natal de 1951, a Líbia se transformou em uma monarquia soberana, mas o mundo não lhe dava maior importância ou ao seu rei Idris. A Líbia era vista como um grande deserto com somente um milhão de pessoas, em grande parte, nômades.

 

No entanto, depois da descoberta de significativas reservas de petróleo em 1959 e sob a influência da revolução nacionalista de Nasser, que depôs o rei egípcio Faruk, em 1969, se produziu um golpe militar ‘socialista’ com características similares aos efetuados por Nasser, em 1952, ou Velasco, no Peru, em 1968.

 

Com somente 27 anos de idade, o oficial Muammar Kadafi converteu-se no ‘líder da revolução’. Desde então, ele ocupa vários postos nominais, se convertendo, durante os últimos 42 anos, no homem forte de sua nação. Atualmente, em todo o mundo, ele é o líder não monárquico que por mais tempo permanece no poder.

 

Kadafi declarou que a Líbia era um ‘Estado socialista das massas’. Os partidos políticos e o álcool foram proibidos em todo o território. Os italianos (um oitavo de sua população) foram expulsos, enquanto se buscou a homogeneização nacional em torno da língua árabe e do Islã. O Estado assumiu o controle do petróleo, que hoje representa 95% da riqueza nacional.

 

Se Mao obrigava aos chineses a ler seu livro vermelho, Kadafi criou seu próprio livro verde. Nas décadas de 1970 e 80, ele chegou a ser considerado por Londres e Washington como o grande instigador do terrorismo mundial, sob a mesma perspectiva a que hoje se coloca Bin Laden.

 

Não obstante, isso se inverteu. Kadafi se aliou ao Ocidente contra a Al Qaeda e depois auto-desintegrou suas armas de destruição em massa. Igualmente aos militares egípcios, ele começou a reconciliar-se com seus antigos inimigos ‘imperialistas’, os quais, o convidara a investir, fazer negócios juntos e ajudá-los ‘pacificar’ a região.

 

Quem fomentou guerrilhas e revoluções em sua periferia, bem como em todo mundo (da Irlanda até a Colômbia), acabou condenando as revoltas da Tunísia e pedindo que deixassem o ditador tunisiano, Alí, governar por toda a vida.

 

Kadafi ainda mantém certa aureola revolucionária (em 2009, propôs na Venezuela, a criação de uma ‘OTAN do Sul’), ainda que também se proclamasse ‘rei da África’.

 

No momento em que escrevo estas linhas, diversos grupos opositores têm conquistado várias cidades, incluindo Banghazi (a segunda maior do país) e Cirenaica (na região leste da Líbia). Kadafi declara que só morto vão retirá-lo do poder, enquanto vários de seus ministros, oficiais e embaixadores já desertaram.

 

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Egito: militares continuam no poder

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

 

No Egito o ditador se foi, mas mantiveram-se no poder os mesmos militares das forças que governam aquele país desde 1952. Tais forças são hoje animadas pelo ocidente a “democratizar” sua nação.

 

As Forças Armadas egípcias se encontram na lista das 10 maiores do mundo e de todas estas, são as que por mais tempo a casta militar domina o poder político.

 

Enquanto o seu orçamento militar é inferior ao de Brasil, Espanha, México, Chile, Venezuela e Argentina, se equipara ao da Colômbia, mas se avantaja a todos estes em número de contingentes, tanques e aviões de combate.

 

O Egito é o oitavo do mundo quanto à quantidade de aviões militares e tanques. Possui 4.240 tanques (três vezes mais que os 1.680 de Israel) e 567 aviões de combate. Isto representa, respectivamente, 5% dos 86.681 tanques e 4% dos 28.382 aviões de combate do mundo. O Egito possui três vezes mais equipamentos que qualquer país iberoamericano, incluindo Cuba - que mais tanques possui nesse bloco -, Espanha e Brasil, que lideram o mesmo quanto ao número de aeronaves caças.

 

No Egito constam 468.500 soldados e 479.000 reservistas; numa proporção em relação ao número de seus habitantes, superior às das três maiores forças do planeta (China, EUA e Índia). Adicionando os seus 390.000 paramilitares chega-se a um total de 1.344,500 efetivos (1.7% de sua população).

 

Essas Forças Armadas se diferenciam de todas as iberoamericanas em dois aspectos básicos: detêm uma longeva ditadura militar e têm guerreado em várias frentes externas (uma a cada década, desde os anos de 1940, em média).

 

E se foram cinco guerras contra Israel. Na primeira, de 1948, o Egito anexou Gaza ao seu território. Na segunda, de 1956, a aliança franco-britânica-israelense quis reverter a nacionalização do Canal de Suez. Na terceira, de 1967, o Egito perdeu Gaza e Sinai. Na quarta, entre 1967-70, foram três anos de bombardeios entre ambas as margens do Canal de Suez. Na quinta, a de Yom Kipur, de 1973, o Egito conseguiu “empatar” com Israel, obrigando esse vizinho a assinar um acordo de paz em que o Sinai lhe seria devolvido.

 

Os mortos em todos esses conflitos foram, respectivamente, 20 mil, três mil, 14 a 25 mil, três a 10 mil e 10 a 20 mil pessoas. E a grande maioria foi de egípcios.

 

Além disso, mais de 50 mil soldados egípcios participaram na guerra civil do Iêmen (1962-67) e em julho de 1977, o Egito se livrou de uma breve guerra contra a Líbia, quando Khaddafi conclamou o veto à paz com Tel-Aviv.

 

Este exército, entretanto, tem um histórico de ter realizado massacres contra a sua própria população quando, por exemplo, se deram protestos anti-ditatoriais em 1977 e 1986, enquanto o número de mortos em apenas 18 dias que duraram as manifestações anti-Mubarak chegou a centenas.

 

Enquanto isso, milhares seguem pelas ruas pedindo que se elimine o estado de emergência e que seja aberto o caminho para a instalação de um governo civil.

 

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Árabes e ibéricos

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

 

Hoje quando a Ibero América se mostra pendente às convulsões do mundo árabe, vale a pena recordar a estreita relação que ambas as regiões tiveram ao longo dos tempos.

 

As penínsulas ibérica e arábica ficam às margens opostas do Mediterrâneo, que foi o centro do velho mundo. Neste mar há outras três penínsulas: a itálica, a balcânica e a turca. Na primeira decidiu-se os moldes da Idade Antiga à Média, quando Roma caiu ante os bárbaros, no ano de 476. Nas duas seguintes a era medieval abriu caminho à Idade Moderna, quando os turcos conquistaram Bizâncio, em 1453.

 

As duas penínsulas laterais não geraram nenhuma civilização importante durante a época antiga.

 

A ibérica foi conquistada ou colonizada por norteafricanos, helenos, semitas, romanos ou germanos, enquanto à semidesértica arábica teve impérios sem grande importância.

 

No entanto, da árabe emergiu no século VII o maior movimento religioso militar de todos os tempos: o Islã. Em poucas décadas os seguidores de Maomé espalharam-se a partir do rio Indo, até todo o Mediterrâneo ao sul da França. A Espanha, depois do início da conquista islâmica, no ano de 711, se converteu no centro da grande civilização de Andaluz.

 

E assim, Ibérica e Arábica, as duas penínsulas geograficamente mais distantes do Mediterrâneo, permaneceram ligadas durante oito séculos por uma comunidade de fé e idioma. O árabe era a língua adotada em toda a costa oeste, sul e leste do Mediterrâneo.

 

Segundo Nicholas Ostler em “Impérios da palavra”, o árabe se impôs, sobrepondo-se e unindo uma série de idiomas prévios de origem semita.

 

No mesmo ano de 1492, quando os reis católicos derrotariam o último reino muçulmano em Granada, foi que se iniciou a conquista das Américas, na qual os hispânicos desenvolveram dois elementos fundamentais em sua relação com os árabes: a importância do idioma e o credo como fator de unidade imperial.

 

Enquanto os impérios britânico, francês e holandês permitiam outras religiões e idiomas (os seus eram falados como língua mãe por descendentes de europeus ou de escravos, que não tinham outra forma de se comunicar entre si, senão na língua dos seus senhores), os ibéricos seguiram a receita árabe de miscigenação racial junto aos seus subjugados e fazendo com que compartilhassem as mesmas fé e língua. O árabe, o espanhol e o português são os idiomas que têm mais falantes nativos em povos diferentes aos de seu continente de origem.

 

Os reis católicos hostilizaram ou expulsaram milhões de maometanos e judeus, extirparam as línguas semitas e todos os credos que não fosse o seu, criaram a inquisição e exterminaram povos muçulmanos inteiros em seu interior. Estes métodos foram transportados à atual América Latina, a qual se tornou hoje a região do mundo que mais fala línguas latinas e mais segue o Papa.

 

Os impérios espanhol e português forjaram-se em permanentes guerras com o Islã, ainda que suas línguas e culturas sejam as mais influenciadas pelo árabe no Ocidente.

 

A América Latina é a seção do Ocidente que mais presidentes teve de origem árabe. Se tornou um conjunto de países que tem em comum com a União Árabe, nações pobres que falam um mesmo idioma, são socialmente polarizadas e cultivam nacionalistas e oponentes aos EUA.

 

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A retirada de Mubarak

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

 

Faz mais de uma semana centenas de milhares de egípcios estão saindo às ruas para pedir o afastamento do presidente Hosni Mubarak, enquanto mais de cem manifestantes forma mortos.

 

O Egito é um dos países mais estratégicos do mundo. O berço de uma das primeiras civilizações humanas foi sempre o botim de todos os impérios do Oriente Médio e do Mediterrâneo. Hoje é o centro de gravidade do mundo árabe, onde é tanto a nação mais povoada como a mais armada (pelos EUA).

 

Quando, em 1952, o coronel Nasser derrocou à monarquia ele assentou um dos pilares do novo nacionalismo terceiromundista (cujos herdeiros na América Latina foram desde os socialistas militares tipo Velasco no Peru até os bolivarianos de Chávez).

 

A nacionalização do canal de Suez e a guerra que desencadeou em 1956 produziu a longa prazo o declive do poderio britânico e francês na região e o desenvolvimento da guerra fria no Oriente Médio entre Washington e Moscou.

 

O Egito converteu-se no principal aliado soviético no Oriente Médio e tentou unificar-se com Síria e Líbia, bem como destruir Israel. Depois do empate da guerra árabe-hebreia de 1973, os EUA conseguiram que Israel devolvesse territórios ao Egito em troca de que este país reconhecesse e fosse pró-Kremlin eassim, se converter no maior aliado ocidental no mundo árabe.

 

Sadat e depois Mubarak herdaram o sistema autoritário de governo baseado nas FFAA de Nasser, mas fazendo que o regime se reciclasse de seu inicial “Anti-imperialismo” a um cada vez maior “pró-americanismo”.

 

Graças a esta estratégia, Israel começou a ser reconhecido na região enquanto os EUA puderam avançar no Oriente Médio para invadir o Afeganistão, derrocar  Sadan Hussein e buscar o isolamento do Irã.

 

Hoje o Egito encontra-se em um dilema. Depois de três décadas no poder, o octogenário Mubarak parece ter agora os dias contados. A possibilidade de ser substituído por seu filho Gamal se evapora. A população envolvida pela queda da ditadura tunecina, pelos protestos antiditatoriais no Iêmen, pelos acontecimentos no vizinho Sudão e pela onda de protestos no mundo árabe, parece não querer o retrocesso, até retirar Mubarak.

 

Estes acontecimentos, para muitos relembram a maré de mobilizações que conduziu à queda dos partidos comunistas do leste europeu em 1989. Enquanto faz 22 anos a oposição euro-oriental pedia uma democracia liberal pró-ocidental, no mundo árabe, esta deve competir com o nacionalismo islâmico anti-EUA.

 

A partir disso, Washington pede uma “transição gradual”. Enquanto isso, Mubarak designou um novo premiê e seu primeiro vice-presidente. Dali pode emergir um possível sucessor seu que mantenha a forma do atual regime.

 

O Prêmio Nobel El Baradei quer fazer com que o movimento social gere um movimento demo-liberal, mas o Egito é a pátria da “Irmandade Muçulmana”, tal movimento tem influído no Hamas palestino e em outros radicais maometanos.

 

Se o Egito cair em mãos destes setores, isso daria mais força ao Hamas (que vem recobrando força depois das revelações de que o Fatah queria reduzir ainda mais o futuro estado palestino), ao Hizbola (que acaba de impor seu próprio governo no Líbano) e o Irã.

 

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O encontro de Obama e Jintao

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

 

O presidente chinês Hu Jintao visitou o seu homólogo Barack Obama, em Washington. Os dois encabeçam as duas maiores superpotências do globo.

 

Ao comparar estes países podemos ver que o gigante asiático possui o maior exército do planeta (2,2 milhões de soldados). Já o colosso norte-americano, apesar de ter 600 mil efetivos a menos, trabalha com um orçamento bélico nove vezes superior (US$ 663 bilhões, contra US$ 70 bilhões) e 40 vezes mais armas nucleares (nove mil, contra 240).

 

Enquanto os EUA têm bases militares em dezenas de nações e promovem várias ocupações armadas, a China faz décadas, não desenvolve nenhuma guerra interna ou externa. Beijing tem a maior força pacificadora da ONU e sua política exterior baseia-se na não intervenção.

 

Isso a distancia da diplomacia que Moscou e Mao mantiveram durante a guerra fria, na qual, animavam guerrilhas ou oposições em diversas regiões. A nova China, enquanto mantém o mesmo monopólio de poder do Partido Comunista, hoje promove um capitalismo de Estado que requer matérias primas e intercâmbios comerciais com nações de todas as tendências políticas.

 

O xadrez entre Washington e Beijing não se centra no movimento de peças militares em tal ou qual rincão do tabuleiro global, mas em disputas essencialmente econômicas. Os norte-americanos querem que os chineses revejam sua moeda, mantida relativamente baixa para melhorar o desempenho de suas exportações.

 

Estas atualmente, segundo o jornal The Guardian, ascendem a US$ 1,55 bilhões, superando às dos EUA que estão em US$ 1,27 bilhões. A nível de reservas do tesouro, a China é a nação que tem o maior superávit (US$ 272,5 milhões) e os EUA têm a maior dívida (US$ 561 milhões). Enquanto o dragão oriental cresce anualmente a um ritmo de 9,4%, a águia norte-americana o faz a um nível de 2,6%.

 

Para a Universidade da Pensilvânia, a economia chinesa já teria superado a dos EUA, ainda que em medidas de dólares seu produto interno bruto equivale à metade do norte-americano e a nível de produto por habitante (PIB), o dos EUA é cerca de 12 vezes maior que o da China (US$ 47,132 contra US$ 4,283) que, nesse quesito, segue integrando a metade mais pobre dos países do planeta. A capitalização dos EUA (cerca de US$ 15 bilhões) é quase o quádruplo da chinesa.

 

A China tem desbancado os EUA como líder mundial em poluição, bem como em medalhas olímpicas de ouro, enquanto os estadunidenses superam em dezenas de vezes os orientais em pontos de internet, vendas de filmes, musicais e número de magnatas e multinacionais.

 

Os EUA alegam que sua cultura se difunde por todo o globo e que seu idioma inglês é a língua franca da globalização. Contudo, há no mundo, três vezes mais seres humanos falando mandarim que inglês.

 

De acordo com o jornal Financial Times, atualmente há cerca de 100 milhões de pessoas não chinesas que vêm aprendendo a linguagem dessa nação asiática. Beijing já tem superado o Banco Mundial com o maior número de empréstimos ao Terceiro Mundo, enquanto as suas 251 missões diplomáticas em todo o globo se aproximam das 289 dos EUA.

 

Nos próximos anos será possível que vejamos uma transição do século norte-americano para o século chinês.

 

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Os 500 anos de africanos na América do Sul

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

 

Hoje as Américas estão conformadas por raças humanas que vieram de todo o mundo. Além da nativa cor de cobre, as mais numerosas são a branca e a negra. Faz 19 anos comemorou-se a chegada de Colombo ao Caribe, que marcou o início da conquista do novo mundo pela Europa, a transformação de Espanha na maior potência mundial e na gestação do que viria a ser a globalização.

 

Hoje um em cada quatro ou seis, sul, centro ou norteamericano descende de africanos. No entanto, não se pode precisar verdadeiramente quando foi que chegaram pela primeira vez. Há quem sustente que vários tripulantes de Colombo nasceram na África, ainda que não fossem de cor.

 

Diferentemente dos africanos, os brancos chegaram às Américas como conquistadores, foram transportados, esposados e recebiam para servir de escravos.

 

À medida que a maioria da população ameríndia originaria morria por causa das novas doenças ou o maltrato, se fez necessária nova mão de obra, que foi importada do outro lado do Atlântico.

 

Não há uma data exata para o inicio em massa da chegada de negros ao novo mundo, mas ao longo de 2011 nos dedicaremos a falar do tema, tendo em conta que há várias fontes que sugerem que em 1511 chegaram os primeiros escravos às novas colônias hispânicas da América do Sul.

 

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Dilma e Fidel

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

 

No 1º de janeiro, quando a maior ilha das Caribe (Cuba) comemorava o 52º aniversário da revolução que erguiu à única economia não capitalista de Ocidente, no maior país latinoamericano (Brasil) era empossado o seu primeiro governante que tenha pertencido a uma guerrilha castrista.

 

Dilma Rousseff, que esteve presa de 1970 a 1972, acusada de ser uma das líderes da Vanguarda Armada Revolucionária Palmares, converteu-se na primeira presidente mulher da história brasileira, depois de ter ascendido ao palácio através das urnas e não das armas.

 

Igualmente ao presidente uruguaio Pepe Mujica, o vice-presidente boliviano Alvaro García e os partidos dirigentes da Nicarágua (FSLN) e El Salvador (FMLN), ela chega ao poder operando uma evolução inversa à que teve o seu inspirador castrista.

 

Quando, em fins de 1958, uma série de greves e uma forte crise conduziram à queda da corrupta ditadura cubana de Batista, a relativamente pequena insurgência de Fidel tirou proveito do vazio gerado. Então, ele se proclamou oposto ao comunismo e partidário de fazer com que sua ilha tivesse um sistema constitucional mais próximo dos EUA. No entanto, os Castro aplicaram uma série de reformas e nacionalizações implicaram num choque com Washington, ao se converter em admiradores de Moscou e por transformar o seu original movimento democratizante num partido comunista único, impondo uma economia estatizada e planificada.

 

Para fazer frente ao cerco estadunidense, Havana começou a promover focos armados dos dois lados do Atlântico. Che Guevara primeiro partiu para combater no Congo e depois acabou sendo derrotado e morto na Bolívia.

 

O golpe de 1973 no Chile mostrava a tendência daqueles anos de guerra fria, nos quais, a Casa Branca não estava disposta a permitir que nenhum país latinoamericano se aproximasse do grande aliado do Kremlin no hemisfério.

 

Quando, em 1979, a guerrilha sandinista triunfou na Nicarágua, os Castro pediram a Ortega que não emulasse seu sistema e aceitassem o mercado e o multipartidismo.

 

Quando em 1989-1991 o bloco soviético se desintegrou e os sandinistas perderam eleitoralmente o governo, Havana se tornou muito isolada. Para fazer frente a isso, os Castro se acercaram à União Européia, fazendo mais concessões ao mercado e pressionaram para que a esquerda latinoamericana se orientasse no sentido de buscar o governo pelas vias constitucionais.

 

Em todas as partes, os Castro pediram à antiga guerrilha que se inserisse no sistema, ainda que na Colômbia não conseguiram que isso ocorresse. O modelo a seguir foi o de Venezuela, Bolívia e Equador, onde os mandatários nacionalistas buscavam reformas frente ao que denominavam como neo-liberalismo, mas mantendo e incentivando o livre mercado.

 

Ex-guerrilheiros castristas, como Dilma ou Pepe Mojica, inclusive, se “moderaram” mais que outros mandatários da ALVA, buscando um caminho semelhante ao da social-democracia.

 

À medida em que se recorda o passado ateu ou subversivo de Dilma, mais ela diz que é católica, que é pró-vida e que só quer casais heterosexuais.

 

Dilma não fará nacionalizações do tipo ALVA. Em vez de querer que Brasil seja uma nova Cuba, buscará que Cuba e a ALVA sigam à senda do Brasil. Sua estratégia será continuar à de Lula: fazer com que o seu país seja uma ponte entre quem promove o livre mercado e o populismo de esquerda.

 

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América do Norte é também América Latina

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

 

O povo dos EUA se denomina como “americano”, enquanto este caracteriza “latinoamericanos” a todos os países que estão ao sul de sua fronteira. Como muitos latinoamericanos não querem se referir aos estadunidenses com o nome de todo o seu continente, estes os denominam “norteamericanos”.

 

No entanto, como veremos nesta nota, tudo isso é um equivoco. O território dos EUA contém 9,8 milhões de km², que se constitui em menos da quarta parte dos 42,5 milhões de km² da América e menos da metade dos 24,7 milhões de km² da América do Norte.

 

O Canadá supera os EUA como o maior país, tanto da América do Norte, como de todo o Ocidente. Estes dois gigantes do Norte são considerados como a parte “não latina” da América, o que, por sua vez, está errado.

 

Os portugueses chegaram ao Canadá em 1497, quando Colombo retornava de sua terceira viagem para conhecer o subcontinente sulamericano. Labrador, a grande península canadense que se une ao Atlântico, se chama assim em homenagem ao navegante lusitano João Fernandes Lavrador, que a “descobriu” naqueles anos.

 

Em 1513, Juan Ponce de León, o governador espanhol de Porto Rico, chegou à América do Norte batizando à nova colônia hispânica como “Flórida”, atual Estado dos EUA, cuja maior cidade é Miami.

 

Os britânicos chegaram sozinhos à América do Norte, um século depois, em 1607. Em 1620 fundariam sua colônia em Plymouth, a que chamariam de “Nova Inglaterra”. Em um século e meio depois, suas 13 colônias da costa leste, em 1776, criariam os Estados Unidos da América. Este país, ao ser fundado, só agrupava uma décima parte de sua atual área e uma pequena fração de todo o território norte-americano.

 

As 13 colônias britânicas se encontravam rodeadas pela “Nova França” e a “Nova Espanha”. A “Nova França” era um território que, entre 1534 a 1763, chegou a se estender desde todo o oeste do atual Canadá, até o golfo do México, passando pela maior fonte fluvial norte-americana (o Mississipi), os grandes lagos, a atual urbe de Chicago e todo o atual centro dos EUA.

 

A “Nova Espanha” era o vireinado liderado pela Cidade do México, que se estendia desde a América Central e o Caribe hispânico, até a grande parte do sul e oeste dos atuais EUA. Os castelhanos, inclusive, chegaram a reclamar o Alaska e ainda hoje, há lugares ali, como Valdez, Córdova e outros que evidenciam a sua presença.

 

Quando o Canadá foi fundado, a maioria de sua população falava francês. Atualmente, o francês continua sendo uma das duas línguas oficiais dessa nação, sendo mais empregada em sua principal região (Quebec). A maior população de idioma materno francês fora da França não está na Suíça, nem na Bélgica, mas no Canadá.

 

O Haiti e outras ilhas “latinoamericanas”, sob influência da França, não falam a língua da dita potência, mas idiomas “criollos”, criados pelos escravos que misturavam suas raízes e gramáticas africanas com vocábulos galos.

 

Os EUA têm 50 milhões de hispânicos, número esse, superior ao da população da própria Espanha ou de qualquer outra nação hispânica sul ou centro americana. Os EUA tendem a adquirir um caráter bilíngue, como o Canadá, enquanto a Califórnia, seu Estado mais rico, está muito próximo de ter maioria latina em sua população.

 

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WikiLeaks: o poder atrás das sombras

 

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

 

O WikiLeaks tem revelado uma série de documentos secretos dos serviços diplomáticos dos EUA que evidenciam três pontos com relação à maior potência de todos os tempos: 1) a impotência com relação às infiltrações; 2) a fragilidade de sua confiabilidade; 3) as intrigas do poder por trás das retóricas.

 

A candidata vicepresidencial derrotada, Sarah Palin, sustenta que o criador do WikiLeaks, Julian Assange, deveria ser considerado da mesma maneira que um terrorista talibã. Entretanto, Assange declara que tem o direito constitucional e a obrigação de abrir, democraticamente, o que ele considera que ser o “jogo sujo” dos governantes.

 

Apesar de o WikiLeaks ter sofrido duas investidas cibernéticas para derrubar os seus serviços, o site tem conseguido se manter online. Os EUA não podem cancelar os seus serviços, pois isso danificaria ainda mais sua reputação, já que se aparentariam autoritários.

 

As novas tecnologias não somente ajudam a melhorar os mecanismos de espionagem, mas, também, aumentam a possibilidade de sérios vazamentos de informações.

 

Através dos documentos expostos pelo WikiLeaks, o público viu como agem, em tão baixo nível, pessoas que incidem diretamente na política exterior da mega potência americana.

 

No caso da América Latina, está claro como os EUA querem pressionar o Brasil (ainda que tivera Lula como presidente, este foi um de seus tradicionais aliados) para que se distancie do eixo Chávez-Morales. Como também, anteriormente à eleição do atual presidente boliviano, foram vistas tentativas de se evitar que este chegasse ao poder ou que se diminua o apoio venezuelano a ele. Quanto à Argentina, nota-se como os diplomatas estadunidenses vêem Kirchner com ressentimento, ao rejeitar proximidade com o TLC e os EUA (como Menem), preferindo se manter próximos à Caracas.

 

A própria Hillary Clinton pediu um relatório de sanidade mental da presidente Cristina, para saber como poderia influenciar na política argentina e sulamericana.

 

Com respeito ao Oriente Médio, transpareceu a crueldade de autoridades reais árabes, que pressionam para que os EUA ataquem o Irã, afirmando que deve-se cortar “a cabeça da serpente” ou que fazer isso, por enquanto, é um risco, mas não fazer implica noutro risco: permitir que Teerã se dote de armas nucleares.

 

Tudo isso mostra, simultaneamente, a dupla política dos ‘petromonarcas’ que falam em defender os direitos palestinos, mas suas preocupações não estão focadas em apoiar às denúncias que estes fazem das incursões bélicas hebréias, mas em como dobrar os seus 'irmãos' muçulmanos persas.

 

Estas são as mesmas famílias árabes que conseguiram empurrar os EUA a promover a guerra contra o Iraque, em 1991 e 2003, e que fazem hoje, um lobby para uma empreitada militar bem mais arriscada: atacar o Irã - um país com população, armamentos, relações diplomáticas e legitimidade constitucional, superior ao Iraque de Hussein, que então, já fazia frente a fortes resistências internas.

 

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Caribe canibal

Por Isaac Bigio*

De Londres

Para Via Fanzine

Tradução: Pepe Chaves

 

O hábito de comer carne da mesma espécie é algo que repugna, mas que sempre foi praticado por diferentes comunidades humanas. As primeiras evidências de “canibalismo” foram encontradas em restos humanos descobertos na Europa, faz 800 mil anos.

 

Apesar de durante centenas de milhares de anos, distintas comunidades humanas de todos os rincões do globo empregaram formas de canibalismo, este termo se tornou usual somente há meio milênio. Este baseava-se na palavra que servia para nomear aos povos “caribes”, que foram mestres em navegar um mar tão extenso como o Mediterrâneo dos fenícios e gregos.

 

É verdade que vários povos pré-colombianos daquela região ingeriam partes de seus inimigos por motivos ritualísticos, mas sua dieta se baseava na pesca, caça e agricultura. Ao associá-los com o canibalismo, foram vítimas de massacres, a tal ponto que hoje só sobrevivem poucos milhares vivendo em comunidades caribenhas. Já os europeus, não devoraram aos caribenhos, simplesmente os exterminaram.

 

A partir de então, o Caribe se converteu na zona do mundo que mais tem sido repovoada e fragmentada. Nas Antilhas, a maior parte de seus habitantes descende de escravos africanos e imigrantes do velho mundo.

 

Há dois tipos de Antilhas. As maiores são quatro ilhas: Cuba, Dominicana/Haiti, Jamaica e Porto Rico. Estas somam mais de 200 mil km² e mais de 35 milhões de habitantes. Ao contrário, as ilhas menores, podem figurar no Guinness, pelo recorde quanto à sua ocupação territorial. Em uma área que soma apenas 13 mil km² e que não chega nem aos quatro milhões de habitantes, existem 24 países ou territórios (número maior ao das repúblicas latinoamericanas).

 

Sendo que, 16 destas 24 entidades, são dependências da França, Reino Unido, Holanda, EUA e Venezuela. As oito Antilhas restantes, que são independentes, têm como idioma oficial o inglês e integram à Commonwealth britânica, ainda que somente duas delas sejam Repúblicas, pois as outras seis, apesar de ter seu próprio parlamento, têm Elizabeth II como sua chefe de Estado.

 

A forma com que a população original foi aniquilada e substituída por outra que, em sua maior parte foi levada à força até ali, tem criado uma situação excepcional. O  vazio deixado pelo desaparecimento dos povos e dialetos originais não foi substituído por idiomas europeus (exceto onde o espanhol regeu), mas propiciou à criação de novos idiomas que combinam elementos europeus, africanos ou ameríndios.

 

Haiti, Santa Luzia, Dominica entre outras ilhas, não falam francês, mas um ‘criollo’ baseado em raízes africanas, com palavras afrancesadas. O inglês ‘criollo’ da Jamaica, Belize e de muitas Antilhas menores é incompreensível para um britânico comum. Nos territórios holandeses foram criados idiomas que misturam vocábulos neozelandeses, ibéricos, ingleses, africanos ou ameríndios como o “papiamento” de Aruba e Curaçao ou o “Sranan Tongo” do Suriname.

 

No léxico político mundial usa-se a palavra “balcanizar” para referir à fragmentação de povos vizinhos. No entanto, os caribenhos superam em divisões a mencionada península europeia. O termo “canibalizar” não deveria se referir a uma prática com a qual se caluniou às antigas populações do Caribe, mas à forma em que tantas potências têm conquistado e destruído toda uma região.

 

Enquanto isso, a possibilidade de o Caribe se unir em torno de uma única federação, só poderá ser realizada em conjunção com as tentativas de afiançar um bloco com o restante da América do Sul e Central, ainda que a superação da "canibalização" do Caribe seja uma tarefa pendente para o que chamamos de América Latina.

 

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